quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

férias

Desculpem a ausência. Passei sete dias entre Sp e RJ, divididos entre algum trabalho para a Editora de meus livros e férias. Encontrei Rita Ferradaes, que agora produz teatro em Sp, feliz da vida. Encontrei Cacá Carvalho e conheci seu lugar de ensaios, da Casa Laboratório de Pontedera. Assisti a uma performance de uma mulher de Cingapura, Kei Pang, talvez, o nome, belíssimo. Depois, comemos no Rubayat. No RJ, estivemos com Ronaldo Fayal, feliz da vida, contratado da Globo, fazendo visagismo da novela Três Irmãs. Jantamos com Kika Rovai e Eunice Baía, a Tainá. Assistimos, por especial deferência de Noêmia, a peça Gloriosa, com Marília Pêra, o maior sucesso de lá, no momento, estreando, também, o Teatro do Fashion Mall, em São Conrado. O texto não é grande coisa, mas assistir Madame Pêra é assistir a um recital. Como é bom estar ali, vendo todo aquele repertório de gestos, postura, voz, encanto, personagem. Agora, na volta, dá uma ressaca, e leva uns dias para voltar a postar. Mesmo assim, diariamente, visito meu blog na esperança de novas visitas. Gostaria que fossem muitas, mas a gente chega lá. Escreverei sobre o Fórum, claro, mas permitam-me mais algum tempo...

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Vista Cansada

Após escrever sobre a telosfera e a intermediação hoje feita pelas telas, em todos os lugares, lembrei de sua miniaturização e consequente aumento de pixels para possibilitar sua leitura. Tudo isso acontece, esquecendo o que me pareceu, à primeira vista, um descompasso da ciência. A velhice. A porra da velhice. Ou, como meu avô Edgar dizia, "seu colega, a velhice é uma merda". Com a idade chegando, o músculo que movimenta a engrenagem que nos faz enxergar e ler, em todas as distâncias onde podemos humanamente alcançar, vai cansando. A tal síndrome do braço que vai esticando. Usamos óculos. Não é problema para os mais jovens, mas certamente para nós, de meia idade. Hoje sabe-se que crianças têm capacidade muito maior que a nossa geração em apreender, velozmente, em qualquer tela, todas as possibilidades. Assim essa habilidade nos games. Pois a oftalmologia avança tanto e não deixamos de usar óculos. Há lentes de contato, mas experimente deixar de usar um dia e seu músculo, preguiçoso, já não o fará enxergar nada. Pois é, meu filho assistiu, um dia desses, no Discovery Channel, pesquisas sendo feitas com o cérebro. Não enxergamos com os olhos e sim com o cérebro. Os olhos, como disse o filho, são como um câmera que envia mensagens para o cérebro, que as decodifica. Assim, os pesquisadores já começam a saber, ou descobrir, que enxergamos muito mais do que aquilo que os olhos simplesmente dizem ver. O que será? Muito mais. Pensam em colocar nas lentes de contato, opções para assistir filmes, computador, sei lá. Complicado, mas interessante. O que realmente vemos? Isso explica muita coisa, ao mesmo tempo em que abre uma janela infinita. Enxergamos com o cérebro. Ainda pesquisam. Por enquanto vou com minha vista cansada.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

O consumismo é a cleptomania legalizada

Bela frase que li em um artigo de jornal. Sou consumista. Me esbaldo comprando livros e cds. Roupas, também. Não é pecado. O excesso, pode ser doença, claro. Fazer disso uma razão de vida, também. Mas vivemos hoje um ambiente de consumo. Olhe para os lados e há sempre uma oferta, sugerindo uma vida melhor, ou mais condizente com a imagem que você projeta para si. Será que meu prazer se esgota no simples ato de comprar, tirar algo da vitrine, ou da tela da internet, tomar posse daquilo que ali brilhava e agora é meu? Também sou consumidor de impulso. Gosto e nem quero muita conversa. Vou logo pagar. Tem a ver com a minha ansiedade que talvez seja aplacada desta maneira. Mas vejam que hoje, compramos em lojas cada vez mais exclusivas, para não passar pelo "desconforto" de cruzar com alguma pessoa usando a mesma peça. E, no entanto, até mesmo antes da crise, as lojas de luxo já vinham se popularizando. Compramos e agregamos a nós o conceito, o prestígio e exclusividade daquela marca. Filas em Paris para comprar uma bolsa Hermés, no valor de mais de 5 mil reais. Vem a piada dizendo que todas as bolsas do mundo caíram, menos as Hermés e Vuitton. Queremos consumir. Inclusive pessoas, como podemos devorar, agora, esses infelizes do BBB. Queremos tirar o pedaço, olhar o fundilho do fundilho das calcinhas das atrizes, que normalmente já vão sem a calcinha, e nós, talvez, buscando seu âmago, através de suas xoxotas, um olhar ginecológico. Observem que nas fotos, agora, mesmo vestidas de calça comprida, elas estão de pernas abertas, bem abertas, como um convite entre, me conheça por dentro, consuma-me. E as mulheres e as coisas são sempre as mesmas. Um mundo homogêneo. As grandes cadeias de lojas, fast foods, tornando o mundo igual. Desde o aeroporto, avião, táxi, hotel, lojas, tudo igual. Então, para quê viajar? Não é melhor gravar em DVD e assistir em casa? Se há tudo à disposição nas lojas? As mesma lojas, mesma decoração. Entre em uma lanchonete Subway na Brás de Aguiar, ou na Oxfort Street. A mesma coisa. O que falta na globalização é nivelar os povos, pois é uma proposta americana não de globalização, mas de conquista do mundo, onde apenas um lado é contemplado, aquele que paga por produtos americanos. Quando queremos fazer o mesmo, somos impedidos por milhares de leis e decisões. Assim, não há troca. Há diferenças cada vez abismais e tudo o que queremos é que todos tenham direito a tudo o que o mundo moderno oferece. E saímos por aí vestindo marcas que nos agregam valor, dirigindo aquele carro do comercial, enfim, consumindo, predando, tirando da vitrine, da tela. A cleptomania legalizada.

