segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Para ver e ouvir

Não compreendo a razão pela qual o filme, que no Brasil se chama "Guerra ao Terror" vem recebendo tantos prêmios e indicações para o Oscar. É um apenas um bom filme. Não tem história, começo meio e fim. É como um recorte de dias vividos no Iraque por um esquadrão antibombas e principalmente, um militar que parece viciado em adrenalina. Tudo é bem árido como o cenário. Os iraquianos são apenas o inimigo e pronto. Ficamos com o ambiente entre os militares, angústias, a falta de assunto quando voltam para casa, e a espera pelo retorno, por conta do vício. Mas fica bem claro como os americanos parecem ETs com seus pesados uniformes de guerra, sua tecnologia, e seus adversários vestindo túnicas, descalços, com cara de fome. Lembro da Guerra de Canudos. Mas Oscar? Não. Ainda na área de filmes, matei a saudade assistindo "Corações Loucos", originalmente "Les Valseuses", de Bertrand Blier, em 1974, com os jovens Gerard Depardieu, Miou Miou, Patrick Dewaere, Jeanne Moreau e Isabelle Hupert. Marco Antonio Moreira não acha, mas penso que ficou datado. Jovens nos anos 70, vivendo e chocando a sociedade com um comportamento libertário, mais para o anárquico, em pequenos delitos, difíceis de acompanhar em um tempo sem internet e computadores. Na época, assisti várias vezes, apaixonado por aquela liberdade. Lembro de algo que me atingiu poéticamente, uma cidade de praia, visitada, por eles, em um dia de semana, fora da temporada. A placidez, solidão, silêncio da cidade adormecida, esquecida, enquanto os jovens se divertem. E para ouvir? No carro, Jon Anderson e Rick Wakeman, violão, voz e piano, tocam as músicas do Yes. Para iniciados, claro. O Yes foi uma das bandas da minha vida. Rock progressivo. Quando comecei a ter meus próprios discos, fui apresentado ao Black Sabbath e Uriah Heep. Em seguida, King Crimson, Emerson, Lake & Palmer e Jethro Tull. E então veio o Yes. Na época, ficava orgulhoso e curioso ao notar e gostar das trocas de compasso, do conjunto, cada um solando seu instrumento e tudo dando certo, da mistura de música erudita (fragmentos), jazz, folk. Gostava de gostar daquilo. De perceber que o baterista não estava apenas marcando o ritmo, mas tocando notas. Detestava quando críticos ingleses botavam apelidos, já querendo destruir e abrir caminho para o punk rock. Enfim. É isso. E também o último de Edu Lobo, Tantas Marés. À parte o péssimo comportamento da pessoa Edu, quando esteve em Belém, o músico é, realmente, um dos melhores do Brasil. Faz o que chamo, hoje, MCP, Música Culta Brasileira. Seus parceiros são Paulo César Pinheiro, Cacaso e Chico Buarque. Em estúdio, canta muito bem suas melodias lindas, acompanhado por um grupo de músicos como Jessé Sadoc, Mauro Senise, Jurim Moreira, Lula Galvão, Alberto Continentino, Carlos Malta e Mingo Araújo. Jovens e velhos músicos, magníficos. Um som que enche o coração de felicidade e alegria estética. Recomendo.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

