sexta-feira, 19 de outubro de 2018

OS ÉGUAS E A FLIPA

Relancei há dias, na Livraria da Fox, onde está à venda, meu primeiro romance, “Os Éguas”, lançado em 1998 pela Boitempo Editorial, casa por onde lancei todos os meus outros livros. É difícil aceitar a passagem do tempo. Cada obra que escrevemos é um filho que nasce. Quando me perguntam qual considero meu melhor, prefiro dizer o próximo. Meu pai teve cinco filhos e dizia que gostava de cada um de maneira diferente, conforme seu gênio. O amor era o mesmo. Nunca pensei seriamente em escrever um romance. Talvez isso passeasse na minha cabeça, quando já tinha o vício de ler tantos livros. O mano Edgar, que era diretor da Rádio Cultura, me disse que talvez voltassem com as radio novelas. Me interessaria pensar em algum argumento? Disse-lhe que, sonoramente, vivíamos momento de muitos sons eletrônicos. Era a época da secretaria eletrônica. Que tal começar ouvindo os recados enviados para alguém que a Polícia descobriu, estava morto? A rádio novela não saiu. Pecado. Mas fui desenrolando um fio de personagens, das mais diversas classes sociais, de um cabeleireiro a um jogador de futebol, passando por um delegado jovem e alcoólatra, cada um deles procurando uma coisa e encontrando outra. Adorei. Vibrei. Descobri-me um observador do mundo, das pessoas, das vidas e amores e desgraças e ambições e traições, enfim. Vida. Meus colegas jornalistas, em Belém, como de hábito, me deram boas vindas nos jornais, rádio e televisão. Mas em termos de Brasil, tive umas três linhas no há muito extinto Jornal da Tarde, em São Paulo. Mas não é que, já nos anos 2000, uma nova editora francesa, Asphalte Editions, comprou os direitos de publicação, traduziu e lançou na França? “Os Éguas”, não deu para traduzir. Ficou “Belém”. Uma manhã, recebo um telefonema. A Universidade Jean Moulin, de Lyon, escolhe a cada ano, um país e quatro livros escritos e traduzidos para o francês e os estuda por três meses, professores e alunos. Ao final, premiam o que consideram o melhor, com o troféu Prix Caméléon. “Os Éguas – Belém”, ganhara o prêmio. Não digo dos concorrentes por ética, mas ao contrário de mim, são nomes nacionais da Literatura Brasileira. Bem, tenho seis romances nacionais, na Boitempo. Escrevo, neste momento, mais um. Na Inglaterra, um livro traduzido. Na França, quatro. Mas foi a partir de “Os Éguas” que a imprensa do Sudeste passou a me reconhecer. Ano passado, “Pssica” esteve entre os dez melhores romances lançados na França. Em 2015, “Pssica” foi finalista da Associação Paulista de Críticos de Arte e Prêmio Oceanos. Que tal ler “Os Éguas”? Mudou a capa. Ivana Jinkings, da Boitempo, a quem devo tudo, vai relançar os outros, também mudando a capa.
Estarei com “Os Éguas” e também todos os outros escritores paraenses, neste sábado e domingo em mais uma Flipa. Começou com Salomão Laredo protestando contra a farsa que é a Feira Pan Amazônica do Livro, da Secretaria de Cultura. Ele fez, na Fox, a Feira do Salomão. Deu no que deu. Ano passado, em dois dias, vendemos mil livros de autores locais. Mil livros. A Fox patrocina. A Empíreo, corajosamente, também. João de Jesus Paes Loureiro, este ano, é o patrono. Gênio paraense, professor e poeta singular, com voz moderna e ao mesmo tempo, amazônida, é uma das unanimidades do Pará e do Brasil, com forte presença no exterior. Haverá palestras, conversas, a presença de escritores em congraçamento entre si e, principalmente, com os leitores que forem à Livraria da Fox, neste sábado e domingo. Estão todos convidados.