Ler?

Também na Folha de São Paulo, Plínio Fraga escreveu artigo com o título "Não alimente os escritores". Ele estava espantado com os resultados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada em maio do ano passado pelo Instituto Pró Livro. Nela, para começar, 77 milhões de pessoas dizem não gostar de ler. De saída, já somos liquidados. Nós, escritores. Mais ainda, 17% lêem devagar, 11% não têm paciência de ler, 7% não têm concentração e outros 7% não compreendem o que lêem. É o fim do mundo. Arilene, a menina que foi Catiti no segundo filme da índiazinha Tainá, vem algumas vezes por ano, de Abaetetuba, onde mora, para passar uns dias com Zê Charone. Assim, temos alguma convivência. Arilene vai repetir ano. Mesmo passando a manhã em aula, no melhor colégio do lugar, pago pela produção do filme e à tarde, continuando no colégio, voltando para casa somente à noite. Foi visitando sua casa que percebi as disparidades no Brasil em termos de audiência televisiva, influência cultural e estética. A audiência televisiva, no Brasil, é medida em São Paulo, por vários motivos, entre os quais, poderio financeiro, extrato de classes, gente egressa de vários Estados e pulverização de cidades. Mas o Brasil é esse gigante, que não pode ser medido apenas por São Paulo. Diferenças gigantescas. Em Abaetetuba e, imagino, todas as outras cidades, quem tem audiência é SBT e quem sabe, Record. Arilene, quando foi divulgar o filme no programa do Faustão, nunca havia visto mais gordo (certamente) o apresentador. Mas as piadas do Sílvio, as músicas da Calypso, sabe todas. Aqui, tomando contato com a Favorita, em seus últimos capítulos, danou-se a chamar uma das personagens de Tela, ou mais respeitosamente, Dona Tela, como poderia ser Dona Zê, Dona Maria, sacam? Há um imenso mundo de conhecimento que passa ao largo e porisso, a reinvenção desse mundo, leia em A Nova Civilização. Onde quero chegar? Uma coluna de jornal paraense entrevista figuras da sociedade a quem faz várias perguntas, uma delas, o que você está lendo. Impressionante como o resultado é sempre livros de auto ajuda. Aqui e ali, um best seller. O que ler?

Se esta rua fosse minha

Sempre morei no Edifício Renascença. É o terceiro ou quarto prédio da cidade. Hoje bem decadente, é verdade. Atrás fica a Travessa Primeiro de Março, desde o IEP, até o Boulevard, sempre estreita, acompanhando o traçado da Presidente Vargas. Quando me entendi como gente, o melhor da zona do meretrício já havia passado. Mas ainda vi desfiles dos Boêmios da Campina e suas figuras de chapeu branco, paletó vermelho, calças e sapatos brancos, abraçados com suas mulheres ou, como dizia minha mãe, "aquelas mulheres". Uma vez, cheguei a assistir uma briga de faca, que terminou no chão, mas desapartaram antes de algo pior. O prédio onde está o Cuíra, construído em 1905, já foi desde loja de algodão, cabaré, até borracharia. Agora é o Teatro Cuíra. Todo esse rodeio para avisar que a partir deste domingo, 18, iniciamos os trabalhos de 2009 com o projeto Se esta rua fosse minha, que consta de uma feirinha, na Primeiro de Março, lateral do Teatro e dentro, espetáculo infantil, tudo pela manhã. É bom que saibam que é tudo na marra. Na vontade. No compromisso de fazer. As cuíras Oriana Bitar e Patrícia Gondim estão à frente. A primeira, reunindo a galera da feirinha, que aumenta a cada dia. A idéia, ali, é oferecer desde discos em vinil, vestidos, bijús, antiguidades, enfim, um pouco diferente do comércio da Praça da República. Não se quer abafar ninguém. Pelo contrário. Dentro, teatro infantil, iniciando com os Notáveis Clowns. Entre os apoiadores, a Sesan, que enviou fiscais para convencer síndicos e moradores de rua a não espalhar e sim dividir o lixo corretamente e outros detalhes. Uma lavagem geral será feita com a Sesan e a galera, em regime de mutirão, neste sábado, cinco da tarde. E há muito o que lavar. Desde que estouraram uma fábrica de drogas no meio do quarteirão da Riachuelo e fecharam uma casa, um grupo de dez a quinze vadios decidiu viver ao ar livre, na esquina do Cuíra, emporcalhando tudo com sua presença, incomodando moradores, realizando pequenos furtos e tráfico de crack. Nada é feito. Mas vamos limpar. Isso quer dizer que nós, do Cuíra, fazemos nossa parte. Matamos a cobra e mostramos o pau. Nossa área é Teatro, Artes Cênicas, Literatura, Cinema, enfim, Cultura. Achamos, todos, que a saída é Cultura, Cultura, Cultura. Até lá, prosseguimos reféns. Mas vai ser, creio, o embrião de algo bem maior, bonito e duradouro. É uma idéia minha, da qual tenho orgulho, totalmente abraçada por Oriana, Patrícia, Zê e a galera que estará lá, aguardando por visitas.

