sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Eu já morri



Era para ser um dia normal, de aula. Mas Janalice percebeu algo diferente ao entrar. Não que sua passagem no pátio do colégio não provocasse, sempre, algum frisson, por conta da altura de sua saia. Mas era mais do que isso. Dentro da sala, cochichos e risos. Então a professora se irrita e alguém se levanta. Entrega um celular. A professora põe a mão na boca. Sai. O que é que tem no celular? Então Jacilene assiste a uma demorada cena de felação que ela protagoniza, junto a seu namorado Fenque, com direito a closes de sua genitália, a pedido. Chocada, não sabe o que dizer. A professora retorna. A diretora vem junto. Pede que ela saia. Que volte para casa. Que somente retorne com seus pais. E atravessando o pátio, agora ouve claramente o deboche de todos.
Jacilene tem 14 anos.
Em casa a mãe chora. Grita. Estapeia. Rasga suas roupas. Entra o pai, com a farda de cobrador de ônibus. Tira o cinto. Espanca. Expulsa de casa. Ela sai chorando pela rua. Em uma esquina, Fenque está com os amigos. Ela chega e pede ajuda. Ele a trata mal. Ri de sua cara. Os amigos também. Ela cobra. Ele dá um tapa. Sai fora.
Jacilene vai andando, pela noite, na cidade, até o porto. Pede esmola. Consegue o dinheiro da passagem. Está no barco. Belém ao fundo. Desembarca e vai à pé até a casa de uma tia, que vivia no centro, com um namorado, e era sua madrinha, embora estivesse brigada com a mãe, por suas posições. Jacilene espera a manhã chegar para subir. Conta seu drama. A tia precisa perguntar ao namorado, dono do apartamento. Tudo bem, pode ficar, depois a gente conversa. A tia vai trabalhar. Jacilene vai dormir. O namorado fica por ali, assistindo tv. De tarde, Jacilene toma banho. Penteia-se em frente ao espelho. O namorado da tia entra. É a conta que precisa pagar para morar ali. Não pode denunciar nada. Fazem sexo. A tia chega no início da noite. Nada é dito.
Agora, Jacilene passa os dias zanzando no centro, com medo de voltar para o apartamento e enfrentar o namorado da tia. Encontra uma putinha, Dionete, próximo a uma farmácia popular. Conversam. Se identificam. Brincam. Acham graça. Passa um cliente. Ela vai. Jacilene fica interessada. Está feliz. Arranjou uma amiga. No dia seguinte vai ao quarto da amiga, em uma pensão. Juntas, fazem confissões. Jacilene experimenta roupas. No outro dia, aparece um pivete, namorado da amiga de Jacilene. Conversam. Quer fumar? Ele presenteia a namorada com um cordão. Sentam em um bar. Outro dia, estão no quarto da amiga. Quer fumar um crack? Fazem sexo a três. Chega tarde. Leva bronca. Outro dia, estão juntas. Chega o cafetão. Expulsa o pivete a pontapés. Dá safanões na amiga. Olha com interesse para Jacilene. Ela volta para casa. Considera. Outro dia, com a amiga. Chega o cafetão. Vamos ali numa casa? Que casa? De quem? Um amigo. Vão. Ela entra e é agarrada. Grita, mas ninguém vai ouvir. O cafetão e a amiga pegam um dinheiro e se mandam. Entra em um quarto onde há mais quatro. Dois dias. No terceiro, tomam leite. Sentem sono. Mas cambaleiam em direção a uma Kombi de vidros peliculados. Circulam. Param. Jacilene está tonta mas vê que estão próximos de um colégio. Empurram para dentro uma menina. Assustada. Tremendo. Não consegue gritar. Alguém abafa. Escuro.
Agora estão em uma casa, com quintal, fora da cidade. Jacilene sente o ar, o cheiro de mato. Um sítio? Uma tiazinha negra, alta, fica tomando conta, levando no banheiro e tal. Ela pede, com sotaque forte, para se comportarem, serem boas. Que foram escolhidas. Que são especiais. Que vão viajar para a Europa. Chega com umas roupas. Calcinhas, minissaias, corpetes, tops, tudo bem sexy. Vistam. Jacilene faz amizade com uma das meninas. Ela conta que foi sequestrada num show de pagode. Perdeu-se, por instantes, das amigas. Agora estão vestidas com as roupas sensuais. Uma a uma, desfilam na frente de alguns negros altos, fortes, que falam outra língua. Algumas são escolhidas. A amiga foi. Ela, não. Não há despedidas. Janalice fica. Ela vai trabalhar com a turma que ficou.
A Kombi entra em um motel. Vai para o lado reservado. Uma piscina. Homens aguardam e saúdam a chegada. Alguns estão nus. Elas saem. Algumas gostam e já vão sorrindo. Uma churrascada. Dentro da casa. O cara é gordo, feio, bêbado. O cara estica umas carreiras de cocaína. Ensina como faz. Janalice já está muito dopada. Começa a vomitar. A fazer espuma. O homem a toma e faz sexo mesmo que ela nem reaja. Ele se aborrece. Dá um potente murro na cabeça. Ela se acaba pelo chão. Ele vai embora procurar outra. Ela acorda, junta roupas. Sai andando, meio dopada, atordoada. Não sabe como, acaba na rua. Vai andando sem rumo. Não dão por sua falta.
Agora ela faz confusão em uma esquina. O policial a repreende. Ela enfrenta o policial. Está muito diferente agora. Para pior. O policial a leva para a cadeia. Não há cela para menores. Muito menos para mulheres. Ela continua respondendo torto. É colocada na cela com 20 homens e ali fica, sendo usada por eles. Um deles tem pena. Você não quer sair daqui? Não quer viver? Não. Eu já morri.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Fogoió


FOGOIÓ
Não foi barulho que acordou Fogoió, mas o silêncio. De domingo, cedo. E não era domingo. Atabalhoado, passou da hora. Os carrinhos ainda lá, guardados. Cadê todo mundo? Não tem domingo nem feriado pra empurrar o material dos camelôs pro comércio. Nem Baldo, nem Chulé. Cadê os caras? Saiu do depósito. A luz do sol deu-lhe na vista. Porra essa pasta do Pingola tá foda! Revirou o bolso e não encontrou nenhum. Vai pirangar um pão na Tivoli, se o portuga não estiver. Silêncio. Cadê os carros? Cadê a gente? Maria na esquina do Teatro Cuíra? Nada. Nem o Pamica tomando conta dos carros, podia adiantar uma ponta. Cadê todo mundo? O joelho doendo. Deus fez um arremedo de perna esquerda nele. Coxo. A vida inteira engolindo gozação, apelido. Vai lá na Banca do Alvino, quem sabe? Deserta. A Praça da República. As revistas e jornais ao vento. Tudo de véspera. Manchete: Amanhã será o fim do mundo? Babaquice. Vai nos Esportes. Papão começa a montar time para a Série B em 2013. Tá com largura! Cadê a galera? Pega um cigarro. Depois explico. Bate um vento forte. As árvores cantam e dançam. Os papéis. Caem mangas. Pega uma. Cheira. Hum. Come. Na Tivoli. Cadê o Rai? Ninguém. Nem portuga. Pula o balcão. Pega um pão cacete. Se esparrama em uma mesa. Toma um Baré. Vai no caixa. Bate. Soca. Não abre. Come outro cacete. Se farta. Bucho quebrado. Nunca se sabe. Vai até o Ver o Peso? Nem carro. Nem gente. Pelo meio da rua. Anda, não. Coxeia. Experimenta um grito. Leãããooooo!!! Ecoa. Leãããoooo!!! Vai. Ouve barulho. Alguém. Frio na barriga. Porra, é a Pantera, que também puxa da perna. A Pantera, se arrastando. E aí? Ela estende bilhetes do Carimbó da Sorte. Vai correr amanhã. Prêmio especial pro fim do mundo. Que merda é essa de fim de mundo. Vai querer? Porra nenhuma. Lá tenho dinheiro pra Carimbó da Sorte. Cadê todo mundo? Que todo mundo? Cadê o Imperador? Quem? Teu macho, porra. Macho um caralho. Sei lá. Sumiu. Sumiu todo mundo. Só nós dois. Fogoió olhou para Pantera. Cabelo cortado rente. Duas muxibas. Puxando da perna. Gambitos. A xoxota usada. Espalhada. Olhou pra si mesmo. Adão e Eva? Isso é que é o fim do mundo!


