segunda-feira, 31 de maio de 2010
O Homem Provisório
A Mentira Convicta
quarta-feira, 26 de maio de 2010
King Crimson
Ensaios
A outra é "Sem dizer adeus", prêmio Myriam Muniz, da Funarte, baseado livremente no livro "Eu e as últimas 72 horas de Magalhães Barata", escrito por Dalila Ohana, sua companheira de últimos dias, obrigada, pelos mais estapafúrdios argumentos a se retirar de sua casa, não estando ao lado de seu companheiro que morreu chamando por seu nome. Conta com Zê Charone e Cláudio Barradas, repetindo a mesma dupla de "Abraço". Essa já começamos as leituras de mesa. Cacá Carvalho vai dar uma ajuda, graças a Deus. Temos algumas idéias. Talvez possamos estrear em agosto. Tive alguma dificuldade em chegar ao texto atual. Mas achei a saída. Os dois atores são ótimos. Estou com a cabeça tinindo. Mil idéias. As duas peças brigam pela primazia. Sensações maravilhosas. Mas, sinceramente, espero logo poder retornar aos livros que aguardam ser escritos, impacientemente.
Um detalhe: tomara que seja apenas mal entendido. Meu filho foi à Fumbel tentar agendar uma visita do elenco ao Memorial Magalhães Barata, ali em São Braz. "Não, acho que esse Museu é do Estado", disseram. Não. Falei com Raimundo Pinheiro, que me passou para Fernando Martins. Botei um ofício na Fumbel. "Escuta, esse Museu não é da alçada da Sema? Ela é quem cuida daquela praça..". Não, é um Museu, cara, deve ser Fumbel. "Eu vou me informar e te ligo de volta". Joaquim de Magalhães Barata se revira no túmulo! Como esquecemos tão rápido!!
Seminário de Dramaturgia
Nós e Dunga
A Paradinha
Mas impedir a Paradinha, não. Achar que ela humilha o goleiro, também não. E achar que o penalti é demais, também, não. Embora a instrução da Fifa, tipo "na dúvida, pró gol", o que vemos, em todo o mundo, é justamente o contrário. E futebol é gol. Paradinha, sim.
quinta-feira, 20 de maio de 2010
Os 90 anos de Edyr Proença
Obrigado, Fernando. Está lindo.
NO LEQUE DE ESTRELAS
90 ANOS DO CANTOR DA CIDADE SESTROSA
"Há muito que aqui no meu peito
Murmuram saudades azuis do teu céu
Respingos de ausência me acordam
Luando telhados que a chuva cantou."
Você conhece essa música? Já até leu no ritmo? Essa é a melhor homenagem que podemos fazer ao autor: Edyr Proença.
Da minha geração todos conhecem Edyr Proença, pelo menos “de voz”. Das gerações seguintes muitos, mas muitos mesmo, o conhecem de voz, de escritos, de músicas, de filhos.
Hoje faria 90 anos Edyr de Paiva Proença, jornalista, letrista, compositor, advogado, escritor, bancário, cronista, radialista, pai do Edgar Augusto, do Janjo, do Edyr Augusto, amigos e colegas com quem já trabalhei. Infelizmente Edyr se foi em 1998, deixando um rastro de competência, de amizades, de reconhecimento.
Sua grande marca popular foi como radialista, pioneiro na Rádio Clube do Pará, filho de Edgar Proença, um dos criadores da emissora – que é a quarta mais antiga do país. Narrador esportivo e, depois, comentarista muito respeitado. Quantos jogos o ouvi comentar, desde antes de eu imaginar, um dia, ser radialista – na mesma rádio que me acompanhava desde a infância.
Mas não é menos conhecido como compositor: autor da música de um dos maiores clássicos que canta o viver pelas ruas de Belém – “Bom dia, Belém”, (a desse trechinho aí em cima), com letra de sua cunhada Adalcinda Camarão. Esta é, provavelmente, a música paraense com maior número de gravações. E todas ótimas, porque as pessoas cantam não apenas com a voz, mas também com a alma e com o coração. Você quer ouvir? Então clique aqui, para acessar, no site do BregaPop a versão com o próprio Edyr Proença, Fafá de Belém, Leila Pinheiro, Edgar Augusto e Jane Duboc. Vê só que time fantástico? É pra quem merece!