Só quer aparecer

Leio em uma matéria sobre a estréia do novo espetáculo de Marília Pêra e encontro a inimaginável Susana Vieira pedindo ao inimaginável autor de novelas Aguinaldo Silva, ser escalada para seu próximo trabalho. Nada de minissérie, disse a atriz. Quer novela, porque assim aparecerá todos os dias e precisa disso. Não esqueçamos que a figura em questão acaba de passar por um impacto fortíssimo em sua vida pessoal, por conta do gogoboy com o qual se casou. Susana quer aparecer. É dessas atrizes que nunca subiu ao palco. Sempre na tv, trabalho industrial, sem nenhuma nuance, nada, sempre a mesma pessoa, ela, claro. Minha namorada comenta sobre Tony Ramos no programa de Ana Maria Braga, mostrando-se, mais uma vez, pessoa íntegra que é. Tony quase não faz Teatro, mas quando o fêz, ganhou todos os prêmios. Atualmente está em cartaz ao lado de Glória Pires, em vários cinemas. Sucesso. Não consigo imaginar um par mais sem graça do que Tony Ramos e Glória Pires. E no entanto, são adorados pelo público da tv. São parte da família, digamos, de cada um. Nada se espera deles, como de Susana, a não ser o de sempre. Lembro de Tony fazendo um grego ridículo e no entanto, vida que segue. Fizeram suas escolhas, tudo bem. Mas isso me leva a pensar sobre um artigo que Robert Solé escreveu na Folha de São Paulo, alguns dias atrás, com o título "Tela Legal". Citou os irmãos Lumiére, que criaram essa tela brilhante e agora tudo está mudado. Antes, lembrem, para retratar pessoas, somente desenho ou pintura. Agora, podemos nos ver, em um filme. Podemos nos perceber em 3D como somos, o espaço que ocupamos, de outro ponto de vista. Já escrevi sobre isso. Como você se vê? Saiu um livro, ainda não publicado no Brasil, chamado Tela Global, escrito pelo filósofo Gilles Lipovetsky e o especialista em cinema Jean Serroy. Vão desde os Lumiére, cinema mudo, falado, tecnicolor e hoje, a eletrônica. A Nouvelle Vague na França, Free Cinema na Inglaterra e a indústria de Hollywood. O que temos agora? Pixels. A tela foi diminuindo. Como o rádio, que no começo precisou atingir milhões de pessoas de uma vez para ser viável, mas com o tempo, pode ser individual, a tela, também passou por isso. A Telosfera, digamos. A tela foi diminuindo, diminuindo, até ficar portátil. Hoje, tudo é tela. Elas nos acompanham desde antes de vir à luz, nas telas dos aparelhos de ultrassonografia. A tela transformou-se em intermediária entre nós e o mundo. Sabe essas lojas de equipamentos eletrônicos que deixam, na vitrine, uma tela e uma filmadora, de maneira a jogar ali a imagem de quem passa? A documentar nossa passagem. Documentar nossa existência. A garotada, hoje, fotografando sem parar, em seus celulares, enviando para Orkut. É preciso fotografar, filmar, para comprovar o que se vive no momento. E somos documentados. Milhares de câmeras de segurança estão nas ruas documentando, comprovando nossa existência. Lembram dos museus, onde, nas paredes, dormem, ou vivem, dependendo do ponto de vista, belíssimos quadros? E hoje, nos grandes magazines, quando passamos na área de venda de tv e vemos diversos quadros, móveis, aparelhos ligados em diversos canais. São os novos quadros? Ou seriam os quadros equações de números complexos, chamadas de fractais, mostrando-se em resolução permanente, criando imagens lindas? E quem somos nós, para as telas? Somos nós mesmos ou um sósia, nem isso, um outro, que criamos, e que passa as noites teclando com outros "outros", idealizados para gerar conversas, onde dizemos de tudo, protegidos por essa identidade falsa e mais do que tudo, por essa intermediária, a tela. Assim, protegemos nosso eu mais profundo? OU revelamos esse eu mais profundo? Susana Vieira é mais radical. Ela é dependente do brilho da tela, porque pretende iluminar, com sua figura, nossas vidas. Porque não vive sem isso. As entrevistas, escândalos. Na sua idade, mais de 60 anos, sem nenhuma condição física, submete-se ao ridículo de sair como madrinha ou vedete ou o que o valha em desfile de Escolas de Sambas, que mais adiante, outro dia, escreverei.