sexta-feira, 12 de outubro de 2018

A TRÉGUA DE NAZICA

Não está fácil. As mídias sociais desmoralizaram a propaganda no rádio e tv. O candidato com 9 segundos abriu em primeiro e parte para o segundo turno com vantagem. Nas mídias, todos usando como escudo seu computador e a internet, chovem fake news. Lembro de Remo e Paysandu. Não importa com quem joguem, mesmo que em séries diferentes. Estão sempre jogando, um contra o outro. Aqui em Belém, sabemos que o Remo levou gol de qualquer time, por conta de foguetes de comemoração da torcida alviazul. E vice versa. Torcemos pela derrota do outro e esquecemos da vitória do nosso. Assim não é possível. Cada um vem com um pecado mortal de um ou de outro adversário político. E tome discussão. Gente, a Santa vem aí. Vamos respeitar. Como é que vai ser esse almoço? Cada turma em um quarto, para evitar brigas partidárias? Fascistas não se misturam com ladrões? Olha a Santa, já valei. Abramos uma trégua, até pelo menos a segunda feira. A maniçoba está cheirando. O pato. Poxa, tranca essa boca aí, menina! Cara, para de falar besteira. “Chá de Cadeira”, a revista do Comendador Sobral, já está sendo distribuída, com vários colegas escrevendo sobre o manto da Nazica. Bem, gosto de chamar Nazica, já aviso para haters. Chamo com respeito. Com amor. Depois, Maria sempre foi do povão, né? Acho até que se incomoda com toda essa riqueza da berlinda e do manto. Nazica é um ícone pop. A Diretoria da Festa precisa perceber os jovens paraenses e acenar em direção a algo mais palatável do que velhos livrinhos que a acompanham nas peregrinações. Eu nunca perdi um Círio. Depois da partida de meu pai, este será o primeiro sem estar abraçado à minha mãe querida. Vai ser difícil. Mas sim, o manto. Quando for até Icoaraci, na manhã de hoje, sexta, o manto devia ser algo bem leve e fresco. É um sol desgraçado que ela enfrenta, sem direito a paradas estratégicas para retocar a maquiagem, passar um algodão úmido no rosto, tomar um red bull, sei lá. Ainda ligam uma luz na berlinda. Insuportável. Quem sabe um manto combinando com a decoração, sempre linda, do Paulo Morelli e equipe? Mas olha, quando vem no Círio Fluvial, vamos combinar, uma Nazica marinheira, belíssima, no vento, certamente com um manto jovial, bem verão, deixando-a a mais bela. Ih, será que os vidros da berlinda deviam ter aquele protetor solar? Porque a Nazica não deixa de passar, para manter aquela pele tão linda. Não, óculos escuros, tipo Ray Ban, não combinam, certamente. E já se troca porque desce do barco e sai pela Presidente Vargas em um Círio de motocicletas. O manto cheio de taxas, alguma coisa que comente aquilo e a devoção que a cerca, bem Easy Rider, não? A Trasladação, concordo, uma soirée, algo bem bonito, elegante, bem sacre nuit, para receber as homenagens. Felizmente, o Cirio começa mais tarde, às sete. É preciso compreender. Nazica está desde sexta impávida, recebendo homenagens, logo ela que é tão simples, de gostar de ficar conversando na cozinha, com as pessoas das casas, nem gosta de ir para a sala grande, se amostrar. Precisa descansar. Sim, desde sexta, o manto cobre, naturalmente, Nazica usa tênis. Não digo a marca porque vocês sabem como a concorrência entre as fábricas é grande. E nas folgas, manda buscar seu chinelinho porque ninguém é de ferro. O passeio anual, glorioso, é perfeito. Quando surge, o sol da manhã, a energia trocada, tudo aquilo como que me dá um choque emocional. Fico em silêncio. O pensamento canta loas à Rainha. Peço por meus pais, filhos, minha Zê, pelos queridos. Nossa Senhora de Nazaré, olha por nós! E na segunda, a trégua acaba.