Escrevo e ouço diversas de suas criações, em um CD produzido pela UFPA, em 1993, que leva o nome do autor, e reúne muita gente boa na interpretação, como Walter Bandeira, Nilson Chaves, Maca Maneschy, Edgar Augusto, Lucinnha Bastos, Almirzinho Gabriel. Deste CD não tenho o libreto, comprei-o já assim, degolado, mas com a beleza da composição integral, em uma Feira do Livro. Consegui informações das faixas na internet, inclusive uma capa, autografada para seu grande amigo e também compositor, Almir Morrison. Depois vou ouvir o “Clube do Camelo”, uma turma de amigos talentosos e onde ele participa em algumas faixas.
Dele registra Vicente Sales, em “Música e Músicos do Pará”, a grande enciclopédia de nossa melhor produção musical:
“Sempre gostou de dedilhar o seu violão e cantar em serestas, produzindo uma e outra canção sem compromissos formais. Escrevia versos para outros musicarem. Durante algum tempo fez parceria com o pianista Guiães de Barros. A dupla produziu: Fracassada, Adeus, Saci Pererê, Roguei, Maria Rosa, Mademoiselle Cinema, Minha Negra, João Ninguém e outras. Um dia o filho Edyr Augusto apresentou-lhe uma letra para que musicasse. Assim, nasceu “Amor Perfeito”, e a situação quase se inverteu, tornando-se EP também criador de melodias. Com Edyr Augusto produziu para o carnaval de 1976 o samba-tema “Cobra-Norato, Pesadelo Amazônico”, apresentado pelo Império de Samba Quem São Eles. Para a mesma agremiação carnavalesca, compôs músicas exaltativas, destacando-se sua parceria com J. J. Paes Loureiro em “Barca da Nostalgia”, 1974. Participou de outro concurso interno do Quem São Eles com “Largo de Nazaré, fantasia do passado”, com Edyr Augusto, carnaval de 1976, e, no ano seguinte, participou do Festival Três Canções Para Belém. Ganhou a 4ª colocação com “Bom dia, Belém”, letra de Adalcinda Camarão, gravado por Edgar Augusto no disco do Festival, por Fafá de Belém e por Leila Pinheiro. No carnaval, integrou a Ala de Compositores do Quem São Eles, com parceiros como Edyr Augusto, António Carlos Maranhão, J. J. Paes Loureiro, Lauri Garcia, Alcyr Guimarães, Alfredo Oliveira, David Miguel e Ronaldo Franco, participando ainda da criação dos sambas “Pai D'Égua”,” O Escambau do Comendador Sobral”, “Waldemar Henrique, o Canto da Amazônia” e “Preamar, cultura do Pará”. No carnaval de 1978, o grande sucesso foi a marchinha “Cala-te boca!”, que fez de parceria com Ruy Guilherme Barata. Eleny gravou “Presença”, com letra de Celeste, sua mulher; o Grupo Oficina e Lucinha Bastos gravaram “Meu Pajé”, de parceria com Ruy e Paulo André Barata”.
Fiquemos com estes versos de amor a sua terra natal, a cidade morena, que Edgar Proença cronicava, que Edyr cantava, que um dia, nas mãos dos filhos, virou nome de rádio:
“Belém que é morena sestrosaRecendendo a baunilha e jasmim,
Que às vezes se faz de dengosa
E passa fingida diante de mim.
Você que é toda a cidade,
Cidade Nova, Largo da Sé
É Santa, é Senhora, é Maria,
É Belém, que é Nazaré.”
segunda-feira, 17 de maio de 2010
Uma nova Copa do Mundo
Escrevi este artigo para a Copa de 2006. Vejam se o tema não continua atual. Por isso, mantive até as referências aos jogadores e clubes daquele momento.