A Luta

Acabo de ler a crônica semanal que Cora Rónai escreve em O Globo. Ela escreveu sobre a guerra que no momento está no noticiário, no Oriente Médio. Cora é judia, mas antes de tudo, mulher inteligente, com opiniões consistentes, comprovadas em milhares de textos e posições assumidas. Digo isso porque ela defende uma posição em favor de Israel e no momento, o que mais lemos nos jornais e internet são textos com opiniões diametralmente opostas. Digo isso porque, por coincidência, desde o ano passado, fui convidado para escrever um conto em uma coletânea chamada "Todas as Guerras", que deve sair pela Editora Bertrand. Como todo brasileiro, fui deixando o prazo decorrer e somente no meio de novembro, comecei a pesquisar sobre o assunto, o que incluiu um amigo que mora em Tel Aviv, que em um contato telefônico, dizia não entender como aquilo acontecia, uma vez que na capital e em Jerusalém, árabes e israelenses se dão bem e ele, inclusive, tem vários clientes árabes. Disse que é coisa de fanáticos, radicais, malucos, explodir bombas e tal. Anotei. Estou esquecendo de Cora? Vou continuar e já volto. Nem a pesquisa me deixou com qualquer especialidade sobre o conflito. Há leituras políticas, históricas, econômicas, enfim. Mexer em uma pedra naquele tabuleiro é mexer em casa de caba.
Jerusalém enfrentou milhares de guerras. Os turcos, por último, ali no começo do século passado, a entregaram aos ingleses, em esquema que envolveu até o Lawrence da Arábia, lembram? Pois ali, enquanto passou o tempo, Segunda Guerra e o Estado de Israel foi criado, também foi gestado no Egito, creio, o ovo da Al Quaeda, o processo de reação contra a ocidentalização no Oriente Médio, juntamente com o domínio do povo, através de interpretação equivocada do Alcorão. Hoje, Jerusalém é dividida em quatro partes. Judeus, árabes israelenses, católicos e armênios. Pois é. Cada um desses povos tem motivos para considerar Jerusalém sua cidade mais importante. E agora? Os palestinos se declaram ocupados por Israel. E são. E Israel diz que tem o direito de existir, pois seu povo também rodava por lá desde os tempos idos. Há uma sugestão para uma confederação de dois, um Estado dentro do outro, convivendo e resolvendo suas pendengas. Mas creio que isso não interessa a outras figuras que lucram muito com a guerra. Quando os palestinos partiram ao meio políticamente, os israelenses apoiaram Abbas, que é do Fatah e com ele conseguiram uma trégua. O Hamas correu e ocupou a faixa de Gaza, onde mora um povo miserável, ignorante, revoltado, ingredientes perfeitos. Sem se importar com a trégua, diariamente, o Hamas continuou disparando foguetes contra Israel. A trégua estava chegando ao fim, quando comecei a escrever o conto, a partir de dois paraenses, que por diferentes motivos vão bater em Jerusalém, nos dias de dezembro. Israel avisou várias vezes e agora botou quente. Será porque haverá eleições em 10 de fevereiro e o Likud (de direita), poderia ganhar e é preciso mostrar força? Haverá, também, eleições no Egito, Líbano, ih, é tanta confusão.
Aprendi quando comecei a estudar Teatro, que há uma tragédia quando os dois lados têm razão. É isso. Assim, lemos as mais estapafúrdias opiniões. Bem, alguém deve estar achando isso da minha. Volto à Cora Rónai. Ela diz que enquanto os foguetes caíram, diariamente, no lado de Israel, com sirenes apitando e crianças correndo para o subsolo, nada saiu na imprensa, como de resto, nada sai sobre as mortes no Sudão, Tibet e outros. Mas que, quando a bomba cai no lado palestino, e vêm crianças e homens (todos vestidos naqueles uniformes Adidas) com baladeiras, gritando, reclamando, vão para as primeiras páginas dos jornais do mundo. Israel vira, então, o grande vilão. Não é bem assim. Não sou judeu, nem mulçumano e deploro todos os atos de violência, de parte a parte, mas não é bem assim. E aí, Cora chega ao detalhe mais inteligente, e que nos cabe, nesse momento de enfrentamento que vivemos, nós, da classe média. Cora diz que os israelenses são a classe média e seus vizinhos, todos em estágio de desenvolvimento cultural e econômico bem menor, formam a classe baixa. Assim, somos atacados diariamente por palestinos e não dizemos nada. Quando tomamos alguma iniciativa, somos criticados. E onde está a culpa? A deles, lá no Oriente Médio, é uma. A nossa, incompetência. Nossa e dos políticos que elegemos. Formamos uma elite de merda. Viajamos tanto e não trazemos nada de bom. Votamos segundo interesses, picuinhas e depois queremos cobrar. O quadro político não está deteriorado desde hoje, quando não temos em quem votar. Mas é verdade que exacerbou desde o governo Jatene, quando todos os órgãos foram loteados conforme acordos políticos e ocupados por amadores, com outras preocupações e não cuidar do povo. Assim, hoje, com o PT que, pior, em sua própria configuração é uma frente política, estão todos em seus postos, imóveis. E dizem, acho provável, que nada acontece na área de Segurança, meramente por problemas internos, uma vez que a falta da segurança, proporciona grandes lucros a empresários do setor. Hum. Agora está aí a Guarda Nacional com carros, uniformes e armas novas e bonitas. Páram nas esquinas e ficam fazendo pose. O dia inteiro. As armas devem pesar. O que mais a Guarda fará?