O Teatro não vai ao Teatro

Fizemos três meses de temporada da peça "Abraço", no Teatro Cuíra. De especial, o encontro entre Zê Charone e o grande Cláudio Barradas, ator e diretor que faz parte da história das artes cênicas paraenses. Em janeiro, para celebrar seus 80 anos de idade, propusemos à Escola de Teatro, algumas comemorações, incluindo um final de semana no Teatro "Cláudio Barradas", de "Abraço". Na antevéspera, houve a gravação de um programa de tv da Ufpa, tendo CB como entrevistado. Sem papas na língua, Barradas aproveitou para alertar as cerca de 200 pessoas presentes, que estaria naquele palco, naquele final de semana e que aí, sim, gostaria de saber quem realmente tem predileção pelo teatro. Para mim, foi uma decepção. Provavelmente, daquelas 200 pessoas presentes, com cara de paisagem, posando de amantes de teatro, nem dez compareceram aos espetáculos. E jogue na panela, gente que posa de bacana e de intelectual da área. Pior, imaginei que o corpo de professores da Escola, deliciado, maravilhado pela presença, ali, na casa, de um dos fundadores, de uma das pedras do teatro paraense, não somente levaria todos os seus alunos, incluindo pedidos para debates, informações posteriores à apresentação, como compareceria em bloco, para homenageá-lo, presenteá-lo com flores, livros de presença, sei lá, provas de sua importância. Provas do imenso carinho em recebê-lo ali. Não. Professores, alguns poucos, em regime de conta gotas, o foram assistir na temporada do Cuíra. No Teatro da Escola, creio que somente a diretora e assim mesmo, no último dia. Alunos, não lembro. Houve ex-alunos, uns três. Tivemos público normal, isso sim, do tamanho do teatro local, hoje. Talvez possam pensar que uso Barradas para criticar a ausência das pessoas da Escola em assistir a um texto meu, dirigido por mim. Passo longe. Já fizemos três meses em nossa casa, o Cuíra. Escrevo isso porque foi tudo de uma indelicadeza brutal com alguém que merece todas as loas. Aos 80 anos, Cláudio Barradas é lúcido, inteligente, ousado, disciplinado, um grande ator, em pleno domínio de sua técnica e emoção. Merece, sim, todas as homenagens e pelo menos pelo Cuíra, posso dizer que assim prosseguirá. Já estamos começando os primeiros movimentos de "Sem dizer adeus", onde ele estará no palco, ao lado, novamente, de Zê Charone. E a Escola de Teatro? Meu Deus, os professores não vão ao teatro, não gostam, estão de saco cheio, estressados! E os alunos que também não vão, estão sem saco! Se nem eles se interessam, quem se interessará?

A Cultura como modelo da sociedade

Cresci em um mundo onde a Cultura servia de modelo para a sociedade. O que os poetas, romancistas escreviam, era seguido, admirado, discutido. Os músicos, sobretudo, a partir do final dos anos 60 e a revolução de costumes que houve. Caetano Veloso, Chico Buarque, Milton Nascimento, para citar alguns. Seguíamos suas modas, discutíamos suas opiniões. Havia um livro importante e corríamos para comprar. O filme de Fellini que vimos na Sessão das Dez, no Cinema Palácio, rendia uma semana, no mínimo, de descobertas. Não sou saudosista. Vivo meu tempo que é agora. Adoro as novidades, que gosto de consumir sofregamente, mas vivemos um momento difícil, dificílimo, na Cultura. No mundo todo, com a internet e outros meios de consumo de bens culturais, há uma super exposição. Agora, não temos mais um disco para ouvir por dois meses, decupando suas faixas, entendendo tudo. São pelo menos dez, por dia, digo, assim, para ter um número, e também livros, filmes, vídeos, notícias, milhões para engolir, sem engasgar. Coisas boas, coisas ruins. Cultura e não Cultura. Enquanto em vários países, isso contribui para a melhoria do pensamento, do tecido de civilização, da convivência, melhoria de condições de maneira geral, aqui no Brasil, é ao contrário. Nossa democracia é recente, e dela, em seus primeiros movimentos, quem se aproveita são os ladrões, espertalhões, criminosos, até que possamos expurgá-los todos e enfim, usufruir dela em uma sociedade mais justa. Para isso, somente apostando em Cultura. É exatamente o que não foi feito nos últimos vinte anos. Em uma cidade com quase dois milhões de habitantes, há muito poucas salas de cinema e estas, apresentam quase sempre o que há de mais raso em cartaz. O gerente local, cinemaníaco, culto, de vez em quando experimenta e se decepciona. Lembro, passados alguns anos, que assisti em São Paulo "Apocalypse Redux", a versão longa de Coppola e voltei entusiasmado. Em Belém, o filme resistiu por três dias em cartaz, por falta de público. Posso dizer, com orgulho, que já lotei várias vezes, e com direito a sessão extra, casas como Teatro da Paz. Hoje, somente com globais do Zorra Total. Onde estão as músicas novas que nos fazem discutir, pensar? Os livros? As peças de teatro? A Cultura deixou de ser modelo para a sociedade de hoje. Há na dominical Troppo, do Liberal, uma seção onde alguém é entrevistado sobre leitura. Eu diria que absolutamente quase todos que declaram ler algo, oferecem títulos de auto ajuda. Chega a ser lamentável. E não adianta pensar em "melhor do que nada". Melhor que nada é uma merda. O que estamos discutindo? O que conversam, nas rodas de cerveja? Antigamente, iam ao cinema, ao teatro, e depois, ao jantar, ao bar, para discutir o que foi visto. Hoje, passam direto aos bares, lotados desde cedo. Qual o pensamento de hoje? Onde estão essas gerações perdidas, sem opinião, acostumadas a "googlar" tudo e ler sinopses, ouvir e assistir highlights. Onde estão? Vamos nos arrepender brutalmente disso tudo. Sinto-me só na multidão. Recentemente, fizemos "Abraço" no Teatro Cláudio Barradas, da Escola de Teatro e Dança da Ufpa. Mas isso é assunto para uma próxima postagem.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Globeleza cada vez menos