Antes que você pense que sou doido ou, quem sabe, um espião, sei lá que mais, adianto que sou normal. Na Copa do Mundo, torço pelo Brasil. Até visto a camisa, grito quanto sai gol. Também não discuto com ninguém a respeito de não sermos, como está garantido por todos, penta campeões, em busca do hexa campeonato. Quem ganha duas vezes seguidas, é bi. Três vezes, é tri. E assim por diante. O Brasil é bi campeão mundial (Suécia 58 – Chile 62), embora já tenha conquistado a Copa do Mundo por cinco vezes. Você deve estar me achando, no mínimo, impertinente. Então, tudo bem. Não quero atrapalhar a comoção nacional. Mas é que de vez em quando o cérebro lembra da razão e adverte. Não estrague sua festa, mas guarde a informação para si. É bom.
Estávamos reunidos, aguardando a hora de começar uma pelada. Na televisão, um jogo da Taça dos Campeões, ou algo assim, na Europa. Em campo, mais de dez jogadores brasileiros, vestindo camisas de Milan e Lyon. Foi ali, com os olhos grudados na tela, que comecei a dizer algumas coisas. Aos poucos, meus amigos foram virando as cadeiras, deixando de lado os lances de Kaká e participando da discussão.
A Copa do Mundo, que teve no francês Jules Rimet um de seus maiores patrocinadores, foi criada inicialmente para ser uma festa de congraçamento entre esportistas europeus, chiquérrimos. Mais tarde, o Uruguai, com influência britânica, resolveu sediar. Poucos vieram à América do Sul. Guerra, pós Guerra, essas coisas. O Brasil, vizinho, foi. Imagino que após os jogos havia banquetes, bailes, tudo muito romântico e bonito. O mundo foi mudando. O futebol, também. Atletas substituíram dandys. Homens de negócio substituíram Rimets. Já em 1970, quando o Brasil venceu a Copa do México, o futebol já era um grande negócio no mundo. A tv mexicana ganhou dinheiro. Mais ainda com a transmissão dos jogos. Jogadores foram valorizados. Mas uma Copa do Mundo ainda era, essencialmente, um encontro de nacionalidades. Encontro de escolas de futebol. Havia os russos, com suas táticas cerebrais. Os alemães e seu jogo sério. Ingleses e sua fleugma. Brasileiros com sua alegria. Um grande encontro. Antes da Copa, os jogadores deixavam seus clubes e passavam de um a dois meses treinando. Vestir a camisa nacional era um orgulho. Um brasileiro entrar em campo e enfrentar um russo. Se olhavam com até curiosidade. Para nós, ganhar a Copa significava um desagravo às distancias para o Primeiro Mundo. Mostrava que em alguma coisa, éramos superiores. O mundo nos admirava. No futebol, estávamos em primeiro lugar. Saíamos da cozinha para a sala da frente.
Hoje mudou. A globalização veio e transformou tudo. Futebol é um dos maiores negócios do planeta. Transmissões por satélite colocam em nossas casas, aos domingos, por exemplo, jogos desde as dez da manhã, da Itália, Inglaterra, Alemanha, França e Espanha. Vende-se tudo. Até a bola. Camisas, calções, chuteiras, meias. O uniforme do juiz. Por causa de nossa fragilidade econômica, Europa, África e Ásia vieram e levaram nossos melhores jogadores. Levaram e continuam levando crianças que se destacam em brincadeiras de rua. Inglaterra, Itália, Alemanha, França e Espanha formam no primeiro pelotão de países que levaram nossas estrelas. Rússia e Japão também chegam próximos. Como resistir? É muito dinheiro, a maior parte direto para o bolso dos dirigentes que enriquecem pessoalmente e empobrecem os clubes que dizem amar. Quanta mentira.
Então ligamos a tv para assistir Real Madri e Barcelona se enfrentando. No Real, Cicinho, Roberto Carlos, Julio Batista, Robinho e Ronaldo. Todos da seleção brasileira. No Barça, Beletti, Edmilson, Silvinho, Thiago, Ronaldinho e até Deco, brasileiro revelado no futebol português. Estão todos na Europa. Aqui, apenas veteranos, alguns que foram e voltaram, jovens loucos para ir e os ruins, que ninguém quer.