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Insatisfeito

Não tenho gostado de nada. Devem ter percebido. De filmes, por exemplo. Não, gostei de um, Miss Pettigrew lives a day. Não lembro o título em português. Mas também não tenho gostado dos cds. Ainda compro. Discos instrumentais, bossa nova, novos nomes. Nada tem me deixado feliz. Comprei Roberto Carlos e Caetano Veloso cantam Tom Jobim. Uma lástima, claro, para o que se poderia esperar. O show foi comprado por patrocinador. Eles iriam lá, fariam seu papel, sem desgaste e pronto. Mas veio o olho grande de uma indústria falida. Virou cd e dvd. Aí, vêm os problemas. Ao juntar duas grandes figuras da nossa música, deviam permitir, ou ambos deviam permitir-se, realmente, misturar-se, trocar figurinhas, arriscar-se pelo prazer da companhia. Li, certa vez, a respeito de um show semelhante, que juntou João Gilberto e Tom Jobim, do drama de bastidores, tipo quem ensaia primeiro, quem fica em pé, quem senta, quem canta a primeira música, e a última, quem vai entrar primeiro ou por último no palco. Vaidades. Roberto Carlos é, tecnicamente, um grande cantor. Sua opção, adulta, pela música romântica, que com o tempo e desgaste virou brega, é lamentável. Ainda hoje, rico, já decaindo, inevitavelmente em vendas, seja pelo crack da indústria, seja pela baixa qualidade, ele não arrisca nada novo. O terno é o mesmo, o cabelo alisado e os arranjos soporíferos de orquestra. Caetano Veloso também evita. Cada um no seu quadrado. E Caetano com um paletó aberto, má composição, ali ao lado, sem química, sem nada diferente. Sem tipo, agora, nessa, Caetano toca violão e eu canto, na outra eu toco piano e ele canta, aqui fazemos vocal, mudamos o andamento dessa, como uma reunião entre amigos, dois grande cantores técnicos, dois grandes vendedores de discos. E o que é esse Daniel Jobim, neto de tom, fantasiado de Tom, cantando igual a Tom, as músicas de Tom? Não gostei. Não gostei, também, de Zé Renato cantando a Jovem Guarda. Quando li a notícia, achei demais. Zé tem ótima voz e vive procurando brechas interessantes para gravar, vender seus discos e seguir em frente. Mas quando Zé Renato vai pegar as músicas da Jovem Guarda, imagino que vá torcer, aqui e ali os andamentos, oferecer outros instrumentos, leituras, ousar um pouco e ainda assim, sair-se bem. Não. A base é violão, ou banda de Jovem Guarda. Há uns dois cellos aqui e ali, mas sem um comportamento mais agressivo, bonito, diferente. Quando digo lástima, é lástima para um Zé Renato. Não gostei. Cantei todas as músicas e em cada uma, chato, lembrei da original com mais carinho. A mesma falta de garra no último cd de Leo Gandelman, que venceu naquele momento do jazz pop e hoje não sabe o que fazer. Decidiu por um karaokê chic, onde clássicos da música brasileira, em arranjos simples, são cantados por figuras como Caetano Veloso, Milton Nascimento, Leila Pinheiro e outros estelares, e secundados por seus solos de saxofone. É muito fácil, muito simples. E depois reclamam que ninguém compra disco. Ah, não arriscam porque os consumidores, mais próximos do brega, não gostarão se complicar.. Chato. Meu irmão Edgar, diariamente conversa comigo sobre música, por exemplo. Raramente temos a mesma opinião. Ele é mais condescendente. Eu, não. Esses grandes nomes me acostumaram mal. Não posso perdoar-lhes, já que pago preço alto, sem desconto, para ouvir um Gilberto Gil e um Milton Nascimento que perderam sua voz e insistem em passar vexame. Ando insatisfeito, sabe?

The future is so bright i gotta wear shades

É o título do disco de uma dupla que sumiu no tempo, mas era muito boa. A propósito de em uma postagem, ter por tema o Ensaio sobre a Cegueira e na segunda, a procura exatamente da luz, por parte daqueles que dela deveriam esconder-se. E lembro que a cegueira, no filme, vem em um clarão branco e não na escuridão da cegueira normal. Assim, me pergunto que na verdade todos não ficamos cegos, dada a luminosidade adotada tanto por meliantes quanto por lúmpens, esses da Nova Civilização, ou da Volta à Floresta.
Hoje estamos chocados com a morte deste jovem Procurador, escolhido pela roleta russa em que vivemos, nós que pertencemos a uma classe que estudou, mora, trabalha e ganha razoavelmente. A pior vergonha é não receber, por parte das autoridades que nós, idiotas, elegemos, nenhum consolo, nem que seja de mentirinha, ir à televisão com ar de indignação, distribuir mais carros, enfim, essas bobagens. Nem isso. Fica assim.
Quanto a mim, não uso película em meu carro. É uma decisão, talvez idiota, de enfrentamento a tudo isso. Também porque, se entram em meu carro com película, passamos à frente de policiais dando adeus, não é? Enfim, uma opção. Posso mudar, claro, mas neste momento, não. Eu que achava que The future is so bright, I gotta wear shades.

