quinta-feira, 15 de julho de 2010

John Lennon

Todos os dias passo ali na Presidente Vargas, esquina com Aristides Lobo, onde a prefeitura, em péssimo movimento, acampou alguns camelôs que agora ficam ali, imundos, tomando sol, vendendo comida acondicionada de maneira imunda, mas encarando quem passa de maneira desafiadora, já não bastassem todas as ameaças que já temos no dia a dia. Um deles, não sei o que vende, está sempre ouvindo flashbacks. O primeiro disco solo de John Lennon está sempre tocando. E música nos transporta no tempo e espaço. Eu ia passando e ouvindo aqueles sinos dobrando, prefaciando "Mother". Eu estava no Canecão, Rio de Janeiro, bem teen, aguardando o início de mais um Baile da Pesada, comandado por Big Boy e Ademir, djs da época. Então, vem um ao microfone e diz que, como havia fila grande na porta, iriam aguardar para iniciar o baile. "Enquanto isso, ouçam o disco novo de John Lennon, que acabei de receber de um amigo que chegou de Londres". E então vêm os sinos.
Edgar Augusto, meu irmão, quase nos enfiou Beatles goela abaixo. Fazíamos mímica, em frente ao espelho. Ele, claro, era sempre o cantor. Ou John ou Paul. Para mim e para o Janjo, quem sabe, George ou Ringo. Na pré adolescência, um dos primeiros choques foi tentar traduzir as letras. Era o momento do psicodelismo. Uma mudança de padrão na escrita. Não entendia nada. Celophane flowers of yellow and green towering over your head..
John e Paul, duas faces da mesma moeda. Acabei de assistir "Nowhere Boy", filme de Sam Taylor Wood, com Aaron Johnson, Anne Marie Duff e Kristin Scott Thomas, contando a história de Lennon, criado pela tia Mimi e descobrindo que a verdadeira mãe morava alguns quarteirões adiante, com outros filhos e outro marido. O pai Alf, bem, não se sabia por quais mares andava. Mimi dura, disciplinadora, segurança total. Julia é o contrário. Ele se apaixonou pela mãe. Mixed emotions. Ela o havia "dado" a Mimi.. Mas lhe mostra, no banjo, "Maggie May" e muda sua vida. Chega Paul, bonitinho, sem mãe, mas todo certinho, sem conflitos, tocando bem e compondo. Insuportavelmente competitivo. O filme vai até o embarque para Hamburgo. Ouvir a mãe ensinando ao filho "Maggie May" é muito bacana. Sempre fui dividido, também. John é mais áspero, mais rocker, com sua guitarra rasgante e versos curtos, duros. Um perfeito compositor de jingles. Diz o que precisa em poucas palavras. Direto ao ponto. Paul é virtuoso, gosta dos acordes cheios e de romantismo, embora seja um excepcional cantor, um branquelo que fazia um Wilson Pickett perfeito.
Aproveitei e assisti "The US vs John Lennon", documentário que relata a luta do Beatle contra o governo americano, por sua permanência naquele país. Vem o romance com Yoko Ono. Acho que nela, ele encontrou a mãe, a mulher e a amiga. "Mama don't go, daddy come home". Yoko, apenas, foi escrota em desejá-lo somente para si, podendo manipulá-lo com mais facilidade. De resto, ela foi a pessoa que topava todas, não era careta e achava bacana tudo o que ele fazia. Para um artista, uma mulher que seja parceira, é tudo o que se pode querer. A idéia de manifestações solitárias, usando sua fama, pela Paz foi sensacional. Os tais "Bed Ins" em Amsterdam e Toronto. Cantar "Give peace a chance". Os slogans, as músicas, como jingles, tudo perfeito. Uma revolução sem armas e sim pelo amor. Era muito bom. Cara, aquele primeiro disco solo dele é demais! Klaus Voorman no baixo e Ringo Starr na melhor performance de sua vida. Tem "God", "Well well well", enfim. Depois veio "Imagine", grande jingle, mas também há "Jealous Guy" e principalmente "Gimme some truth", esta, um rock and roll poderoso, político, insultante, genial "Estou cansado de ouvir e assistir políticos, mentirosos, hipócritas, enganadores.. tudo o que eu quero é um pouco de verdade". Um artista ex-Beatle e com essa força, atrairia imediatamente a atenção de ativistas como John Sinclair, Abbie Hoffman e Angela Davis, lutando por direitos civis, contra a Guerra do Vietnã, causas perfeitas, mas também outras, mais ideológicas, claro, não tão defensáveis assim. Eles foram falar com John que os adorou. Não digo que o tenham manipulado, simplesmente, mas o encantaram e o fizeram estar à frente de manifestações, fazendo músicas, comandando e incomodando autoridades. Aí vieram os problemas em relação ao visto. Quem é esse inglês que está em movimentos políticos, aqui? Acho que caiu, também, um tanto de sua criatividade. Veio Sean e ele virou pai. O pai que nunca teve. Quando voltou, veio o maluco e o matou. Yoko pode ter sido tudo o que foi, mas deu-lhe ombro, conforto, amizade e o fez pensar que vivia em liberdade, embora fosse seu prisioneiro. Que vida, hein?

Um comentário:

sandro disse...

Acabei de ver o filme,Nowhere Boy, sai a procura da musica "Mother", na verdade fiquei com a musica na minha mente como se fosse o tema do filme ao entrar no google procurando a musica me deparei com o teu blog, as 3:18 da manhã não teria para quem ligar para falar sobre o que estou sentindo resolvi repartir contigo este momento obrigado pelo post
sandro.