Publicado na Revista Cult/dezembro/2012

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Mulher pra mim é igual picanha

São Paulo quente é algo difícil de suportar. Todo o concreto, asfalto e ferro da cidade grita calor e passamos mal. Mesmo assim, à noite, a avenida Paulista está lotada como um Círio, como uma pracinha de Salinas, em julho. Há decoração, seja da Prefeitura, seja da iniciativa privada. Polícia atenta, ausência completa de camelôs, pedintes, somente as pessoas caminhando, com a família. Subo ao meu apartamento no hotel e o cartão havia desmagnetizado. Desço. Antes do térreo (aqui chamado "lounge"), entram três mulheres nervosas, muito nervosas. O que aconteceu? Um assassinato. Um homem acaba de matar outro a facadas! O elevador desce. Elas estão assustadas. Pergunto se não vão descer. Não! Queremos é subir! Eu desço. Uma desgraça. Nelson, encarregado da manutenção, me conta: aqui, passamos mais tempo juntos do que com nossas famílias. Ficava aquela coisa de um chamar de corintiano perdedor pra um e o outro de porco palmeirense rebaixado, essas coisas. De repente, o ajudante de cozinha puxa a faca e mata o chef. Eu, que nada sabia, fui entrando na cozinha e vejo o homem caído, em uma poça de sangue. No térreo, todos nervosos. Em instantes, carros de polícia, sirenes e até equipes de tv. Que pena, uma desgraça próxima ao Natal.
Circulo por livrarias, todas lotadas, repletas de livros e gente. Penso na minha terra e fico triste. Descubro meu Selva Concreta nas estantes. Encontro com Cacá Carvalho para botar o papo em dia. Elias Andreatto passa para duas palavras antes de subir ao Teatro Cultura com seu "Andante". Cacá atarefado com sua Casa Laboratório, viaja no dia seguinte para Sorocaba onde faz seu novo espetáculo sobre Pirandello. Agora chove em SP. Graças a Deus. Andamos pela Paulista, papeando. Foi quando lembrei do motorista do taxi. Passamos por um outdoor da revista Glamour com bela modelo na capa. Comentei que a vira na véspera, na Livraria da Vila, em evento de lançamento da edição do mês. Que ficara impressionado com sua magreza. Com seus braços, extremamente finos. Ele me diz "isso é coisa de veado que não gosta de mulher e bota essas magrelas pra desfilar. Doutor, pra mim, mulher boa tem que ser igual a picanha. Precisa ter aquela gordurinha...

domingo, 9 de dezembro de 2012

Ah, sim

O vôo foi bom e tranquilo. No taxi o motorista parece não entender o endereço, tão fácil. É que estou há pouco tempo, avisa. Bom, talvez tenhamos um probleminha na Lagoa. O pessoal está indo contemplar a árvore de natal. Está quente. Abafado. Nublado. Fora isso e o inevitável cheiro que vem do mangue que fica na Favela da Maré, o Rio está lindo. Não, até que não houve problema na Lagoa. Quanto dinheiro, em percentual, você fica, desta corrida. Uns 40%. Bom, custou quase cem reais. Quantas corridas por dia? Umas cinco, seis. A Cooperativa ajuda na gasolina? Não, mas não gasta tanto assim. Tem que pagar taxa, dividir as despesas com boxes e tal. Eu tiro uns 12 mil por mês, mas tem cara aí que roda mais e faz até 18 mil ao mês. Bom, né? É. Estou há pouco tempo. Vamos ver. A vantagem é que o carro é meu. Muita vantagem. Mas eu pensei que o pessoal fosse mais unido. Sabia que o negócio de taxi especial, aqui no Rio, é dos portugueses? Não. Pois é, começou com eles. Você é português? Não, mas meu pai era. Ele mexia com material de construção. Uma vez fomos todos a Portugal. Estranhei meu pai todo bem vestido, nós também. Mamãe disse que não era para dizer nada. O pai queria voltar a Portugal nos trinques. Já trabalhei em São Paulo e mesmo aqui, em escritório de engenharia. Ouvi falar que estão pensando em unir todas as cooperativas de taxi. Acho errado. Nunca vi fusão ser boa para trabalhador. Mesmo entre bancos, empresas de engenharia, é sempre pior. Agora vai unir o pessoal que tem tabela com a turma do relógio? Estamos chegando. Na esquina do hotel, centro de Ipanema, um boteco desses arrumadinhos, está cheio de gente feliz, à vontade, bermudão, short, curtindo a vida. Penso muitas vezes que os cariocas são sempre figurantes de um lugar para férias. Basta olhar para eles e começar a relaxar. Ah, sim, pergunto se o motorista é engenheiro. Não, sou arquiteto. Ah, sim.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

A noite mais feliz da vida de Jason Bonham

Eu havia assistido em canal fechado Shine a Light, o filme sobre os Rolling Stones, feito por Martin Scorcese. Ainda sob o impacto de Jagger e Richards, encontrei um amigo, que me perguntou sobre Celebration Day, o filme de David Carruthers sobre o concerto do Led Zeppelin na O2 Arena em 2007. Não, respondi. Tenho receio de assistir ao retorno de algumas bandas. Medo de perder o encanto. Encontrar senhores de cabeça branca, barrigudos, tentando cantar seus hits. Isso já me aconteceu com o Yes, mesmo que seu instrumental seja insuperável. Não, ele me disse. Tu precisas assistir. Sabe essa stamina, que notaste nos Stones? Está lá, no show. Tudo bem. Antes, entrevistas na Uncut, creio, de Robert Plant, à época, avisando que viria ao Brasil, o que fez e com Jimmy Page na Rolling Stone. Curiosamente, Led Zeppelin, apesar de todo o amor que tenho por seu som, nunca foi minha banda preferida. Talvez em estivesse muito apegado ao rock progressivo, sei lá. Mas conheço tudo. Minha amiga Silvana era apaixonada. Hoje, morando em Londres, está sempre encontrando com Page, a quem chama de amigo. 
O show começa e percebo Plant protegendo os agudos. Aquecendo a voz. Talvez seja esse o grande medo. Ele tem roído a corda a respeito da volta da banda. Tem outros planos. Carreira solo. Nessas outras atividades, trabalha outro registro vocal. No Zepp, o tom é sempre no alto máximo, rock and roll, onde ele antes arrebentava, chicoteava os companheiros. E agora? Plant também disse em entrevista que muitas vezes ficava assistindo a performance dos companheiros, todos músicos e ele, ali, o diferente, contando apenas com a voz. Agora, tanto tempo depois, Jones, Page e Bonham estão com seus instrumentos, modernos, maravilhosos e tudo o que ele tem é a voz, com quase 70 anos, creio. Uau. Até eu teria medo. Somente os tortuosos caminhos da comunicação entre eles pode explicar porque um show gravado em 2007 seja lançado somente agora, 2012. Quem sabe os outros aguardaram sempre por um ok, vamos voltar com o grupo.
As músicas seguem. Black Dog ainda não está no ponto quanto à voz de Plant. Em Nobody's Fault But Mine, melhora. Ele olha para Jason e ri. I did it. Os outros também sorriem, percebendo. Ele começa a soltar. Leio nas entrevistas que o elemento catalisador foi Jason Bonham. Seu pai, John, era  grande âncora. Sua morte fez desabar o que já ia adiante com sacrifício. Não eram mais jovens. Milionários, bebados, drogados, com egos gigantes. Acontece sempre. São humanos. Jason tem um conhecimento enciclopédico da banda, relembrando, ensinando passagens. Chega ao ponto de, antes de determinada música, lembra-los que o pai, certa vez, fizera desta ou daquela maneira e o que preferiam. Jason está sempre sorrindo, feliz, tocando uma bateria cheia como era a do pai. E todos sorriem, cumprimentam sua performance. Aos poucos, a troca de sorrisos, afetos e abraços se estende. Ao final de Stairway to Heaven, Plant grita We did it! Sua voz a essa altura está lá, no alto. E encerram com Kashmir, maravilhosa. A platéia pede bis. Retornam e fazem Whole lotta love. Saem. A platéia grita. Voltam e encerram com Rock and Roll.
Jason Bonham disse que esperou a vida inteira por essa noite. Que nos ensaios todos perceberam que a química funcionava. A fagulha estava la. Stamina. Quando encerrou, ele correu para o camarim e despencou em lágrimas. Chorou por si, pelo pai, pela mulher, filhos, por todos. E disse que esta foi a noite mais bonita de sua vida. Imaginem o prazer que teve. Quanto ao Celebration Day, ainda estou inebriado. É fato que em Blu Ray, é como assistir de camarote o show. Mas imagino o que deveria ser estar no meio da multidão, sentindo a energia, todos juntos. Deve ter sido ótimo.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Dó de Gil