SOB AS LUZES, À VISTA DE TODOS

Foi minha namorada que me fez notar a importância simbólica da cena que se passa diáriamente, no caso, específicamente quando escurece, na lateral do Teatro Cuíra. Um grupo que varia de seis a vinte lúmpens, despejados de uma casa na Riachuelo, onde funcionava, entre outras coisas, um laboratório de crack, decidiu morar na rua. Naquela esquina. E assim passa seus dias, vadiando, vendendo petecas de crack ignoradas pela polícia e com o dinheiro, comprando quentinhas e bebida, para incrementar a droga, o alcool, o sexo ao ar livre e até necessidades fisiológicas. Em qualquer circunstância, um ser humano vivendo nestas drásticas condições de vida, iria procurar becos escuros, meramente por constrangimento de ser visto daquela maneira. Não eles. Não em Belém. Não no Pará. Não no Brasil. Nossos lúmpens procuram exatamente o foco de um holofote com seu foco dirigido para a lateral do prédio. Ficam ali, como em um palco, seu palco, exibindo-se, não escondendo-se. Sob às luzes, à vista de todos. A mesma coisa acontece com os meliantes, os de colarinho branco. Alguém é descoberto. Há uma operação da PF com nome esquisito. Manchetes nos jornais. Fotos algemado, escondendo o rosto. Habeas corpus. Procrastinação do processo. E então, vem e se candidata a alguma coisa. Elege-se e a partir daí, passa a driblar, esconder-se da Justiça, em pleno foco, sob às luzes, à vista de todos. Em qualquer lugar do mundo, por mero constrangimento, aquele que rouba, foge, vai curtir sua grana em local não sabido e incerto. Ou sai de cena, tranca-se em casa, para curtir os milhões, mas sem sair, com mêdo de ser apanhado, ser vaiado por cidadãos enojados com sua presença. Não aqui. Aqui, sem acusar ninguém, por favor, todos saem em carros importados, gigantescos, passeando pela cidade, frequentando clubes, saindo em fotos que se repetem, domingo após domingo, as mesmas, nos mesmos lugares, nas mesmas páginas, em todos os jornais. Uma inversão total. Nós escondidos, com medo de sair de casa, onde ficamos guardados por grades, cercas elétricas, porteiros, vigilantes, alarmes, mas espera lá, essas coisas todas não são das cadeias, onde deviam estar os meliantes? De que lado estamos?

A Cegueira, somente o ensaio

Não fiquei satisfeito com o resultado final da adaptação do livro "Ensaio sobre a Cegueira", de José Saramago, feita por Fernando Meirelles, em regime de super produção, ele que estreou brilhantemente e após seguiu bem com O Jardineiro Fiel. Puxa, o livro de Saramago ainda está naquele monte e não cheguei a ele, antes de assistir ao filme. Então, tinha outra expectativa. Será que isso atrapalhou? Não sei. Quando leio o título, "Ensaio sobre a Cegueira", de Saramago, penso imediatamente nas questões filosóficas implicadas com o que chamamos Cegueira. Milhões. Muito interessante. Há uns dois anos, adaptei para leitura que foi feita por Zê Charone e Cláudio Barros, e ouvida por estudantes de um cursinho de vestibular, um conto do mesmo autor, que se revela semelhante, agora que assisti ao filme. Em uma cidade, os carros se abastecem em regime de racionamento e de repente, há uma revolução das coisas, contra os homens, mobilizando uma cidade inteira. E há sempre a impressão de um governo absolutista, como no comunismo, do qual ele é defensor. No que diz respeito ao filme, há belíssimas tomadas feitas em São Paulo, no minhocão deserto. Enfim, quero dizer que se Fernando não conseguiu fazer nem um filme com ingredientes comerciais, tampouco cult e por tabela, sem ler, esperava mais da Cegueira, de Saramago. O casal protagonista não tem o que chamam hoje de química. Nem de longe. Estão, cada um por si. Também não acho a atriz tão bonita assim, que arrebate. Alice Braga também não se destaca e nem é pedido. De repente, em uma grande cidade, alguém perde a visão e a partir daí, em uma cadeia de pessoas que convivem, um grupo é confinado em um galpão, vigiado por soldados e cães ferozes. Todos cegos, sofrendo com a perda deste sentido tão vital. Os médicos não sabem e nem aparecem. Comunicação com o exterior? Um mendigo, também feito por ator famoso, mostra um rádio de pilha, que toca uma canção, que todos ouvem, melancólicos. Pena. O radinho é completamente esquecido, depois. Não há amor, nem cenas de sexo a partir disso, o que daria um ingrediente comercial. As cenas de sexo são fortes, quase desumanas, outras são estupros em uma cerimônia de alta violência. O cenário é sombrio, sujo, pichado. De repente, está claro que é um governo totalitário, também. E vem a porta aberta e eles saem pela cidade sem lei, nem visão. Ao enveredar apenas pela leitura mais rasa, da perda do sentido da visão e o caos, não somente em uma cidade, mas a transformação do grupo de seres humanos, antes civilizados, em animais, Meirelles acaba em resultado comum.
E eu pensei que o Ensaio sobre a Cegueira fosse mais amplo, das cegueiras do dia a dia, cegueiras sentimentais, éticas, que regem nosso mundo, onde não olhamos para o próximo como pessoa, mas como coisa, paisagem, se não é do nosso interesse. Da cegueira profissional dos governantes. Mais específicamente, da cegueira para com os menos favorecidos, cegueira nossa do dia a dia, cegueiras propositais. Creio que seria difícil passar tudo isso em um filme, pois às vezes, a Literatura é muito mais complexa do que o Cinema. Por isso, estou insatisfeito.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Um Batman para Belém