Gosto cada vez menos de assistir ao programa da Globo em que se transformou o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Não vou aqui repetir o que todos sabem, no que diz respeito à transformação dos sambas de enredo em marchinhas batidas, ausência de passistas e que tais. É que ficou chata. Carnaval é alegria, sexo, beleza, malícia. E não sei em nome de quais costumes, a Globo retirou dessa mistura, o sexo e a malícia. A transmissão ficou até enfadonha. Mostram a bateria. Mostram os cantores. Os comentaristas gostam de tudo. Como podem gostar desses sambas horrorosos? E passam as mulheres nuas, maravilhosas. E passam essas mulheres bois, de madrinhas da bateria. E digo bois porque são halterofilistas, cada coxa, gigantesca, cheias de cores, realçando seios volumosos, onde deveriam estar, marcas de fabricantes de silicone, como patrocinadores, nas coxas as academias, as xoxotas com placas reluzentes, tudo aquilo como uma grande fanfarra para podermos devassar (sem indicações a um dos patrocinadores) o ponto G (Globo??? quaquaqua). Enfim. Gostava quando o locutor era um que gostava de namorar cortesãs globais e até anunciava quando sua namorada passava. Havia uma malícia no ar, em reapresentar em câmera lenta, os movimentos da mulher boi, embora antigamente fosse uma Luma de Oliveira, como um pássaro a nos acenar, nos chamar para dentro de si. Falta aquela passsista nua, que descobrimos de repente. Ou a nova candidata a cortesã da Globo. E de repente, termina o desfile e já vamos para uma tal Estação do Samba, muito da chata. E somente em outros canais, ou em sites, vamos conferir os escândalos da noite. As fofocas de Madonna e alhures, nos camarotes. Sem isso, não há programa que resista sem ser repetitivo. Aquela profusao de cores ainda não é perfeitamente captada, quem sabe em 3D. E carnaval é malícia, beleza, sexo, criatividade. Lá pela terceira escola, bocejo e vou conferir no dia seguinte.

A felicidade como política de Estado

As meninas do "Saia Justa" mostraram, dia desses, entrevista com ministro do Butão, confirmando que lá, a procura da Felicidade para todos os cidadãos, é política de Estado. Infelizmente não houve um aprofundamento da questão, de modo que fiquei pensando como realizar isso. É muito difícil, por exemplo, em nosso Brasil e olha que somos dos povos mais tolerantes do mundo. Mas é que nossa sociedade de consumo, trabalha, exatamente, a cultura da infelicidade. Sou infeliz porque ainda não tenho o novo modelo da Nike.. E os mais pobres assaltam os mais ricos para ter não somente seu dinheiro, mas para ter os tênis, relógios, tudo. Já pensaram se D. Costa, nosso prefeito, decidisse buscar a Felicidade dos que moram em Belém? Imagino o tamanho do trabalho em mudar o pensamento geral. Perguntem a um torcedor do Remo, o que lhe faria mais feliz e a resposta seria a derrota do Paysandu. E assim não é possível. Brinco. E a felicidade, não é o que todos buscamos? Para todos? Que tenham acesso a tudo o que a sociedade moderna pode proporcionar, a um preço justo, de tal forma que possam pagar com seus justos salários? E assim, não cresceria a sociedade de consumo, com maior consumo? Ou a sociedade trataria de encontrar outros produtos para nos fazer infelizes? Ou essa felicidade não interessa aos políticos, pois na medida em que todos tiverem acesso ao Ensino, Cultura, Saúde e outros, passam a cobrar mais e eles não se reelegeriam? E olho para os lados, neste meu centro da cidade, tão urbanizado, em comparação com os subúrbios no século 19, e penso que essa busca da felicidade está tão distante.. Vejo Lula e sua Dilma, e tudo no que a atuação política, em todos os níveis, se tornou e penso que, brasileiros, tão naturalmente alegres, somos infelizes.