Não que ele se importe, sequer saiba da minha dó por ele. Mas é que ao ouvir seus últimos discos, especialmente o último, "Concerto para Cordas e Máquinas de Ritmo", fiquei penalizado. Não que precise, está rodando o mundo, recebendo justíssimas homenagens por sua obra. Um gênio brasileiro, gênio internacional. Mas, há alguns anos aconteceu da garganta, as cordas vocais darem problema. Já operou. Não tem jeito. Gil, o excepcional cantor, rei do improviso vocal, orgulhoso de sua capacidade, não tem mais voz. E então acompanhamos suas interpretações de maravilhosas músicas, melodia, ritmo, letra, arranjos sensacionais de orquestra e vamos aos poucos, de dó, ficando tensos, torcendo por ele, esquecendo as outras maravilhas todas, querendo, a todo instante, que ele consiga o drible vocal que insinua e nada feito, ele vai no tom baixo, rouco, falhando, nos breves momentos em que o coração suplanta o cérebro e ele tenta a nota maviosa e falha. É muito chato. Eu, que tanto o amo, fui mal educado por ele. Sua voz, melodias, letras, ritmos. Não consigo ouvi-lo assim. E o cd é maravilhoso, até porque ele vai de Quanta a Domingo no Parque, canta Caymmi, Tom, Gonzaga e os arranjos são lindos. Não sei se o que o motiva a seguir em frente, ele que sempre foi tão orgulhoso de suas capacidades. Não consegue ficar longe do palco? Precisa do dinheiro? Em minha opinião, "Quanta" foi o último trabalho em que ainda nos ofereceu seu máximo. A partir daí, a fonte secou. O cd, consegui aproveitar um pouquinho mais na segunda escutada. Na primeira, terminei tenso, torcendo por ele. Desculpe, não pude evitar, fiquei com dó de Gil

Briga entre quadrilhas

Mesmo com as novas e cada vez mais terríveis descobertas sobre os crimes cometidos por petistas no Poder, há espaço suficiente, no noticiário, para a demissão de Mano Menezes no comando da seleção brasileira. Ocorreu em um raro momento em que o time por ele treinado, vinha obtendo razoável performance. O novo presidente da CBF disse que o treinador não havia sido sua escolha, que aguardou o término da temporada futebolística e que pensa na Copa das Confederações, ano que vem. Também não gosto de Mano Menezes. Minhas razões são menos técnicas e mais acusadoras de mais uma ação de quadrilha, visando dinheiro e poder.
Ricardo Teixeira foi procurado pelos "loucos do Corinthians", Ronalducho, Sanchez e outros, para um projeto ambicioso de transformar o "timão" em clube reconhecido internacionalmente, rico e forte. Se Ronalducho fez sua parte, Teixeira fez a sua. Contratou Mano Menezes, que era da turma "mosqueteira" para treinador. Assim, vendeu para a Europa um grande número de atletas do Corinthians, após convocá-los e faze-los jogar na seleção. Já nem lembramos seus nomes, tão medíocres que são. Mais ainda, delegou a Sanchez, ex-presidente do Corinthians, o comando da seleção. Tite, atual técnico do Corinthians, chegou a ser chamado "Homem do Ano", pela revista Alfa. O clube vem enumerando títulos e agora decide o campeonato mundial de clubes em Tóquio. Jogos transmitidos pela tv, álbum de figurinhas, camisas, um trabalho muito bem feito. Na seleção que jogou contra a Argentina naquela pelada em La Bombonera, metade dos convocados era do Fluminense, muito justamente, mas a outra metade era do "coringão". Pera lá. O Corinthians também ganhou um estádio, justamente para ter jogos na Copa, tendo sido desprezado o Morumbi, do São Paulo, por conta de toscos problemas. Até Lula se envolveu.
Mas Ricardo, que recebia sua parte, precisou cair fora. A ameaça clara de prisão fê-lo partir para Miami e deixar tudo nas mãos de seu vice, político das antigas, Marin, ligado históricamente ao São Paulo. A partir daí, em todos os jogos, Lucas, atleta do São Paulo, vendido para o Paris Saint Germain, ao qual se apresentará em janeiro, em transação recorde em euros, nunca foi escalado no time titular, a não ser faltando dez, quinze minutos para o final das partidas. Algumas vezes, foi escalado de ponta esquerda, onde não tem nenhum cacoete. Parecia provocação. E era. Em seu lugar, Hulk, que saiu de Portugal para a Ucrânia, sei lá, em transação também milionária.
Agora veio o troco. Acabou o ano da seleção, acabou Mano, seus ternos bem cortados, sua postura obtida em aulas de como lidar com jornalistas e uma idéia de seleção, que mesmo com erros de escalação, convocações interesseiras e outros, vinha se firmando. Saiu Mano, claro, pediu demissão, também, André Sanchez, o diretor, ex-presidente do Corinthians. Agora, quem manda é a turma do São Paulo. Mas que treinador virá? Todos queremos Guardiola, sabendo que os atuais técnicos brasileiros estão defasados inteiramente. Mas não. Ao que parece, teremos o mais defasado dos defasados, Felipão, no cargo. O mesmo que depois da Copa no Japão, conquistou o vice campeonato da Copa Européia, dirigindo Portugal, dona da sede, foi despedido após poucos jogos do Chelsea e agora, após conquistar a Copa do Brasil, não impediu a queda do Palmeiras à Série B. O resultado dessas "vitórias" é a seleção brasileira?
As quadrilhas brigam, o povo, apaixonado por sua seleção sofre, temos uma Copa pela frente e o que será de nós?

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Moscow, 15.30 horas, 31 graus, maré alta

Foi decisão de momento. A hora da maré cheia. Partimos para Mosqueiro. Hoje, em um domingo, para fazer a visita, é preciso abstrair, ignorar todos aqueles idiotas, com seus carros som a tocar brega, os bêbados na contramão, moças com saídas de praia de crochê, enfim, toda a má educação que maltrata a ilha, tão linda. Fomos direto ao Farol, o lugar dos meus sonhos, da infância e adolescência. Fiquei extasiado, parado, ali, naquele cenário magnífico. O vento à toda, despenteando minha alma, o mar encapelado, praticantes de kite surf, a Ilha dos Amores somente com sua parte mais alta e um céu azul de filme. Pisar na areia, repisar onde passei tantos momentos lindos e marcantes da vida. Momentos inesquecíveis. O Hotel, mantido pelas filhas de Dona Adelaide, tranquilas, como só podem ser. O banho, "pegando jacaré" nas ondas e deixa pra lá se a água é suja, não estrague meu momento. Até o Antônio mergulhou e nadou conosco. Depois subir e ficar pegando aquele vento exultante. Sair e passear, pisar novamente a pracinha, onde tanto brinquei, ver a árvore onde, um dia, pensei na vida, no silêncio de uma segunda feira, com meus pais e dois irmãos vindo a Belém. Aquele ruído distante das ondas quebrando, os coqueiros sussurrando e caminhar até a casa "Celina", hoje propriedade do amigo Mariano Klautau Filho. Não havia ninguém. Nem por isso, entrei. Fiquei ali na porta, calculando onde sentava, olhando por onde ia até a praia, jogar futebol. Olhar a lateral, onde passávamos rumo ao chuveiro ao ar livre, sentindo uma sombra gostosa das duas casas. A casa de "Seu" Harley Vieira, que se divertia à noite, fazendo mágicas para nós, crianças. Ou, de tarde, passeando em um kart, levando um de nós, de cada vez. Olhei as outras casas. Medi distâncias. Lembrei de coisas tão importantes, até hoje, que escrevo lacrimejando. Como era lindo, perfeito. Como fui feliz, mesmo quando era infeliz em minha timidez. E depois, contornar pela Bateria e olhar o quintal, onde jaz quieto, saudoso de companhia, um balouço que assisti, recentemente, em um vídeo de Mariano. Lembrei de todos. De minha família. Avós, pais, irmãos, primos, amigos. Era tão bom! E voltamos, enfrentando engarrafamento e retenções na estrada, nesta diária agressão que Estado e Município nos atingem. Não interessa. O impacto da visita, sempre o mesmo, inclusive, sei que me repito neste blog, é o mesmo. Quanta saudade!