Somente ontem assisti ao filme mais recente do Batman, que curiosamente destacou não o protagonista, mas o vilão, o ator Heath Ledger, seja por sua atuação, seja pela carreira curta, mas intensa, ou por sua morte prematura. Antes, havia recusado assistir. Mesmo considerando toda a importância desses heróis, nas HQs para minha geração e seu ressurgimento nos últimos anos, pela revitalização das comics, our por filmes, resisti. No mundo de hoje, com tantas modernidades, admitir, somente por deixar-se levar pela fantasia, um herói com aquela fantasia, aquele collant, a máscara e principalmente, a capa! Era demais. O filme é bom se considerarmos apenas a fantasia. Mas, felizmente, lança algumas discussões interessantes de travar após a sessão. A existência de um super herói, que também está acima de qualquer lei, somente porque, tudo que faz, é para o bem, mesmo que no caminho destrua bens, mate meliantes, quem sabe inocentes. Depois, através do Coringa, a violência sem culpa, sem fins lucrativos, pecuniários, digamos. Uma culpa, a cada vez inventada, de alguém que na infância, cortou sua boca, como que alargando cruelmente seu sorriso. Portanto, não foi apenas isso. Quanto a Ledger, dizem que se apossou tanto do personagem que isso o perturbou. Conheço muitos atores assim, mas não considero sua atuação tão brilhante e apenas normal, mais teatral do que o que o costumeiro fã de cinema assiste. Cacá Carvalho, por exemplo, daria um ótimo Coringa, ou Pinguim. No mais, não há defesa em como o Coringa consegue chegar à frente de todos, sempre, preparando armadilhas, contando com diversos e competentes ajudantes. Do outro lado, o Comissário Gordon e um Promotor, dois palhaços, estes, sim, como se o Coringa fosse um espelho, ou vice versa, palhaços dando ordens como aquele robot do Perdidos do Espaço, "perigo, perigo, perigo", dependendo apenas de Batman. Deixemos apenas pela fantasia, aqueles homens que representam a lei, em uma cidade, metrópóle, gigantesca, jogando ao céu um sinal, pedindo seu comparecimento. Há uma frase, dita ao final por Gordon, que diz "ele é o herói que a cidade merece, mas não é o que a cidade precisa". Lembrei de Belém.
Quem seria nosso Batman? E o Coringa? Bem, temos um baile inteiro de carnaval, um baralho inteiro, digamos, com várias opções. Imagino que não duraria dois dias e quem sabe, se mudaria para Manaus ou São Luiz, para nos dar ainda mais raiva. Quem permitiria a atuação de Batman? No filme, além do Coringa, há mafiosos, outro grupo de palhaços. Essa a grande diferença. Aqui em Belém, talvez sejamos nós, as pessoas de bem, os clowns. A contravenção é praticada a céu aberto. Batman não daria conta. Na primeira expulsão, viria um vereador aborrecido protestar porque era um pai de família, um trabalhador do mercado paralelo, melhor que estar roubando, etc. Para agir à noite, sua preferência, teria dificuldades. Não pela escuridão em si que nisso, somos ótimos. Belém é um breu vergonhoso. Bem, ainda não temos paredões de concreto onde ele possa se agarrar em seus pequenos vôos. Gente, a capa é ridícula! E quando fosse atrás dos ladrões pé de chinelo, pela Cidade Nova, Benguí, Che Guevara? Não, definitivamente, não. O Batmóvel ficaria preso no engarrafamento do Entroncamento. Sim, sairia de moto, mas precisaria ser muito bom em pilotar porque a galera daqui, sai da frente. Aqui, nossos motoqueiros são os novos centauros, os cavaleiros de capa e espada, os pistoleiros do oeste selvagem, em sua nova civilização, matando, roubando, conforme seu interesse ou julgamento. Antigamente, o sonho era ter um carro. Agora é ter a moto. A moto dá mobilidade, liberdade total, sem regras. O carro dá para se mostrar, o poder, dependendo do tamanho, mas é para outros Coringas, digamos assim. A moto entra em qualquer lugar. Agora estão vendendo ali no final da José Bonifácio, bicicletas com motor. Imagino crianças comprando e meliantes babando, distribuindo senha para roubar. Mas, voltando ao assunto, um Batman para Belém. Ele, Batman, representa o escuro de nossas almas. Nossa noite. Como morcego, se alimenta de sangue. Deve ler, todos os dias, Diário, Liberal e Amazônia e se deliciar. Mas, falando sério, Batman somos nós. Nossa vontade por Justiça, tranquilidade. Hoje vi nos jornais um ladrão surrado por Batmans. Arrastaram-no pelo chão, de modo a deixá-lo em carne viva. Queriam retirar-lhe a pele de assaltante, restituindo sua primeira pele, inocente? Batman somos nós? Lúcio Flávio Pinto seria um Batman? Não. Ele sempre utiliza as leis. Seria o delegado Gilvandro Furtado, agora dando expediente na Delegacia de Meio Ambiente? Também obedece as leis. E o Coringa?
Batman é Remo, Coringa é Paysandu? Batman é Jader, Coringa é Almir? Claro, rápido, arranjamos uma maneira de instalar tudo nesta nossa floresta de meliantes, deserto de idéias, vivemos aqui, sob as copas dessa grande mentira, neste abafado, fora das vistas de quem também não tem a menor vontade de nos ver ou dar importância. Assim, reinventamos o mundo, a nova civilização. E temos o herói que merecemos, não o que precisamos, ou seja, Cultura, Educação, Saúde, Saneamento e outras. Santa civilização, Batman!