Terça Gorda em Moscow

"A adversidade, a burrice, usadas como armas a favor da estética da agressividade, se impondo no mundo da sofisticação, harmonia, equilíbrio". Não sei se tirei a frase de algum artigo que li e gostei, ou se é de minha autoria. Não importa. Estou chocado. Estive em Mosqueiro na terça feira "gorda". Uma cilada, claro. Mas quando as mulheres manifestam sua vontade, é melhor atender, até mesmo porque todos os seus argumentos serão considerados mero "arrastar de correntes, puxando para trás". Escolho ficar, ao menos, ali em Porto Arthur, não somente porque minha mãe tem um apartamento ali, mas principalmente por ser uma praia menos procurada, embora imunda, com esgoto despejado a céu aberto. Cometi um erro. A fome me acenava e decidi ir até a praia, via Ariramba, logo na chegada. Bem, havia uma fila e o pastel ainda estava fritando. Não esperei. E aí, vem o grande erro. Seguir adiante, pela Beira Mar, via Murubira. É claro que não se tratou de nenhuma novidade, mas confesso, fiquei chocado. Excesso de frescura, coisa de alfenim, sei lá. O fato é que passar por aquele trecho me transformou o dia. Os carros estão estacionados na diagonal, sobre as calçadas, deixando pequena nesga onde sentam pessoas feias (desculpem, provavelmente sou mais feio que elas, mas que elas são feias, ah, isso são), bebendo sem parar, expostas ao sol. Sem nenhum excesso, de dois em dois carros, há um som ligado no volume máximo, completamente distorcido, com música brega da pior qualidade (desculpem o pleonasmo). Sem calçadas, todos andam pelas bordas da rua. Olho para seus rostos e não acredito que não percebam que não há nada a ouvir, pois o resultado é uma gororoba sonora. Não há nada a conversar, por impossível. Então, é a agressão mútua, muda, porque não há impropérios dirigidos, o que é feito através das atitudes. Agressão estética, de respeito, civilidade. A fila anda lentamente. Há ônibus lotados, vans miseráveis, outros carros com o som ligado no volume máximo. Uma moça colide com meu espelho lateral. Sorte, não quebrou. Agora está bem lento. Percebo, finalmente, que alguém, ao encontrar uma nesga, estacionou seu carro na diagonal, mas sem espaço suficiente à frente. Como resultado, bloqueou uma das pistas. E pronto. Assim, todos vamos passando aos poucos, na base do agora é a minha vez. Quando, enfim, superamos o trecho, confesso que estava chocado e de mau humor. Ainda tentamos o Paraíso, mas lá, também, embora com pouco menos agressividade, o ambiente era o mesmo. Antes, por apanhar um caminho errado (a placa avisando a direção das praias é instalada em local impróprio e está apagada), fui parar na Baía do Sol. Menos mal que almoçamos no Quintela, restaurante próximo ao Paraíso. A namorada traçou uma galinha cabidela. Eu, péssimo gourmet, pedi um improvável filé e fui agradavelmente surpreendido por uma delícia de prato. Mas puxa, superar a agressão no início da viagem, foi difícil. Como é possível viver assim? Pior, parece que estou errado e eles todos, felizes da vida, estão certos. E nessa ida sem rumo, até a Baía do Sol, flagramos esse outro mundo, onde parecemos ser minoria, em plena atividade. Mototaxis sem capacete nem para o motora, muito menos para quem transporta. Agressão por todos os lados. Terra queimada sem dó por invasores do MST. Fico pensando que até meu livro "Moscow" parece muito leve, diante disso tudo.