O Homem que venceu Auschwitz

Relatos ou mesmo ficção a respeito do Holocausto dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial são muitos em diversos formatos. Parece que apenas aquele maluco do Ahmadinejad afirma que é uma mentira. Mas confesso que fiquei emocionado, impressionado com este livro, escrito por um sobrevivente, Denis Avey e Rob Broomby, repórter da BBC.
Denis alistou-se e começou a lutar na África. Prisioneiro, acabou em um navio que foi torpedeado. Pulou no Mediterrâneo e chegou à Itália, onde foi novamente feito prisioneiro. Por tentar escapar por duas vezes, foi castigado e passado adiante, em campos de prisioneiros de guerra. Acabou em Auschwitz, embora não na mesma condição dos judeus, estes, levados para lá com o intuito de assassinato em massa, mas antes, aproveitando os mais sadios em trabalho escravo e aniquilador. Denis estava com outros prisioneiros de guerra e também fazia trabalhos forçados. Sua alimentação era melhor, bem como acomodações. Impressionado com a brutalidade, a falta de qualquer humanidade e a motivação para o assassinato, por qualquer motivo, ou sem qualquer motivo, chegou a trocar duas vezes de identidade com um judeu, de tal forma a dar a ele uma noite de "conforto" e a ele a chance de observar tudo o que ouvia falar sobre a chacina cometida no campo de concentração. Seu relato deixa qualquer um nervoso, revoltado com tanta selvageria. Hitler, Himmler, os comandante, mas sobretudo o alemão nazista comum, soldado, como um que ao se irritar ouvindo o choro de uma criança, no colo da mãe, esfomeada, assustada, de madrugada, chegando em um daqueles trens, volta-se e desfere um potente murro na criança, matando-a. Assim, simples. Com o fim da guerra e a chegada dos russos em Auschwitz, levam os prisioneiros em coluna para um lado e os judeus para o outro. A marcha da morte. Denis conseguiu escapar, desta vez. Volta para casa e não consegue falar sobre o assunto. Sobre o que hoje se conhece como Stress Pós Traumático. Pior, todos queriam ouvir histórias de glórias e não a de um prisioneiro e pior, sobre a chacina em campos de concentração. Afinal, era um absurdo crer que isso poderia ter acontecido. Denis casou, descasou, voltou ao trabalho e os problemas continuaram. Tuberculose espalhada pelo corpo. Ficou quase dois anos em um hospital, recuperando-se da cirurgia. Seu corpo recusava-se a fechar o corte na barriga. Depois, perdeu um dos olhos, por câncer. Em Auschwitz, um rapaz, judeu, disse qualquer coisa e foi espancado até morrer, por chutes e golpes de rifle. Não conseguindo suportar, Denis insultou o guarda, que lhe deu uma forte coronhada no olho. O golpe veio cobrar a conta. Incrível como quase 60 anos depois foi que conseguiu relatar o que viu e ser recebido pelo Primeiro Ministro da Inglaterra, com a medalha Herói do Holocausto. Estava com 93 anos, há dois anos atrás. Espero que ainda esteja vivo, muito vivo e a cada dia de vida, seja mais feliz, mais vivo. Sinceramente. O livro é da Editora Nova Fronteira.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

A Lenda do Pianista do Mar

Como posso ter passado batido à época em que o filme passou por aqui? Meu filho assistiu em algum canal fechado, especializado em filmes antigos e desde então, passei a procurar até encontrar. O título, no original é "The Legend of 1900", direção de Giuseppe Tornatore, com Tim Roth no papel principal e música de Ennio Moriconi. Um navio que fazia a ponte entre NY e Liverpool. Nos altos, os ricos, nas classes mais populares, imigrantes. Um dia, logo após chegar, um maquinista, de cócoras, percorre o salão de festas à procura de "perdidos" e encontra um recém nascido, abandonado. Resolve adotá-lo. O nome, bem, "1900", porque o ano havia começado. Ele nunca sairá do navio. Não terá registro, não terá existido, nunca pisará em terra firme. E se tornará um grande pianista. Terá um amigo, pistonista e as chances de desembarcar e levar uma vida normal. Em meio a isso tudo, as músicas, as roupas, cenário e uma atmosfera de romance maravilhosa, no ar!

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Enfarruscado

Hoje está meio enfarruscado, o tempo. Não pude evitar. Senti como se fossem os últimos dias de novembro, já entrando dezembro. Eu e meus irmãos de férias. Não há melhor sensação do que acordar mais tarde, se espreguiçar e levar alguns minutos pensando no que fará neste dia. Nada! Maravilha, nada! Lembro quando subia a São Jerônimo, em direção à casa de meu saudoso amigo Abílio Cruz. A programação? O que ocorrer. Podíamos jogar futebol, no quintal da casa ou no Colégio Nazaré. Podíamos sair pelas ruas, jogando peteca, passeando de bicicleta. Delícia. Podíamos, eu e meu irmão Edgar, dar sequência ao nosso campeonato de botão, com direito a narração e tudo. Tínhamos equipes do Rio e São Paulo. Meu amigo Sérgio Zumero tinha o Remo, com o centro avante diferenciado, sua própria foto! Mas assim, não pode! Era na base do bate vai levando. Nossa mãe confeccionava uma bolan de lã, filó para as redes, era ótimo. Ou então, ficávamos jogados no que chamávamos "salão" do apartamento, ouvindo Beatles. Sim, tempo enfarruscado, para mim, é ouvir Beatles. "One, two, three, four.. let me tell you how it will be", as primeiras palavras de "Taxman", no disco "Revolver". Os Beatles ficavam adultos, começavam o disco esculhambando o Imposto de Renda. Não entendíamos inteiramente, apenas gostávamos do que ouvíamos. E o disco em sequência, os caras imitando Bob Dylan em "You've got to hide your love away". Ou então contando que o Dr. Robert ensinou-os a gostar de LSD, o que fica muito interessante na última faixa, onde inventaram o looping em "Tomorrow never knows". Ficávamos ali, ouvindo, cantando, arengando uns com os outros e o dia passava veloz, divertido, inesquecível. Agora vocês imaginam cinco irmãos juntos, quase o dia inteiro, conversando, ouvindo música, se alimentando de vida, curtindo as férias. Quando me perguntam de onde vem minha veia de escritor, sempre falo da família, pai, mãe, avô, tia e nem sempre cito meu irmão mais velho, Edgar Augusto. Penso que ele foi uma das figuras mais importantes, como um holofote que vai à frente, iluminando tudo. Com ele ouvi Beatles e todo o resto. Líamos Nelson Rodrigues com devoção. Havia jornais internos, histórias em quadrinhos, paródias de sucesso com provocações internas. Ou então cowboy, onde ele era o mocinho, Bill, eu e Janjo os malfeitores, Brown e Robin Hood (valia tudo) e minha irmã Celina era Maggie, a dona do saloon. Em tudo ele estava à frente. Quando amadureceu, foi em outra direção e eu como que prossegui com o que havia me ensinado. Os tempos mudam, a garotada, hoje, deve ter suas predileções de diversão. Mas toda vez que o tempo fica enfarruscado, lembro daqueles dias, de férias, jogado, ouvindo Beatles. Era muito bom.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Todo terrorista é sentimental

Muito bom de ler o livro "Todo terrorista é sentimental", de Márcio Menezes, editado pela Record. A trama se passa durante a década de 90 e utiliza alguns crimes de colarinho branco, perpetrados por políticos, mas devidamente mascarados, para propor a hipótese do terrorismo no Brasil. Realmente, somente um povo como o nosso para ir aceitando os acontecimentos com raiva, mas sem reagir, tamanhos os escândalos políticos nesta nossa democracia, ainda tão jovem. No livro, dois rapazes, estudantes, naquela fase da vida, a mais maravilhosa, quando o mundo se abre feito uma rosa, mil possibilidades, há estudos para terminar, expectativas totais, amores, hormônios, tudo explodindo, enfim, os dois rapazes estão indignados com os políticos nacionais. De demoradas discussões nos bares da Zona Sul do Rio de Janeiro, namoros, provas, vem a sugestão do terrorismo. Matar os corruptos. Criam o CCC, Comando Caça aos Corruptos, formado pelos dois amigos, mais uma moça que se junta após a primeira morte. Não temos histórico de terrorismo, a não ser alguns poucos atentados no tempo da Revolução. Estamos acostumados a assistir, diariamente, ocorrências do Iraque, até Espanha, mas nada daqui. A primeira bomba, artesanal, matou um corrupto e feriu uma criança. Chocou a opinião pública. O Governo. A mídia toda. Mas não havia um lugar para partir. O CCC não deixou sequer uma carta assumindo o atentado. E assim foram, se arriscando cada vez mais, aumentando também a voltagem de suas vidas amorosas, o sexo em todos os lugares, mais amor e até um terrorista do ETA, perdido no Leblon. Não vou contar como termina, lógico. Mas é bem escrito, atual e desenvolve uma idéia que considero muito perigosa, por condenar de todas as maneiras o terrorismo. Mas e se..

