sexta-feira, 27 de abril de 2018

A ÚLTIMA FARSA PAN AMAZÔNICA?

Não dá para afirmar que será a última. No intervalo de um mandato, vencido por candidata de outro partido, a gestão conseguiu ser ainda pior. Mas é preciso acreditar que essa nuvem negra que se abateu sobre os artistas paraenses e já dura mais de vinte anos, vai passar. Hoje, há pelo menos duas gerações que nunca puderam exercer plenamente seus talentos. No mesmo período, tanto a Cultura quanto a Educação pioraram tanto que as pessoas, nas mais diversas classes, se apartaram completamente do desfrute da Arte. De maneira implacável, a expulsão dos artistas da cena acabou por fazê-los desconhecidos da maioria. E mesmo assim, aqui e ali, alguns conquistaram posições, seja aqui, seja no Brasil e até mesmo em nível internacional. A brutal incompetência do funcionário público que ocupa o cargo de Sectário de Cultura, se estende à sua equipe. É incrível que isso dure tanto tempo. Suas idéias são paroquiais, amadoras, despropositadas. São profissionais formados que não parecem saber exercer seu ofício. Não se informam, não pesquisam. Por um momento, admitamos que o certo é apostar em ópera. Então, deveriam passar o ano difundindo o gênero, realizando cursos de canto lírico e apresentações, no mínimo, nas cidades polo do Estado, para enfim, em um ápice, fazer o tal festival em Belém, a capital. Mas não. Comportam-se como se fossem gestores da Cultura municipal. E o que dizer da tal Feira Pan Amazônica? De Pan não tem nada. Para isso, teria de contar com a participação decisiva dos outros Estados e países da Amazônia. Há uns dois anos, realizam Feiras em duas ou três cidades do interior. Levam sua festinha, autores locais apadrinhados e algumas atrações bem pagas. E depois voltam sem deixar nada. Não há programas para a Literatura. Não realizam oficinas, não debatem sequer as obras do autor homenageado, que na verdade é usado e depois descartado. Não incentivam os autores interioranos. Não levam os autores da capital para trocar idéias. Não revelam ninguém. Nào relançam livros importantes. Nada. A tal da Feira é uma bobagem que custa alguns milhões. Trazem autores nacionais que saem satisfeitos porque ganham bem, passeiam, comem nossas iguarias e não se dão conta da farsa da qual participaram. Há poucas editoras locais a participar. As livrarias colocam seu estoque, seu refugo, para vender a preços que nem são baixos. A Academia Paraense de Letras se sujeita a ocupar um stand mal iluminado e sem atrações, com autores que se recusam a perceber que colaboram com o que há de pior na Cultura. Insensíveis, cometeram, agora, mais um erro grosseiro, em tempos de empoderamento feminino com um cartaz que uma vez detonado nas redes sociais, foi retirado. A jovem escritora Paloma Amorim de início de carreira bem festejado, tem escrito diariamente contra essa farsa. Acusa de racismo, de não atender escritoras brancas, negras e indígenas. Enfim, percebeu tudo o que cerca o evento. Foi por tudo isso que escritores locais reuniram-se e formaram a Feira Literária do Pará. No terceiro final de semana de outubro, por dois dias, ficam na Livraria Fox, parceira, divulgando seus trabalhos, recebendo seus leitores. Mais ainda, há palestras sobre os patronos escolhidos. Relança livros importantes e fora de catálogo. Com a parceria da Empíreo Editora, lança novos autores. Tudo isso deveria ser o trabalho de uma Secretaria da Cultura, em todo o Estado. Já perdemos muito tempo e levará outro tanto para nos recuperarmos do mal que foi feito. Sim, eu espero que esta seja a última Farsa Pan Amazônica. Chega!

