sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

FELIZ 2015

Onde vocês vão passar o réveillon? Na praia, pulando sete ondinhas, em um dos clubes da cidade, naquele magote de gente feliz que canta a plenos pulmões músicas dos carnavais dos anos 50, século 20? Vai reunir a família e atravessar o ano com uma tv na frente e as pessoas se alternando ao microfone em um karaokê infame? Quando era criança, garoto de apartamento, ficava ouvindo a molecada bater com pau nos postes de ferro e imaginava cenas. Já participei das sete ondinhas, do magote de gente feliz, mas hoje não sei bem o que fazer nesse momento. Com o passar do tempo, percebi que é, meramente uma data a mudar na folhinha e vida que segue. Não tiro o astral de ninguém que da noite para o dia vira expert em umbanda, diz que é filho deste, afilhado daquele Oxum. Acho muito bonita a cerimônia, principalmente a alegria. Mas também não vou aos salões, entrando de smoking e saindo esbagaçado, suado, olhos rútilos, rouco, a dizer “viva 2015, porra!”. Se dependesse de mim, reuniria os amigos em uma grande sala, para ficar conversando, rindo, curtindo, até o sol nascer. Uma farra mental, digamos. Há alguns anos, meu irmão era dono de uma boate, Zeppelin, e sempre pedia um texto para a passagem de ano. E lá ia eu a escrever e pensar como comover aquele bando de bêbados, já dispostos a rir e chorar por qualquer coisa. Ligam as luzes, entra o texto, música empolgante e lá vem a contagem, cinco, quatro, três, dois, um e todos pulamos e nos abraçamos, mesmo aqueles que não conhecemos, desejando feliz ano novo. E lá vem o hino do Brasil e aquela malta fica emperdigada e respeitosa, cantando em altos brados, o brado do Ipiranga. A orquestra já está a postos para a chamada de metais do frevo e aquela manada de elefantes, mulheres em vestidos caríssimos, se arrebentar no meio da pista. Certa vez, experimentei fechar os ouvidos e ficar apenas olhando as pessoas se esbaldando. Chamava de tio um amigo de meu pai. Homem grande, severo, médico festejado, ilibado. Tocava carnaval ele ia para a pista, fantasiado de pierrot, a pintura a conferir gravidade/inocência em seu rosto, e pulava sem parar. Eu o via, olhos fechados, uma festa particular, cantando “oh jardineira porque estás tão triste”.. E pensava se a alma daquele homem se revelava, ali, linda, paetês à farta. Em câmera lenta, como alguns filmes já mostraram, é algo muito bonito de ver. É só um pretexto para festejar? Fazer juras, garantir que começa a ginástica na segunda feira, abandona o cigarro de vez, não beberá mais de duas latinhas de cerveja ao final de semana, enfim, é apenas uma data. E foi um ano muito difícil, intenso. Realizamos uma Copa do Mundo que somente nos trouxe dissabores, seja pelos alemães, seja pelo que foi gasto. Tivemos uma eleição que deixou bem clara a divisão hoje no país. E os escândalos se sucedendo, as tramas reveladas a cada dia alcançando mais audiência do que a ficção das novelas. A inflação chegou e penso em toda uma geração que nunca soube o que se trata, sentindo na pele os preços subindo, aplicações no overnight, enfim.

Vai usar cueca ou calcinha de que cor, para obter fama, dinheiro, amor, sei lá, para todas as cores há uma idéia. Vai ficar vendo na tv o ano romper na Australia, Italia, Japão e o réveillon no Rio de Janeiro? Aqueles fogos maravilhosos, mas consigo apenas pensar em quanto dinheiro está sendo queimado. A Avenida Paulista lotada e a solidão das ruas de Belém? Por mim, fico bem acompanhado, conferindo de longe a barulhada. É só uma data, mas respeito quem gosta e vibra. Feliz 2015 a todos.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

PAPAI NOEL BEBE!