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O Círio

Não gosto de maniçoba, pato no tucupi, açaím tucupi, tacacá e outros. Mas não sou menos paraense que ninguém. Nunca perdi um Círio. Nunca. Colaborou para isso o fato de ter morado, desde o nascimento, em um prédio no trajeto da romaria. O apartamento, até hoje, fica lotado de parentes, amigos, amigos de amigos, minha família. Uma vez, meu pai me levou até a subida da Presidente Vargas. Acompanhamos a passagem da berlinda e depois seguimos atrás. Fomos até a sede do Clube do Remo. Lá meu pai ficou entre amigos e eu, pus-me bisbilhotar e observar a sede, seus frequentadores. Retornamos ao apartamento para o almoço. A memória trai, mas é o que lembro. No mais das vezes, era acordar cedo, com os foguetes dos estivadores, e correr para o banheiro, escondendo-se de visitas que já haviam chegado. Depois, receber amigos, primos, tios, enfim. E assistir meu pai em um de seus momentos mais felizes. Passava de grupo em grupo. Bebidas, somente após a passagem da Santa! E quando Ela vinha, todos às janelas, eu, meus irmãos, minha mãe e meu pai, juntos, emocionados. Era passar e já surgia um violão, alguém com pandeiro, o whisky rolando generoso e começava outra festa. Delival Nobre, meu pai, amigos, todos se divertindo. Descíamos até a Praça para comprar brinquedos cirianos. Ainda hoje faço isso. Faço para o menino que me habita. Eu me lembro de ir ao Largo. Da pavimentação em tábuas, barracas de madeira, bares, onde cantava Edna Fagundes, a rainha do brega, na época. e os brinquedos. Hola, Tira Prosa, Montanha Russa, Cavalinhos, Trem Fantasma, Casa dos Horrores. Uma vez, para não passar vergonha, topei alegremente ir com amigos no Trem Fantasma. Bastou o carrinho entrar na escuridão e fechei os olhos. Tinha medo. Na saída, despistei e eles não perceberam. Enquanto isso, tenho dois primos, que moravam nas cercanias do Largo e eram o terror, da Casa de Horrores. Entravam e iam jogando bombinhas, fósforos acesos nos "monstros", que gritavam de medo. Muito bom. Outro primo, na Roda Gigante, quando nosso assento estava no ponto mais alto, destrancava a barra de segurança e punha-se a fazer estrepolias, para nosso desespero. Era o Círio.
Hoje, continuo morando no trajeto do Círio. Recebo amigos, parentes. Acordo cedo por conta dos foguetes, ligo a tv e vejo onde está a berlinda. Mas quando Ela se aproxima, desço até o apartamento de minha mãe. Ficamos juntos, acompanhando a passagem Dela. Não sou devoto de Nazaré. Mas é Maria que está ali. Quando passa, sinto toda a energia que a berlinda recebe e retransmite. É algo brilhante, forte, emocionante. Momento único. Difícil explicar. Os que vêm de fora, sempre dizem que é muito, muito maior do que pensaram, após receberem informações.  Mesmo nos tempos em que não estava morando no prédio, acordava cedo, botava as crianças para correr, conosco, na "contramão" do Círio, até o apartamento. Não gosto dos pratos paraenses. Conheço poucas cidades do Pará. Sinto-me às vezes, estrangeiro em minha própria casa.  Mas nunca perdi um Cirio. Tomara que seja sempre assim. Feliz Círio para todos. E a falta que faz meu pai!

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Selva Concreta

Agora já está nas mãos dos interessados em ler. Aquilo que esteve comigo, no conhecimento de alguns poucos, é público. O livro está lançado. E os repórteres me perguntam, quais serão meus próximos projetos. Quando repórter, devo ter cometido o mesmo erro. A pessoa está ali, cheia de alegria pelo trabalho enfim lançado, querendo curtir o feedback e já precisa ter outro projeto em vista? E sim, eu tenho, mas vou primeiro ficar na boa, um tempo. Foi um ano bem puxado e a saúde anda cobrando a conta. O livro foi escrito como uma série policial passada em Belém. Seria o máximo tê-la realmente nas telas, perdoem o trocadilho. Peguei alguns personagens que vêm desde Os Éguas. Alguns casos continuam  no próximo capítulo, outros, não. Li um trecho do trabalho de Relivaldo, orientado por Ernani Chaves, para a Unama, referindo-se a "Os Éguas". É espantoso ler a explicação técnica para o que se está fazendo. Muito legal. Como artista, é claro que gosto do elogio, mas o autor quer, mesmo, é conversar, ouvir opiniões, possibilidades, voltar àquele ambiente do livro onde esteve mergulhado, solitário e que agora, com as portas abertas, recebe visitas. Marcelo Damaso, que tem livro inédito merecendo edição, trabalhava no Policial do Diário do Pará. Veio um dos crimes. Conversamos pelo telefone. Ele escreve a "orelha". A edição é primorosa. A equipe de Ivana Jinkings é ótima. Vai espalhar o livro pelo Brasil, esta sim a graaaaannnde vitória de um autor de Belém do Pará. Aos amigos que compareceram ao lançamento, o meu agradecimento. Sair de casa especialmente para ir dar um abraço e adquirir o livro é prova de amizade, hoje em dia. Tomara que gostem.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Falta de respeito

Está cada vez mais difícil assistir jogos de futebol realizados no Brasil. Com os canais fechados, há uma profusão de prélios disputados em outros países, sobretudo na Europa. Campos lindos, uniformes, torcida, grandes jogadores e acima de tudo, respeito profissional, ética. Aqui é ao contrário. Talvez seja o espelho do que ocorre em nossa sociedade, o desespero pelo dinheiro, as pressões de todos os lados, a falta de educação, ética profissional. É muito difícil. Nossos atletas disputam as jogadas com total ferocidade. Técnicos mandam cometer faltas para segurar o jogo, evitar contra ataques. Há quem mostre estatísticas com os mais faltosos sendo vencedores. É falta de respeito. Respeito profissional. Considero a falta uma confissão de menor qualidade técnica. é humilhante para quem a comete. Falta de educação para com o jogo, o colega e sim, a platéia que pagou para assistir a um espetáculo de futebol, não de MMA. E se não se respeitam, não respeitam os juízes, que por seu lado, atacados por todos os lados, pressionados e com um esporte onde a bola circula cada vez mais rápido, não se dão ao respeito. Há jogadores que desde o primeiro minuto estão reclamando aos gritos, gestos e palavrões. Não posso dizer que os jogos na Europa sejam o paraíso. Na Itália há também pancadaria. Mas na Inglaterra, por exemplo, há respeito. Há rispidez, lógico, há contato, mas com respeito, ética. Juízes e atletas estão ali para jogar e a platéia para assistir. Nos últimos dias, assisti Remo x Vilhena, horrível. Assisti Fluminense x Corinthians, horrível. Flamengo x Sport, horrível. Me senti desrespeitado.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Barata vem aí, o bicho vai pegar!