Mas estávamos falando de Copa do Mundo, certo? Seguindo o espírito do grande encontro das diferentes escolas, não há como chegar a lugar algum. O futebol europeu, com algumas pequenas características, está automatizado. As raras diferenças ficam por conta de algumas jogadas aéreas na Inglaterra, brutalidade na Alemanha, defensivismo na Itália e arte na Espanha e França. No mais, um jogador que se transferir da Espanha para a Itália, sentirá pouca diferença, sobretudo nos esquemas táticos. E chega no momento da Copa, essa legião estrangeira, formada por muitos brasileiros e outras nacionalidades, retorna a seus países com pouco mais de duas semanas para treinar e constituir sua seleção. O calendário não deixa mais tempo. Os clubes é que mandam, com justa razão. A Copa é uma festa da Fifa, não dos clubes. Esqueça o patriotismo de que é revestida nossa torcida, insuflada por uma onda monumental de propaganda. É um grande negócio. Bilhões. Ganham em tudo. Estamos chegando próximos do ponto a que desejo chegar. Em campo, ao invés de patriotas com a camisa nacional, temos atletas calejados, experientes e, sobretudo, milionários, ganhando mais uma fortuna para entrar em campo. Se forem campeões, muito mais. Por isso, considero hipocrisia cantar o hino nacional antes dos jogos. É uma representação, creio, dos tempos medievais, quando antes das batalhas se cantavam hinos para encher o peito de orgulho e morrer feliz. Pode ser que nas primeiras Copas e demais competições, em outro tempo, fosse parte da cordialidade, do grande encontro ao qual me referi. Hoje, é hipocrisia. E na maior parte dos jogos, de cada lado, atletas que durante todo o ano se encontram em jogos de suas equipes, seja em campeonatos locais ou nas taças européias.
E vem a pergunta: Se a Copa deixou de ser o grande encontro. Deixou de ser a reunião de escolas diferentes. Se para assistir nossos principais jogadores, tomando por exemplo o Brasil, temos que ter tv a cabo e torcer para Real Madri, Milan, Arsenal, Lyon e outros. Se a Copa do Mundo é uma competição do futebol que se joga nos países, porque não são seleções formadas pelos melhores atletas que jogam naquele país, deixando de lado a questão da nacionalidade? Não me bata, não me xingue, gosto do Brasil, torço na Copa e quero ser hexa!!! Mas pense bem. Sem hipocrisia, é a verdade. E se tivéssemos de ir para a Alemanha com uma seleção dos atletas que estão aqui, creio que Tevez seria nossa estrela.. E daí? Argentinos teriam um ataque, quem sabe. A seleção inglesa teria uma mistura de africanos, alguns franceses e até brasileiro, bem como alguns britânicos. A mesma coisa na França. Agora, o jogo entre Itália e Espanha, seria bem legal de assistir. Só brasileiros em campo. Desculpem, somos os melhores. Mas seria sem hipocrisia. Se correríamos o grave risco de não ser mais hexa? Claro. E daí? Nós nunca seremos hexa, de verdade, não é? Podemos conquistar a Copa do Mundo pela sexta vez, isso já sabemos. Mas assim, em campo, teríamos a verdadeira representação do futebol que é jogado nos países, ainda que as seleções européias fossem influenciadas pelos brasileiros, por exemplo. Ainda que nossa seleção tivesse jogadores considerados inferiores aos brasileiros atuando por Itália e Espanha, por exemplo. Pois é.
Após as primeiras manifestações de revolta, daqueles que falam primeiro e pensam depois, a discussão com meus colegas foi ficando mais inteligente. Não tivemos tempo de terminar. Na tv, o jogo acabou e nossa pelada ia começar. E você, o que acha?