sexta-feira, 20 de abril de 2018

MY PLEDGE OF LOVE

Foi após assistir a um vídeo no Facebook, mostrando várias pessoas na chamada Terceira Idade, dançando em coreografia, uma música chamada “My pledge of love”, que me deu vontade de escrever sobre aquela época aqui em Belém. Serve para os colegas de geração lembrarem e para os novos leitores, algo bem curioso. Final dos anos 60, primeiros da década de 70. Tinha uns 14 anos, sei lá. Estava de férias no Rio de Janeiro, alguém me levou a uma boate no Joá. Elevador com luz negra e todos dançando. De repente o dj tocou “Na Na Na Hey Hey Kiss Him Goodbye” com Steam e me conquistou. Corajosamente fui até a cabine e meu espanto foi encontrar Ademir, um dos lendários djs da época. Dias depois, fui ao Canecão para mais um dos “Bailes da Pesada”, promovido por outra lendária figura, Big Boy, que tinha programas demolidores na Rádio Mundial AM, sim, ainda nesse tempo. Como estava cedo, Big Boy disse ao microfone que mostraria o primeiro disco solo de John Lennon, que havia chegado com um piloto, amigo, que veio da Inglaterra. As coisas eram assim. E também tocou “Sex Machine”, com James Brown e outra do 100 Proof, com “Somebody’s. Trouxe tudo para Belém. E já tocava Joe Jeffrey com “My Pledge of Love”. O instrumental era curioso. Metais, violinos, guitarra fazendo ritmo e bateria acelerada. Não era rock. Era dançante. Eu frequentava uma “Pipoca” na boate da Assembléia Paraense onde tocava até “Whole lotta of love”, com Led Zeppelin. E naquele miolo da música, onde há apenas sons e a voz de Robert Plant, as luzes, principalmente a luz negra brilhava e todos dançavam. Claro, após algumas músicas, vinha a música romântica. Criávamos coragem e íamos até as mesas, onde estavam com as meninas com os pais e convidávamos para dançar. Sentir seu corpo, cheiro, respiração, a conversa, tudo isso era uma experiência inenarrável. E quando alguns, mais atirados, colavam o rosto, o mundo podia explodir que ninguém sentiria. O próximo som anunciando a era da discotheque foi de Harold Melvin and the Blue Notes, que se apresentavam em um programa na Filadélfia, juntamente com O’Jays e tantos outros. Melvin, irresistível, baixo forte, violinos, piano, metais, vinha com “The Love I Lost, was a sweet love” e lotava as pistas. Melodia fortíssima, crescendos e explosões de metais que incendiavam as almas, bem como O’Jays com seu “Love Train”. Aqui em Belém, vários djs usavam essa música no encerramento dos trabalhos em alto astral. Sem querer perder trabalho para o som mecânico, Guilherme Coutinho trazia gravadores com sons pré gravados, aos quais acrescentava seu trio, já tocando Wilson Simonal com “País Tropical”, por exemplo, talvez Toni Tornado e sobrevivendo ao momento. Guilherme era insuperável, principalmente quando Walter Bandeira estava ao comando. Já era tempo do T1, ali na Base Aérea? No Pará Clube, entrávamos e mostrávamos qualquer carteira ao porteiro, com uma nota guardada, por baixo, que ele, com indescritível habilidade, guardava e deixava entrar. Não fui um grande dançarino ou participante assíduo, mas gostava. A Maloca, com Rosenildo Franco ao comando. Eu sei, havia a ditadura com vários agravantes. Desculpem, naquela faixa de idade, vivendo em um lar onde meu pai não discutia esse assunto e encarando um momento mundial onde a música, a literatura, teatro, cinema, poesia, tudo estava em revolução, confesso que não tive olhos para isso, o que me fez, mais tarde, comprar todos os livros possíveis, de todas as opiniões, até formar idéia a respeito. Enfim, eu fui muito feliz. Muito. E vocês?

sexta-feira, 13 de abril de 2018

O HORROR. O HORROR.