Agora contamos as horas para a estréia de Barata, pega na chinela e mata. Foram dois anos entre primeiros estudos, conversas, oficinas, criação, ensaios e montagem. Um orgulho conseguir o patrocínio da Petrobrás. Mais do que isso, poder manter o Cuíra em atividade, mesmo no deserto de idéias em que a área cultural vive no Pará. Aqueles quinze minutos antes de abrir as portas ao público são os melhores momentos de toda uma vida. Quem já viveu, sabe. Perguntamo-nos se "eles virão". Sempre. Olho para trás e vejo o quanto de trabalho foi feito. Já escrevi um bom número de textos teatrais. Acompanhei montagens e agora comemoro minha terceira direção, desta vez, com a parceria luxuosa de Leonel Ferreira. Como começo a escrever? Quando? Não sei. Cada texto tem sua vontade, seu motivo. Nunca sei como iniciar ou onde vai dar. Estudei a vida de Barata. O sensacional livro de Carlos Rocque. Reli Haroldo Maranhão. Raymundo Sobral e Salomão Laredo enviaram livros. Na Conversa Barata ouvi as histórias, conversei com Aurélio do Carmo. Como vieram as músicas? Na rua. Em minha casa, ligando o gravador, deixando fluir a melodia, a letra. Houve uma que fiz a caminho de uma pelada de futebol. Gravei no Iphone. Como um quebra cabeças. Ir e vir nas datas. Meu compromisso é com o espetáculo. As escolas que tratem de ensinar melhor a história do Pará. Não fiz um documentário e sim uma peça de teatro. Para rir, chorar, emocionar e até ficar com raiva. Qual vai ser o processo, desta vez? Não há fórmula, pelo menos eu não tenho. Qual a primeira cena a ser encenada? Os papéis sendo distribuídos. Mudei uma cena inteira na metade do processo. Você escreve, leva o papel para o ator e no dia seguinte o assiste. Legal. Meu irmão Edgar Augusto e os amigos Nilson Chaves e Lucinha Bastos gravaram as músicas belamente tocadas por Jacinto Kahwage. E aos poucos tudo vai encaixando.  E compomos o elenco. Gente do entorno do Cuíra. Prostitutas, michês, gente jovem que fez as oficinas e alguns atores experimentados. Imaginem como juntar elenco tão heterogêneo. Estamos falando de um musical. Canto, dança e teatro. Danilo Bracci e sua equipe deram força na coreografia. Adriana Malato, do elenco, aqueceu as vozes. Klau Menezes nos figurinos. Oriana Bitar na cenografia. A turma vai crescendo, todos estudando, dando seu melhor, opinando, enquanto os ensaios correm e vamos, eu e Leonel, ouvindo a todos, harmonizando, juntando, fazendo um todo. Acima de todos, Zê Charone, a comandante da produção, missão espinhosa, difícil, porque precisa dizer não, muitas vezes. Não pensem que é tudo cor de rosa, bonitinho. Brigamos muito, discutimos, argumentamos até encontrar a direção certa. Ficaram alguns pelo caminho. Houve um atraso. Compromissos. Tristes por quem não pôde continuar, mas o bonde continuou e agora contamos as horas para a estréia.
Pessoalmente não gosto de Magalhães Barata. Não gosto dessas pessoas que se impõe aos gritos, mandonas, fazendo o mundo do seu jeito, centralizadoras, enfim. Não são meu tipo. Mas são de muita gente. Barata, em toda sua longa atuação, ao longo de 60 anos de vida pública, influiu na vida de muitas famílias paraenses. A minha, por exemplo. Tive um tio, Raimundo Camarão, político, que foi embora e nunca mais voltou e outro, Líbero Luxardo, que foi seu braço direito. Na família de minha mãe, situação e oposição, convivendo. Nós, principalmente belemenses, não sabemos nada de nossa história. Fiquei emocionado ao ler Carlos Rocque. Tantas emoções! Belém era como uma Camelot, um mundo à parte, à meia distância de Londres, Paris, do Rio de Janeiro, na época, a capital. Sua gente, acontecimentos, dramas, política, cultural, um mundo maravilhoso que foi extinto com a chegada da Belém Brasília, da televisão e da revolução militar. O Cuíra falou disso tudo. Começamos contando um pouco da Zona do Meretrício em Laquê. Depois, a Rádio Clube em Prc5 - a voz que fala e canta para a planície. Agora vem o Barata.
Tomara que gostem. A equipe está muito esperançosa quanto ao público. Dentro de poucas horas, estaremos nos bastidores de mãos dadas, dizendo as últimas palavras, recomendações, ouvindo o burburinho e de repente, tocará a terceira campa. Um arrepio passará pelos corpos e a cortina abrirá. Nos Estados Unidos, dizem "break a leg". Aqui é o merda! Ao sucesso, Cuíra!

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

18tola da Pan

Meu pai fez o possível para que não seguíssemos na carreira de radialistas ou jornalistas. Achava difícil,  mal remunerada. Bem, continuam sendo. Queria que fizéssemos concurso para o Basa, como ele. Não. Hoje, quando olho para trás, percebo que ele tinha razão mas não mudaria em nada. Após algum tempo entre Rádio Clube e fundação da Rádio Cultura, veio a Rádio Cidade Morena. Eu e meu irmão Janjo. Tempos difíceis. Terríveis. Contas para pagar. Pouca credibilidade. Éramos muito novos. Vencemos. Uma briga de família acabou com a Rádio Cidade e adiante, com o Jornal do Brasil que hoje, com novo dono, pode ser lido somente pela web. Mesmo assim, conhecendo as pedras para falar com jovens, continuamos. Os irmãos Carvalho, Tutinha e Marcelo, com a experiência da Jovem Pan AM e a própria FM, partiram para a Rede e nos convidaram. Desconfiado, peguei o avião, liguei no hotel e percebi que era tudo verdade. A Pan Belém iniciou em 22 de agosto. A rede cresceu, virou gigante. De dois em dois anos, work weeks, encontros de Pans de todo Brasil. Neles, somos considerados top de linha. E estamos em Belém do Pará. 
Fazer rádio é um aprendizado diário. Tem alguma coisa de talento, muito de estudo e perspicácia. Todo dia há uma novidade. Equipamentos, novos relacionamentos nas mídias sociais, leitura de estatísticas, números. É a melhor rede de rádios do Brasil, bastava ficar ligado no satélite, ficar sentado, pegando sol, curtindo e ganhando dinheiro. Não. Transformamos os breaks comerciais. Inventamos a relação direta com ouvintes. Fazemos programas locais com o mesmo nível dos nacionais. Bebemos direto da jugular dos jovens a linguagem, gírias, novidades. Tweeter, blogs, faces, twitcam, o que vier nós traçamos. Agora começamos a vender espaços nessas mídias sociais. É tudo tão moderno, veloz e a rádio sendo a base. As coisas nascem com e para ela e o todo é como um oráculo que não somente emite, mas sobretudo retransmite, alimenta e se realimenta. É preciso planejar, saber ler números, mas não esquecer de ousar, brincar, divertir-se. Mesmo com todo o estudo, profissionalismo, uma equipe jovem, multidisciplinar, cheia de gás e conhecimento, todos formados em marketing, jornalismo e administração, penso que o segredo sempre esteve na diversão, na mente aberta à novidade, à curiosidade que mantemos, eu e meu irmão Janjo, ele um excelente apresentador, uma esponja, sempre atento a tudo. O 18tola da Pan é uma jogada de marketing deliciosa, pois se é uma Jovem Pan, nada mais natural do que festejar seus 18 anos, mas é também a possibilidade de festejar um momento incrível em que juntamos competência e entusiasmo, preparo e audácia para ser os melhores. Sinto muito orgulho do que atingi, com meu irmão e a equipe e lembro de meu pai e seus medos. Sim, é uma vida de aventuras e riscos. Por isso mesmo, maravilhosa.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Feliz Dia dos Pais