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

A Nova Civilização

Coincidência ler em Flanar um desabafo sobre todo o desrespeito, estupidez, falta de educação, cultura e tudo o mais que chocou quem esteve no Mosqueiro, no Reveillon. Os incomodados que se retirem. Eles devem ter se divertido muito. A nova lei. A nova civilização se reinventando. No sábado, o Repórter Diário divulgou pesquisa realizada pelo sociólogo Valber Pires, sobre os camelôs atuantes no centro de Belém. O resultado é desamparo, falta de qualificação técnica e violência. Imaginem que a maioria dos camelôs já está na faixa etária de 30 anos, com 70% na informalidade, há mais de cinco anos, ou seja, ingressou na área em plena juventude e não deverá mais sair. A maioria não tem carteira profissional e 90% não paga Previdência. Mais de 70% dos entrevistados não possui Ensino Médio e muitos, sequer concluíram o Fundamental. Segundo Dados do IBGE e do Anuário Estatístico do Município de Belém, apesar do crescimento da economia acima dos 10%, registrou-se também um aumento no trabalho informal na cidade. Leio também, no Jornal Pessoal de Lúcio Flávio Pinto, que dos 7 milhões de paraenses, 6% é de analfabetos ou analfabetos funcionais. Dos 126 mil professores da rede pública de ensino médio, 1/3 não possui nível superior. E os que têm formação universitária, vieram de escolas particulares. Das 1216 escolas, 80% tem infra estrutura deficitária e obsoleta. Dados da Seduc.
Chega de números. Este é o abismo em que nos encontramos. Nosso povo não tem Cultura e por isso não tem Educação, Saúde, Saneamento e seguimos adiante. Não tendo nada disso, mas assistindo na Tv, diariamente, tudo o que o mundo moderno pode oferecer, age. E quando não obtém roubando, e nisso, deixando de lado tênis, relógios, celulares, mas colocando comida, por exemplo, inventa. A Nova Civilização. São novas leis, que podemos perceber em coisas simples. A motocicleta, por exemplo, virou sonho de consumo, depois da bike. Em ambos os transportes, não há lei a ser obedecida, a não ser a de quem está na direção. As motos também se transformaram em instrumentos ideais para matar e fugir rápidamente. O capacete, o disfarce ideal. Os jornais, parece, adequando-se à nova era, enchem suas páginas de cadáveres nas mais grotescas posições, encharcados de sangue. A reinvenção do mercado fonográfico, através do Calypso, negociando diretamente, estimulando a venda de piratas por camelôs, faturando nos shows. E se reinventam no visual, assistindo Shakiras e Madonnas, para dar seu jeito. Os números da Seduc mostram a gravidade do assunto. Sua mera revelação bastaria para cair um governo. E nem é somente culpa deste, claro. Pergunto o que Ana Júlia pensa disso. Como consegue dormir com esse barulho? E o tal prefeito, que também não é culpado único? Quanto à pesquisa entre os camelôs, percebam que eles são propagadores de Cultura no centro da cidade, por onde passa, diáriamente, boa parte da população. Vendem roupas, adornos, filmes, cds e outras coisinhas, digamos assim. Vendem seu mundo. O mundo reinventado. Tudo pirata. Bolsas e tênis Nike. Quem compra, sabe que é falso. Todo mundo sabe. E daí? Não é para ser Nike? Quem manda custar tão caro?
Agora mesmo, um grupo de lúmpens, deslocado de uma casa na Riachuelo onde a Polícia encontrou laboratório de drogas, achou de ocupar a esquina do Cuíra, Riachuelo com Primeiro de Março. Ocupar, simplesmente. Homens e mulheres em idade de trabalho, passam seus dias jogados em colchonetes pútridos, namorando, fazendo sexo, necessidades fisiológicas, bebendo, se drogando, brigando, discutindo, a qualquer hora do dia ou da noite, sem distinção. O mais interessante é que não tentam, de maneira alguma, se esconder, ocultar sua vadiagem, suas roupas andrajos, ou a trouxa onde guardam petecas de crack, que vendem para comprar PFs e bebida. Procuram exatamente o foco do holofote que ilumina a frente do Teatro Cuíra. Estão no palco, entendem? O mundo é deles. Infelizmente, a culpa é toda nossa. Nós, com nossas briguinhas internas, nossos ódios eternos, antipatias, nossos lucros pessoais, nos inviabilizamos políticamente desde que o Pará é Pará. Leiam o livro de Carlos Rocque sobre Magalhães Barata. Leiam sobre o velho Lemos. Nossa elite é uma elite de merda. Viaja o mundo inteiro e não traz nada de bom para a cidade. Pelo contrário. Nossos ricos, ao invés de agradecer à cidade por ter proporcionado sua riqueza, nada fazem. Está certo que pagamos impostos exorbitantes, mas também somos responsáveis por votar nesses pulhas que ao longo de nossa história, nos deixaram assim. Nossos jornais, aos domingos, repetem as mesmas fotos, das mesmas pessoas, nas mesmas festas, ou festejando os mesmos negócios. Um dia desses, ingênuo, Luizão tornou pública a má educação de Edu Lobo. Pra quê. Li mensagens que já o detratavam apenas por ter trazido o artista. Luta de classes, ainda. Lutamos entre nós. Queremos morrer abraçados. E somos caçados feito ratazanas prenhas, como diria Nelson Rodrigues, mortos a vassouradas, apenas porque ou nascemos em um lar de classe média ou conseguimos chegar lá, por mérito, por estudo, educação, cultura, e tentamos sobreviver com altivez nesta que tentou ser uma metrópole, mas voltou a ser uma selva. A floresta voltou e está engolindo a cidade. É a nova civilização. Tudo está por ser reinventado, segundo cada um de nós. Há esperança? Somos minoria.