A Nova Ordem
Não diria que é tudo culpa nossa, mas estamos envolvidos, sem dúvida, nessa “Bomba Z”, que era citada em um dos últimos discos do cearense Ednardo. No mínimo porque votamos, muitas vezes movidos por raivinhas, contra nós próprios, apenas para não permitir que aquele outro vencesse. E é absolutamente paraense o “morremos abraçados, mas se não for eu, nenhum de nós vencerá”. Temos um país com enormes condições de se tornar uma potência do futuro, mas em função de toda essa incompetência e maldade, nosso povo, nossa juventude, nossas instituições, nossa infra estrutura, nosso caráter, representado em Brasília, é uma vergonha. Quando focamos o Pará, Belém, por exemplo, tudo fica ainda pior. Batemos tanto no peito dizendo-nos patriotas, ufanistas mas é mentira. Sabemos que somos maus mas preferimos dizer que é implicância do Sul. E confundimos hospitalidade com complexo de vira lata, ao recebermos as visitas com tantos mimos, suplicando para que digam as palavras mágicas: como aqui é lindo! Como a vossa comida é gostosa! E por aí, vai. Chegamos a incomodar visitantes com excesso de mesuras. E como sabe, quem se abaixa muito, deixa o .. à mostra. Sem Educação e Cultura, afundamos no poço da ignorância. Quero chegar aí. Quero defender a idéia de um “recuo para a floresta”. Um recuo na civilização. Uma reinvenção da civilização, que mistura o retorno aos procedimentos mais antigos, à adaptação a qualquer custo, das últimas tecnologias que por aqui chegam. Um caboclo, em uma loja de informática, lendo as instruções, com maioria de palavras em inglês técnico. Nós, da classe média, não temos idéia da grande Belém que se expandiu descontroladamente, junto ao descaso absoluto das autoridades. Nós da classe média, somos diariamente atacados, caçados, ameaçados, não somente por ladrões, lado terrível da falta de emprego, esperança e violência, mas sobretudo por essa Nova Ordem que cresce à nossa volta, a despeito de nós, que temos TV a cabo, computadores, viajamos e vivemos algo bem próximo da civilização que se verifica em cidades de pleno desenvolvimento.
Autoridade
Vivemos um momento em que as autoridades desapareceram. Transformaram-se em mundo à parte, onde grandes roubos são operados. Onde está o prefeito? Onde estão os vereadores? Tenho uma amiga que mora em invasão de Icoaraci. Autoridade, lá, é o traficante da área. Para entrar ali, precisa ser amiga, moradora. E quando há alguém doente, deixa entrar o taxi para levar ao PSM. O chefe indígena local. De volta à floresta.
Educação
Professores que não sabem sequer falar. Ouvi a história de uma menina, que decorava o texto para o teste de leitura. Tecnicamente, não sabe ler. E se conseguir, não conseguirá explicar o que leu. A Nova Ordem tem um dialeto próprio, completamente diferente do português. Como uma língua indígena, na floresta. Não é somente o "pra mim ir", "pra ti fazer". Há outras expressões que não entendemos.
Transformação
É uma civilização de transformação. Aquilo que ontem era uma placa de propaganda do cartão Mastercard, com uma mulher linda, sorrindo, hoje é o telhado do barraco lá da invasão. Calçadas, ruas, saneamento, iluminação pública, não há nada. Uma espécie de floresta toma conta, sem arruamento, qualquer organização. Cada um vira a casa para onde bem entende. Estamos na floresta. Não há leis, organização, nada.
Cultura
E o que é a Cultura? A TV ligada o dia inteiro, não na Rede Globo, como o Ibope colhido em São Paulo quer dizer. Está ligado ou no SBT ou Record, este, por força de religião. Uma questão, sobretudo de estética, criando mocinhas que se vestem como prostitutas, desde cedo. Cultura de programas de auditório, onde o que interessa é levar vantagem. O rádio também, ligado em programas policiais, berrando a todo instante que pegaram, por exemplo, o vizinho em flagrante, enquanto os outros ouvem, deliciados, antes ele do que nós.. E a música, hoje o tecnobrega, cada vez pior, pois os jovens dominam os programas de computador, sem saber sequer como funcionam e ali vão compondo pequenas quadras, de linguagem lasciva, a voz da cantora em rotação alta, tudo agudo, tudo beliscando, mordendo, colorido, gritando sua pobreza, imoralidade, sua falta de tudo. Já não importa mais saber cantar, tocar, compor melodia, escrever versos. São quadrinhas lascivas, cantadas aos berros, como a propagar a violência verbal, agredir a ordem, a simetria do nosso mundo. Sou cretino e tenho orgulho!