Eu gosto do Natal. Gosto do tempo nublado, de Papai Noel, troca de presentes, árvore. Gosto de reunir a família. Gosto de dar presentes. Na minha casa o Natal sempre foi festivo. Acreditei em Papai Noel por pouco tempo, mas sua figura até hoje me emociona. Lembro quando a magia do “bom velhinho” acabou. No térreo do prédio em que morava, havia uma loja, Salevy, de Samuca Levy, a quem chamava de tio. Um arremedo do que hoje se chama shopping center. Colocava algumas barracas na calçada, uma feirinha, na semana que antecedia a festa. Em certo dia, Papai Noel chegava no Renascença e vinha descendo, andar por andar, cumprimentando os moradores e da sacada, jogava bombons para a multidão que desde cedo ocupava a rua. Diziam que ele chegava de helicóptero, mas na verdade, desde cedo “Buraco” ia até o último andar onde vestia o traje e iniciava a descida. Era Manoel Gaspar, um senhor que ganhava a vida com  propaganda volante, de muita história. Longe de ficar feliz com a visita à minha casa, do Papai Noel, ficava em pânico, por conta de sua importância, a partir de causos e histórias contadas por minha mãe. Eu, meus irmãos e primos, aterrorizados, nos escondíamos atrás de qualquer sofá. E finalmente ele chegou. O irmão mais velho era nosso repórter. Sua primeira manchete foi: “o Papai Noel conhece o papai”. Como assim? Eu o ouvi falar “Edyr, como vai, amigo”. Ficamos debatendo a notícia e lá vem o Edgar novamente e conta que Papai Noel chama nome feio! Como assim? “Eu o ouvi dizendo “porra, Edyr, essa roupa é muito quente!”. Isso era natural, porque o velhinho vinha do Pólo Norte. Lá vem o Edgar novamente e diz: ”Papai Noel bebe!”. Que absurdo! Como, assim. O papai ofereceu e ele aceitou um copo de whisky. Para ser sincero, Buraco, até chegar ao térreo e fazer a festa das crianças, tomava uns goles em cada apartamento e até lá embaixo, já estava “calibrado”.
Em nome do Natal, também realizei trocas surpreendentes. Pedi e ganhei um “Papa Filas”, na época, um ônibus maior que os outros, puxado a reboque. Era domingo, e a família foi para o Lago Azul. Chegando, saí logo a desfilar pelas ruas de terra, com meu garboso Papa Filas. Mais tarde, quando cheguei, uma gritaria. Ao invés do Papa Filas, eu trazia, puxado por um fio, um caminhão artesanal, feito a partir de latas de óleo de cozinha, habilmente formatadas, e tampas de refrigerante como rodas. É que no caminho, encontrei Cícero, filho do caseiro, que veio brincar, trazendo seu presente de natal. Olhei e fiquei fascinado. Aquele brinquedo artesanal me pareceu mais bonito, criativo, moderno, do que meu Papa Filas. A meus olhos, o caminhão de Cícero era sensacional.

Algum tempo depois, fui culpado de revelar ao meu irmão mais novo a mentira do Noel. Nossos pais nos deixaram dormindo e foram buscar os presentes para colocar ao pé da árvore. Fomos, os dois, sorrateiramente e nos escondemos atrás de móveis da sala. Meus pais arrumaram os presentes e saíram. Acabou-se um sonho. Eu gosto do Natal. Fico feliz, comovido e como cristão, sei perfeitamente separar a troca de presentes com o significado da data. Lembro do meu pai que adorava a festa, ligava aos amigos, dava presentes e a nós, apresentava um envelope contendo alguns trocados. Ele me faz muita falta. Ainda temos nossa mãe conosco, felizmente. Neste Natal, espero estar junto, novamente, com minha família e a felicidade. Feliz Natal a todos.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

AS MANHÃS ENFARRUSCADAS DE DEZEMBRO

A música é um dos principais dutos que me levam direto ao passado, a momentos felizes e importantes. Um dia desses, publiquei no facebook pequeno texto lembrando de músicas, afetos, a partir de manhãs enfarruscadas, melhor explicando, essas manhãs cinzentas, em que o ar está um pouco mais fresquinho do que o calor total em que vivemos. Essas manhãs ocorrem mais nos finais de ano, ao menos na minha memória, que vai, direto à pré adolescência, anos 60, do século passado, meu Deus, quanto tempo atrás! Eu e meus irmãos de férias, naquele momento maravilhoso de “o que ocorrer”, e se de repente nada ocorresse, tudo bem, tudo muito bem. Hoje vou jogar futebol na casa de meu saudoso amigo Abílio Cruz, ou passear de bicicleta, jogar peteca com os motoristas de taxi da Praça da República. Não. Hoje estamos todos lagarteando naquela manhã gris no amplo salão do apê em que morávamos. Quem comandava era o mais velho, que tanto e tão bem iluminou meu caminho nas mais variadas direções, principalmente na música. E ouvíamos Beatles, Bee Gees, Herman Hermits, Steppenwolf, The Hollies e Rolling Stones. Talvez fosse Rubber Soul ou Help. Claro, havia Tropicália, Mutantes, mas aqui, manhãs gris. Um tempo em que cada disco era ouvido da primeira à última faixa, degustado lentamente, até sabermos as letras, arranjos e a ordem das músicas. Hoje, um garoto faz download da discografia do King Crimson, ouve em uma tarde e já vem discutir com autoridade, algo com que convivemos uma vida inteira, principalmente com as circunstâncias. As circunstâncias, amigo. E vêm flashes de uma época feliz. Era uma manhã de sábado, meio dia, talvez, meu irmão chega e mostra “Electric Ladyland” de um tal de Jimi Hendrix. Mudou minha vida, cara. Alguns meses depois, no Rio de Janeiro, em uma loja tão antiga que tinha cabines de madeira, lindas, para audição, encontro “Smash Hits” e “Axis: Bold as Love”. São as circunstâncias, amigo. O dia em que encontrei, na Modern Sound, “Wake of Poseidon” e “Lizard”, do King Crimson e os escondi entre discos infantis, voando de volta até minha avó, a quem supliquei os trocados suficientes para compra-los. E os amigos gostaram do meu texto sobre as manhãs enfarruscadas. E de repente, não sei como, me vem à memória, em mais uma manhã cinzenta, “Connection”, dos Rolling Stones, uma canção presente em “Between the Buttons”, álbum confuso da banda, soube bem depois, mas que nós ouvíamos lagarteando naquelas férias. O piano de Brian Jones pontuando a canção. E se Brian não morresse tão cedo, para onde iriam os Stones? Ele era um Paul McCartney! E se Syd Barrett não pirasse, para onde iria o Pink Floyd? Outro Macca. Talvez essa profusão de acontecimentos culturais, revolucionando o mundo em várias áreas, me tenha apartado, um tanto, das questões políticas, que depois estudei muito para saber. Talvez. Mas era muito bom. E meu irmão que com sua inquietude, a paixão pelos Beatles, que dura até hoje e na época, para cutuca-lo, dizia que gostava mais dos Stones, meu irmão que tantos caminhos me indicou. Era um tempo muito bom, sabe? Tenho um certo orgulho de ter acompanhado tudo isso. E você? O que te leva para lugares da vida em que tudo era iluminado, aprendizado e amores inesquecíveis? Eu me lembro de “F comme Femme”, de Adamo, trilha sonora do meu primeiro amor, platônico, que nunca aconteceu. E você?


sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

NELSON MOTA, FAROL DE UMA GERAÇÃO

Nelson Mota completa 70 anos de idade com livro, programa de tv e disco reunindo suas mais famosas músicas. Eu o conheço há muito tempo, mas nunca fomos entrevistados. É um dos faróis da minha geração. A primeira vez em que apareceu foi participando daqueles Festivais da Canção, na segunda metade dos anos 60. Parceiro de Dori Caymmi em “Cantador”, clássico da mpb na voz de Elis Regina. Estava em boa companhia, junto a outros jovens compositores que formaram a nata da nossa música. É um dos autores do tema do Fantástico, que até hoje é repetido, bem como do tema de fim de ano da Globo, que sempre ouvimos nestes dias. No momento da Tropicália, tinha coluna em jornal onde escrevia sobre as novidades, traduzindo principalmente para mim, que morava e moro longe. Havia o programa do polêmico Flávio Cavalcanti e lá estava ele, jovial, sorridente, ponderado, para argumentar em favor das novidades. Se era música pop, lá estava ele na televisão, mostrando vídeos dos grupos estrangeiros. Amigo de todos, disse uma vez que seu segredo talvez fosse evitar criticar, falar mal de alguma obra. Quando não gostava, não escrevia, não dizia nada. Assim, foi levando a vida, de maneira cordial e cercado por amigos. Namorou com Elis e está por trás de uma guinada fundamental em sua carreira que estava em um caminho bem conservador. O disco foi “Em pleno verão”, aquele que tem “Vou deitar e rolar”. A discotheque invadiu o mundo, lá estava ele, bolando promoções para o verão carioca. Uma casa de shows, pista de danças, no alto do Pão de Açucar. O nome era Dancing Days. Como garçonetes, cantoras buscando uma chance e que em determinado momento subiam ao palco para fazer show. O nome era Frenéticas, tudo combinado com Caetano Veloso que havia composto “Tigresa” para Sonia Braga, dizendo “frenetic dancing days”. Isso foi para a televisão, novela, Sonia, pista de danças. E então vieram os anos 80 e ele estava como diretor da Warner, revelando Titãs, Lulu Santos, Ira, Barão Vermelho e tantos outros. Sem parar de compor, o parceiro foi Lulu e nem precisamos enumerar os hits, obtidos, também com Guilherme Arantes. Talvez tenha sido nessa década que enfim ganhou bom dinheiro, pois após embarcou para NY onde continuou produzindo artistas. E aí retorna ao Brasil, escreve em O Globo e Folha, romances de sucesso, biografias como a de Tim Maia e programa de rádio sempre mostrando os mais recentes artistas. Se estava cansado? Começa a produzir e a escrever musicais, a nova febre nas casas de espetáculo do Rio de Janeiro e SP. E completa 70 anos vendo Tim no cinema, mais musicais, biografia, especial de televisão e um disco onde enumera sucessos com nova roupagem dada por figuras como Lenine, Maria Gadu, Marisa Monte e até a nossa Gaby Amarantos a quem coube, justamente, o hino das Frenéticas. Nunca mudou o sorriso, a cordialidade e acima de tudo, a tolerância. Eu o admiro por isso. Nunca fomos apresentados. Gostaria de um dia conversar com ele. Concordo com praticamente tudo o que pensa. É um farol com luz ainda bem intensa, mostrando os novos caminhos. Tem a curiosidade com o novo que confesso, sempre tive. Foi um dos primeiros a apontar para o nosso “treme”, como algo a se ouvir. Olho para trás e percebo tudo o que me mostrou e gosto de tudo. Parabéns a Nelson Mota.