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

A CABANAGEM, SEMPRE A CABCANAGEM

Decidi escrever um texto teatral sobre a Cabanagem, após assistir Cacá Carvalho em cena, no Teatro da Paz, dirigido por Antunes Filho. Também porque li sobre a comemoração dos 150 anos da revolta. Como quase todos os paraenses, não sabia quase nada do assunto. O Professor Clovis Moraes Rego me ajudou com livros de Jorge Hurley, Domingos Rayol e comentários. Rui Barata me ajudou também a compreender os lados e motivações. “Angelim” foi um grande sucesso, ficando em cartaz por três meses, no Teatro da Paz. Bons tempos, hein? Na noite de estreia, após o espetáculo, nos bastidores, Pasquale di Paolo veio me cumprimentar e ofertar o texto, fac símile, de seu livro que é outra fonte de informações. O assunto me interessa. Salomão Laredo me listou vários outros trabalhos de autores famosos. Há poucos anos, saiu “A Miserável Revolução das Classes Infames”, de Décio Freitas, pela Record, dando conta da passagem de um francês, que havia sido enviado preso para Caiena, por envolvimento na Revolução Francesa, e que tendo fugido, assistiu ao movimento paraense. Lucio Flavio Pinto me emprestou “A Vida Singular de Angelim”, de Dilke de Barbosa Rodrigues, bisneta do revolucionário, Edição Pongetti. Pensei que teria mais informações sobre Angelim e sua esposa, Luiza Clara. Minha intenção era escrever mais uma vez para teatro, sobre a vida do casal. Há poucas menções, mas uma insistência em negar o boato que o cabano havia mandado matar o marido de Luiza, para depois desposa-la. Luiza já era viúva uma vez e havia casado novamente. Dilke conta que Angelim ia passando e uma turba estava linchando o português. Espantou os espancadores mas o português faleceu, não sem antes pedir a Eduardo que levasse pertences e notícias à sua esposa. Quase no final, uma revelação surpreendente, na existência de um certo João Francisco de Madureira Pará, nascido no Acará em 1797, inventor da primeira máquina de escrever, com tipos de madeira. Foi a Portugal pedir ajuda ao Rei Dom João VI, para aperfeiçoar o invento. Este, o enviou à Câmara, que arquivou o pedido. João foi à Junta Comercial de Lisboa, agora tentando ajuda para patentear um invento que movia os navios sem auxílio de gás ou vapor, usando gás comprimido. A Junta aprovou, mas somente para uso em Portugal. Patriota, João recusou tirar do Brasil o invento. Os ingleses oferecem 400.000 libras que ele também recusou. Voltou para o Pará onde inventou máquina para serrar madeira, engenho para moer cana e máquina para descascar arroz. Escreveu livros. Morreu envenenado ao ir a Angola receber uma herança da esposa. Será verdade? Que vida! Para terminar, recebi de Carlos Galvão, psiquiatra paraense radicado em São Paulo, o livro “A Terra de Tupã”, editado pela Rumo Editorial, dentro da coleção Letra de Médico, com belo romance sobre a Cabanagem, mexendo em alguns fatos para direcionar sua ficção. Temos um português, menino, filho de mãe rica e um inglês aventureiro que multiplicou a fortuna. Com a invasão de Napoleão, perdem quase tudo e vão para a Inglaterra, onde recuperam terras, o garoto, agora, órfão de pai. Aprende a navegar. Vem parar em Caiena e depois em Belém, Santarém (terra do autor), estando sempre ao lado do cônego Batista Campos, amigo de Angelim e apresentando de maneira bem palatável, as ruas da cidade e seus habitantes. A Cabanagem por outros olhos. Passa o resto da vida entre a Inglaterra e o Brasil, casando em Belém com uma mulher especial, uma curandeira, que o protege, assim como Tupã. Pra falar a verdade, não gosto do título do livro, que foge à sua história principal e ao pano de fundo, a Cabanagem. Como leitura, muito bom! Será que ainda haverá leitores para esse acontecimento?