Agora serei avô. Um menino, que pode ser ariano, como eu. Meu primeiro neto. A notícia veio agora, próximo ao Dia dos Pais. Tenho dois filhos. Se fosse uma neta, seria uma novidade. Mas um neto, um companheiro, puxa, acho que será maravilhoso. Será Flamengo, com certeza, mesmo com os esforços do outro avô, vascaíno. Meu avô Edgar, com quem convivi, não tinha mais essas preocupações. Remista (criou o apelido "Leão Azul"), também estava na fundação do Paysandu. Isso em uma outra época, sem o antagonismo de hoje. Lembro de estar em sua sala, na Rádio Clube, cheia de jornais. Baixinho, cabeçudo, orelhudo, dizia que eu era sua "miniatura". Andava pelas ruas cumprimentando à direita e à esquerda. Todos o conheciam! E quando o professor pediu para ler "Menino de Engenho", de José Lins do Rego (livro que me fez apaixonar pela Literatura), vovô me emprestou seu exemplar, com direito a dedicatória de próprio punho do escritor. No Rio de Janeiro, após o almoço, ouvíamos, alto, Beatles, Rolling Stones e lá vinha ele, dono do ap, de pijamas, chinelo arrastando, pedir com toda a educação, que diminuíssemos o volume para ele tirar sua sesta. Lembro dele, aos domingos, na casa do Lago Azul, paletó de linho, se abanando com uma das mãos e a outra segurando o radinho onde ouvia sua crônica ser lida. Meu avô querido, que já conheci velhinho, sem os poderes que lhe fizeram ser o grande homem que foi, mesmo com a baixa estatura. Seu humor inteligente, de poucas palavras e muita ironia, que penso ter herdado, com meus irmãos. Não me tratava como criança e sim como um colega, "seu" colega, me passando experiência, respeito, caráter. Estava sempre lendo alguma coisa. Os jornais que lhe eram enviados pela Lux. Naquela época, o cliente escolhia os assuntos de preferência e semanalmente a Lux enviava em pacotes, notícias daqueles assuntos, para leitura. Acho que vem daí meu vício pelos jornais. E agora serei avô, próximo ao Dia dos Pais. O meu, é como se não houvesse partido, tão cedo, abruptamente. Está sempre em meus pensamentos. Às vezes rio sozinho quando lembro de algum chiste. Conosco não era expansivo, cheio de gestos. Estava tudo nos olhos, na voz, no comportamento. Durante a infância, estava muito ocupado em uns cinco empregos, para segurar a onda de cinco filhos. Mas quando adolescemos, foi como se uma primavera também acontecesse a ele. Voltou ao violão que havia abandonado ao casar e assumir uma vida "séria". Voltou à leitura, à poesia. Futebol me ensinou a jogar e principalmente, "ver", como jornalista. Lembro do dia em que o comuniquei que iria desistir do curso de Engenharia Civil, na Ufpa e faria vestibular novamente, para Jornalismo. Foi contra. Termine primeiro seu curso, dizia. Não obedeci. Rara ocasião. Compreendia sua posição mas era uma decisão de vida. Que bom que fiz isso. Nos aproximamos ainda mais. Viramos amigos, de jogar conversa fora. Aposentado, estava diariamente em minha sala, botando o papo em dia. Mais tarde, herdei seus amigos, grandes amigos, que passavam para tomar um cafezinho, uma vez por semana, ao menos. Desculpem o lugar comum, mas todo dia é Dia dos Pais. Se ele está comigo em todos os momentos! Tinha um temperamento calmo, mas virava vulcão se provocado. Era tímido, isso, bem tímido, talvez para contrapor o pai, exuberante, amante dos grandes eventos. Então o Clube do Camelo resolveu fazer um show, no teatrinho do Museu Goeldi. Me convidou para dirigir. No palco, ouvindo instruções, rindo em obedecer. Ou então ao computador. Velocista ao teclar, tinha um vício de postura de um dedo das mãos que tocava em uma tecla e, de vez em quando, abria outro documento em branco. Ele não percebia. Me ligava. Esta pinóia apagou todo o meu trabalho! Então ouvia suas queixas e ia até seu escritório, reencontrar seu trabalho. Puxa, como somos amigos! Mas queria, neste Dia dos Pais, quando devo almoçar com meus filhos, queria que ele estivesse comigo, fisicamente. Queria lhe abraçar e ouvi-lo, brincando, "toma a benção, rapaz!". Era especial.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

70 Caetanos

Caetano Veloso é meu ídolo. Minhas primeiras lembranças são de vê-lo, na tv em p&b, fazendo um programa em que acertava canções a partir de pistas dadas. Competia, entre outros, com Chico Buarque. Sim, eu lembro dele no Festival da Record, cantando "Alegria, Alegria". Eu era muito novo mas ele já me despertava com sua agressividade criativa, a figura diferente, a música nova. Lembro de seu casamento, passando na tv e de sua ida ao Chacrinha. E então ele veio a Belém, se apresentar em um festival de música ou de grupos musicais, no Ginásio Serra Freire, do Clube do Remo. Os Baobás acompanhando, ele sentado em um tapete, toma uma flor e começa a comer. Vivendo em Belém, distante de tudo, atrasado nas informações, mas desesperadamente interessado em saber, achei aquilo muito estranho. Muito moderno.. Quando entrei na Rádio Clube do Pará, achei seus primeiros lps e compactos. E então veio o disco do "Alegria, Alegria" e pronto. Tudo o que ele fazia era moderno. Suas músicas, suas letras, atitudes, visual. Eu o entrevistei uma vez, após o lançamento de "Velô". Pareceu-me baixinho, pequeno, mas no palco, um gigante. Como disse no aceso da gravação de "É Proibido Proibir", "eu e Gil entramos e saímos de todas as estruturas". Caetano comentava filmes, livros, tudo. Respondia a insultos. Quando voltou de Londres, pintou a boca, usou saia e tamancos holandeses, imitando uma Carmen Miranda. É muito difícil dizer o que mais gosto nele, mas penso que aquela fase do "Muito", quando corria o Brasil com sua banda, foi maravilhosa. Ele não concorda. Paula Lavigne acabou com isso. Descobriu que aquela turma toda se divertia muito, mas Caetano, um grande astro, não ganhava dinheiro. E aí inicia uma fase em que ele ficou rico e a qualidade, por algum motivo, foi caindo. Seus discos deixaram de ser bons por inteiro. O compositor foi piorando. Desculpe, acostumou-nos tão exigentes! O cantor continuou excelente. Mas penso que nos últimos dez ou quinze anos, caiu muito. Desgosto brutalmente de seus últimos discos, mais roqueiros. Compro, no entanto, porque é meu ídolo e o admiro, mesmo assim. Mais do que de Gil, embora também seja meu ídolo. Mais do que Chico, do qual atualmente gosto mais. Eu achava Chico careta. Me enganei. Mas é que Caetano.. Há pouco ouvi sua discografia. Tem razão, às vezes ele parece apressado em terminar as canções. Há versos que sinto, um pouco mais de trabalho e ficariam melhores. Agora escreve aos domingos em O Globo. Às vezes, muito chato. Escreve muito. Demais. Palavras demais. Incomoda. Em outras, revelações e belezas. Meu ídolo faz 70 anos e me dou conta do tempo que passa, que também tenho cabelos brancos e agora serei avô.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Desafinando o côro dos contentes


DESAFINANDO O CÔRO DOS CONTENTES
Por favor, não me chamem de remista se critico o Paysandu. Nem de petista se falo contra o Psdb ou Pmdb. Acontece muito numa terra onde há muita bipolaridade. Ou é um ou outro. Mas é que sou contra o Terruá Pará. Não gosto do nome, detesto a idéia, gosto muito dos artistas, mas é tudo tão fora de lugar, tão deslocado, que é mais um tabefe na cara de quem faz Cultura por aqui. É como voltar a realizar aquele Festival de Ópera que consumia milhões, fazia a alegria de poucos, apenas por capricho, mas desta vez, usando nossos artistas, grandes artistas, mas precisados de dinheiro, fama, jogando em seus olhos a poeira de um projeto que não está amparado em nada. Mais um capricho. Desde que o Psdb tomou o Poder, para contentar apoiadores eleitorais, fatiou a área de Cultura, entregando-a a políticos ou amadores, cada qual não entendendo a razão de estar ali, mas dispostos a aparecer com farras e quermesses. Isso piorou com o Pt que conseguiu ser ainda pior e agora chega ao ápice. Cada um faz a sua Cultura, do jeito que entende, todos dão tiros e ninguém acerta o alvo, pelo contrário, é apenas gasto. Ao invés de projetos estruturantes de mercado, trabalho lento, para chegar a todo o Estado, inclusive Belém, já que a Prefeitura há muito mais tempo sumiu da Cultura, todos querem fazer gol, correr para o abraço, câmeras, fotos.
Se vem um empresário e resolve investir em uma atração, chamando-a de Terruá Pará, aluga teatro, serviços, geradores, paga cachês ótimos para cantores e músicos, escolhidos segundo sua consciência, grava tudo para ganhar na venda de dvds em embalagens luxuosas, leva para São Paulo certo que a bilheteria será ótima, parabéns. Mas quando é o Estado, com dinheiro público, é mais complicado. Quando é uma Secretaria de Comunicação e não de Cultura, mais ainda. Quando os artistas são escolhidos a bel prazer, ufa. E isso ocorre quando, passados um ano e meio do governo atual, nada, absolutamente nada foi feito para a Cultura paraense. Nada. No máximo, houve inscrições, análise e divulgação de projetos de artistas que receberam aval para a Lei Rouanet. Os teatros estão em obras, se é que estão, o Teatro da Paz cobra 3 mil reais por noite. Será que Dona Onete seguraria três noites seguidas? Como podem querer conquistar o País se ainda não conquistaram seu Estado? Sua aldeia, sua Belém. Realizam sonhos. Gastam alguns milhões.
PARÁ NA MÍDIA NACIONAL
É verdade. Nos últimos tempos, em função de várias razões, temos estado bem cotados no Rj e Sp. Fotógrafos como Luiz Braga, pintores como Emanuel Nassar, artes plásticas e nossa música. Gaby Amarantos foi vista bem antes do Terruá, por Herman Vianna (irmão de Herbert), Nelson Motta e recomendada a uma galera que precisava vender uma novidade ao mercado. Bancada pela Som Livre (Globo), teve a sorte e o talento de estar em todos os programas da tv, jornais e revistas, arrebentando com música tema de novela. Lia Sophia teve a sorte de botar, também, sua “Ai Menina”, que é uma delícia. Tomara que a Gang do Eletro se dê bem. Felipe Cordeiro também havia sido visto. Mas pergunto se, fora Gaby, alguém segura Teatro da Paz, quase mil lugares, três dias seguidos. Será que todos do Terruá aguentariam? Afinal, os ingressos foram de graça. Assim é que é bom! De graça, até injeção na testa. O jornalista Leonardo, de O Globo, a convite do Terruá, esteve em Belém e corretamente, além de presenciar o espetáculo, aproveitou para entrevistar com outros artistas locais. Muito bom.
A REALIDADE
É verdade que declarei que a realidade da Cultura, aqui, não é a do Terruá. Quando acaba a festa e voltam para casa, vem a segunda feira e os artistas se perguntam o que farão em seguida. A nossa realidade é o excelente cantor Arthur Nogueira se mudando para o Rio, onde tentará a carreira. É a ótima Jeanne Darwich, que acaba de voltar do sul onde foi entrevistada em rádios, apresentou-se na Fnac e outros lugares, anunciar que estará cantando no “palco móvel” da Estação das Docas, local mais que humilhante para um artista com obra, com discos gravados, ali funcionando como fundo musical, cantando Djavan e “parabéns pra você” para algum frequentador dos restaurantes, ou na Praça de alimentação do Shopping Castanheira. Essa é a realidade. Todo o dinheiro e energia envolvido no Terruá, toda a alegria das esfuziantes estagiárias, cruzando daqui pra lá com suas pranchetas, toda a certeza de estar fazendo a coisa certa, tudo isso deveria ser dirigido à estruturação de um mercado, aí sim, com a Secretaria de Comunicação agindo através da Funtelpa e adiante, reunindo os mais destacados, de alguma maneira correta escolhidos, para sair em busca de outras áreas, levando cada vez mais longe o nome do Pará. Mas isso demanda tempo, trabalho, conhecimento e a ansiedade de fazer o gol, correr para o abraço, com a certeza de realizar um grande momento, não pode esperar.
A querida colega Márcia Carvalho disse que os que não gostaram do Terruá deviam ser ruins da cabeça ou doentes do pé. Sou um desses. 