Saúde
É uma agressão inadmissível passar em Postos de Saúde e encontrar pessoas tristes, doentes, esfomeadas, aguardando para serem tratadas com violência, grosseria, ou nem serem atendidas. São humilhações diárias, como as que sofrem aguardando em paradas ou dentro de ônibus, feito sardinha, apertadas.
Saneamento
Que cidade é essa com tantos e maravilhosos espigões, adquiridos ainda na planta, e ao mesmo tempo, sabemos, pouco mais de 10% da urbe conta com serviço de esgoto? Desamor total. Moram em castelos mas ao botar o pé na rua, pisam na lama, ou passam direto para seus carrões monumentais. A cidade que se foda.
Transporte
A Nova Ordem, nos leva de volta à floresta. Lá não há ruas, mão e contramão, estacionamento, fila dupla, acostamento, nenhuma lei a não ser a do mais forte e mais esperto. Os mais pobres compram bicicletas. Andam na contramão em avenidas de alta velocidade, levando crianças à garupa e um ar zen. Alguns, mais aborrecidos, querem agredir se algum carro lhes atrapalha a passagem. Pior são as motocicletas. É a volta à floresta, mas com cavalos, no melhor estilo bang bang. As motocicletas não obedecem nenhuma lei. Nas invasões, atravessam quintais, calçadas, fazem o que bem entendem. Não usam capacete, nenhuma proteção. Há uma certa zombaria em relação às leis. Questão de postura. São os centauros. O capacete é utilizado apenas quando são enviados da morte. Chegam na frente de qualquer um e atiram. Morrem às dúzias, todos os dias. E as vans? É preciso destruir o sistema de transportes. Ônibus que têm linhas definidas, paradas definidas. As vans derrubam todo o conceito. É a Nova Ordem que visa desorganizar tudo e fazer valer a vontade de quem quer fazer, onde quiser fazer. E por isso, mijam em qualquer lugar. Como na floresta. Atrás de uma árvore ou arbusto. Os homens tiram o bilau e mijam.
Ruas
Que ruas? Onde haviam, estão tomadas de camelôs. Que se lixem aqueles que pagam impostos, empregados, água, luz, telefone, sei lá que mais, para ter seu negócio. Os camelôs querem, justamente, o melhor pedaço. Na aglomeração, fecham a rua. E fica como um bosque, ou floresta fechada, onde caminhamos lentamente, desviando de árvores/camelôs, oferecendo de um tudo. Ônibus? Ocupam todas as paradas. Pior, retirados, são as próprias pessoas a recusar permanecer na calçada, aguardando, preferindo invadir a rua. Queixem-se ao Bispo. É preciso desorganizar para a Nova Ordem imperar.
Comércio
Filmes, CDs, tudo é pirata. Tudo tem outro tipo de procedimento, artesanal, sem impostos, controle, nada. Tudo tem utilidade efêmera. E tudo fica abafado, como é sob as árvores da floresta amazônica. O progresso é lento, sendo abalroado por todos os lados com ofertas. Um dia desses, fui à Ótica Pará, quase na confluência da Santo Antonio com Presidente Vargas. Deve ser um exercício e tanto manter uma loja dentro de um padrão razoável, com mercadorias de qualidade, preço alto, cercado por camelôs de todos os tipos, gritando, manchando, maltratando, agredindo o comerciante, com a Nova Ordem.
Tecnologia
É algo muito interessante pois, absolutamente alheios ao domínio da Língua Inglesa, mas através da experimentação, acabam criando outras maneiras de utilização, o que se verifica na música, nos vídeos pornôs que as crianças fazem no colégio e nos celulares. Assim, esses aparelhos, transformados em seu uso, também se tornam parte da Nova Ordem.
Os culpados somos nós, que muitas vezes sabemos o que está em jogo, nas eleições, mas por conta de ódios, raivinhas, brigas paroquiais, invejinhas, morremos abraçados, mas não permitimos que nada funcione. É assim neste instante. E aí nos queixamos de viver ameaçados, trancados, atrás de grades, instalando câmeras, ao invés de lutar pelo melhor. Para todos. Agora vão nos dividir. Nosso Pará ficará ainda menor. Mais pobre. A Nova Ordem vai mandar. Seremos minoria. Eu duvido que façamos alguma coisa. Morreremos abraçados.