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O Brasil e as Olimpíadas

Muito engraçada a legenda de uma foto postada no Instagram, tirada da televisão, onde o ministro Joaquim Barbosa falava durante o julgamento do mensalão: melhor que as olimpíadas.. Os jogos, que se realizam em Londres, estão sendo transmitidos pela Record, que afrontou a Globo comprando os direitos. As imagens são excelentes, mas as locuções, não. Nossos profissionais se acostumaram a narrar com dose alta de torcida, porque na grande maioria das vezes, trabalham em jogos de vôlei e futebol. Então, induzem o espectador a torcer, acreditar na possibilidade de vitória, que poucas vezes vem. Então damo-nos conta da abissal distância de nosso nível esportivo para as grandes nações do planeta. A entrevista da moça que ganhou a medalha no judô, emocionada, saiu do Piauí, acho, chegou com pouco peso ao centro de treinamento, lutou duramente até a conquista. Os caras do halterofilismo, corrida, tênis de mesa e muitos outros esportes, que não recebem nenhuma atenção, nenhum investimento, que trabalham oito horas seguidas e só depois, usando tênis usados, impróprios, carregando barras de ferro com pesos de cimento, improvisados, de repente vêem-se ali, no ginásio ultra moderno, lotado e com jornalistas brasileiros cobrando resultados. Lutam, dão a vida, não conseguem e nós, aqui, após torcer, resmungamos que eles não são de nada. Passo pelo faxineiro do prédio que olha os últimos momentos da vitória japonesa sobre as meninas brasileiras no futebol. Está revoltado pela derrota, justamente para o Japão! Não interessa se as moças nem tem onde jogar e quando jogam é em campos esburacados, sem nenhuma atenção, à exceção de Marta que foi fazer sua vida na Europa.
E fico pensando nas Olimpíadas no Brasil. Em quatro anos não faremos nenhuma revolução aqui. A geração que chegaria a disputar as medalhas e assim justificar os investimentos feitos, já deveria estar trabalhando há pelo menos quatro anos e isso não foi feito. Pior, estaremos submetendo esses atletas a uma pressão terrível, feita pela família, vizinhos, todo mundo, a tentar vitórias impossíveis. E serão xingados, vaiados, pois temos a mania de achar que vamos vencer tudo, que brasileiro não desiste nunca. Sinceramente, acho até perigoso realizar os jogos no Brasil. Não temos culpa de nada. Ou temos, toda a culpa, por votar em quem não devemos votar.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

As pretinhas

Quando meu pai escrevia à mão, sua letra era incompreensível. Não entendia a razão. Hoje, minha letra também é, até para mim, às vezes, embora o conjunto seja interessante. O pai escrevia muito rápido na máquina de datilografar. Usava apenas dois dedos de cada mão. Minha mãe me matriculou em uma escola de datilografia. Garoto, reclamei muito. Hoje, como eu agradeço! Escrevo com todos os dedos em velocidade no mínimo igual à de meu pai. Compreendo a razão para a escrita à mão ser quase incompreensível. O costume de datilografar. Com a velocidade, o pensamento quase segue junto. À mão, perdemos a paciência. Chego até a sentir alguma dor no dorso da mão se escrevo mais longamente. Mais que as indumentárias e outros detalhes da exposição sobre a Televisão que está no Boulevard Shopping, fiquei atento às máquinas de datilografar. Saudoso. No programa do Jô alguém disse que elas, máquinas, explicando a um garoto, são notebooks onde escrevemos e a impressão sai na mesma hora. Meu pai teve uma Royal linda, portátil. Trabalhei muito com Olivettis manuais. Muitas vezes, travei as teclas na velocidade de meu trabalho, pura vaidade. Quando escrevia o Zeppelin, espancava as teclas, compondo vinte páginas tablóide, semanais, matraqueando sem parar e com esmero. Depois vieram as máquinas elétricas, aquelas com esfera, que adorava, também, travar, com a velocidade superior à sua. Aí já podíamos escolher a fonte de nossos escritos e a minha, simples, era Courier New. A Olivetti veio com outra elétrica, mais moderna, sem esfera e de repente, chegaram os computadores. Eu trabalhava no Centur e meu computador tinha o programa Carta Certa, ou seja, eu o usava como uma máquina de datilografar, apenas. Escrevia em papel as teclas a serem apertadas para ligar e desligar. Uma vez, travou. Liguei para meu chefe, que sabia tudo de computação e perguntei o que fazer: dá um boot! O que é boot? Porra, Edyr, é Alt Control Del. Ah, bom. Comprei meu primeiro notebook de um judeu em New York que me pensou me enganar, pois a marca era muito fraca. Pensou em enganar, porque o notebook funcionou muito bem, por muito tempo. Corri, tremendo, para o hotel. Abri a caixa, liguei na parede e surge DOS. Precisava instalar programas para usar. Puxa vida, ficou para quando chegasse a Belém. Outro amigo, grande advogado, não gostava de internet. Não tinha paciência em aguardar o download por conta das linhas telefônicas da época. Quero ler o G1, teclava e ia tomar um copo d'água, fazer um lanche. De um dia para o outro, passamos a escrever nossas colunas de jornal direto, na tela, no espaço que nos cabia. Como assim? Difícil entender. Escrevíamos, antes, em laudas que eram entregues, copideskadas, longo trajeto até as impressoras. O Jornal do Brasil publicou um livrinho com instruções sobre o uso de computadores. Millor Fernandes dizia não se acostumar sem as suas pretinhas.. Nem eu, nem eu. 
Hoje, cercado por notebook, Ipad, Iphone, desktop e agora as televisões obedecendo ordens vocais ou gestos, penso como passou rápido isso tudo. Penso na minha capacidade em aprender e a curiosidade em esperar sempre mais. Minha escrita à mão deteriorou por conta dessa rapidez. Meu pai também tinha. Com mais de 70 anos, comprou seu primeiro computador. Não tinha muita paciência, mas queria aprender. E agora minha fonte é Letter Gothic BT.