É claro que estamos em guerra civil. Os números mostram. Enquanto isso, o Secretário de Segurança, de maneira irresponsável, demonstrando até um certo escárnio, declara andar pelas ruas tranquilamente, sentindo-se seguro. Mas após assistir ao documentário “Os Últimos Homens em Aleppo”, que concorreu ao Oscar, fiquei chocado. Nada é esclarecido sobre que facção mulçumana é aquela, nem possíveis combatentes são mostrados. Somente a ação da organização Capacetes Brancos, que simplesmente ajuda a todas as vítimas dos bombardeios. Ahmad e Mahmoud são irmãos. Abu Youasef tem mulher e filhos. A cidade está em ruínas. Carcaças de prédios. Creio não ser possível reconstruí-la. Precisariam demolir os esqueletos de concreto e depois levantar novos edifícios. Não dá. Tudo é poeira, pó, fumaça, destroços. Eles mostram os jatos russos que atacam e despejam bombas. A visão delas, à noite, feito fogos de artifício, caindo, mistura o belo e o trágico. Eles trabalham febrilmente, cavando com pás e mãos, encontrando sobretudo crianças. Algumas estão mortas. Outras, com ferimentos graves na cabeça. Cenas terríveis. Um tempo depois, os capacetes brancos fazem uma visita à casa de uma das crianças. O pai conta que perdeu três filhos. O sobrevivente agarra seu salvador, agradecido. O olhar desses meninos é de perplexidade. Em uma idade de brincar, imaginar, sonhar, eles vivem uma realidade atroz. Aqui e ali, recolhem pés, braços, pernas, que colocam em sacos. Penso se suportaria tudo isso. Creio que por minha índole, faria de um tudo. Mas tenho certeza que uma melancolia, tristeza profunda, iria me afogar, invadir, pouco a pouco, até ficar inerte, sorumbático, preso em minha solidão, como que guardando um oceano de emoções para jogar não sei onde. Pensam diferente alguns fotógrafos que estão sempre aqui e ali, viciados em adrenalina. Todos praguejam contra Bashar El Assad, o presidente da Síria. Em dado momento, um dos capacetes brancos pergunta onde estão os árabes, ninguém ajuda. O mundo todo está contra nós. Abu pensa em levar a família para a Turquia, mas logo assistem na Tv que os que chegaram lá não são bem tratados. Outros dizem que não vão sair. É sua cidade e somente sairão mortos. Quando não são jatos ou helicópteros, até drones sobrevoam procurando alvos. Então decretam uma trégua. Eles levam as crianças até um parquinho. Brincam, também, como se crianças fossem. E então o rádio avisa que virá um bombardeio. Todos correm para se proteger. Mas é uma loteria. A bomba cai, o prédio desaba e vários morrem. O menino ouve o aviso e pede ao pai para voltar para casa. Jato joga bomba. Então, no meio de uma busca por soterrados, um deles avisa que precisa sair mais cedo. Estará em uma festa de casamento. Aqui, algumas pessoas morrem, enquanto outras casam. Estão dançando e lá vem aviso de bomba. E entre os desesperados que cavam e carregam mortos e feridos, um homem vestindo uma t-shirt do Kiss. Bem irônico. É um mundo diferente do nosso. Nas casas, há móveis, sofás, cadeiras, mas sentam em roda, todos, no chão. Não, as mulheres nem aparecem ou quando passam ao fundo, estão cobertas de negro. Desculpem os mulçumanos, mas não há interpretação possível, além da dominação dos homens, para manter as mulheres em casa, apenas como procriadoras, sem estudar, como inferiores. Sim, vivemos uma guerra civil em Belém. O inimigo veste-se quase sempre de maneira parecida com a nossa. Não sabemos de onde virá o tiro, nem o motivo. Não temos nem capacetes brancos para nos ajudar. Estamos perdidos.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

CHEGAREMOS LÁ?

Assisti nos últimos dias alguns filmes que me fizeram pensar a respeito da democracia e a tal coisa da liberdade de dizer e fazer, claro, dentro dos limites da lei e principalmente, do outro. Americanos adoram explodir a Casa Branca. São inúmeros os filmes em que os presidentes ou são tolos, ou perigosos, agentes de algum inimigo e não raro liquidados após serem combatidos por patriotas. No cinema espetáculo que exportam para o mundo, as grandes explosões, canhões, armas absurdas, servem como uma propaganda cultural de sua pujança e de seu modo de vida. Imaginem se os cineastas brasileiros fizessem um filme explodindo o Cristo Redentor, Pão de Açucar, sei lá, monumentos importantes para nós. Nossa democracia é recente e nossa forma de fazer política chegou ao ponto de descrença que deixa a todos sem resposta sobre o que fazer. O amanhã ninguém sabe. Dois filmes são passados na Inglaterra, país europeu, muito mais antigo que o nosso e com seu sistema próprio de fazer política, mantendo inclusive uma rainha. Também tem seus problemas, mas é um dos mais desenvolvidos no mundo. O primeiro filme mostra a amizade de uma rainha por um indiano. Idosa, aborrecida com todos aqueles compromissos, sem tempo para si, ela tem a atenção voltada para um indiano e contar como ele foi parar na corte seria longo. A amizade revolta aqueles que a cercam, disputando sua atenção e favores. Quanto ao indiano, também desenvolve historias mentirosas sobre sua origem e suas qualidades. No entanto, desperta na rainha a vontade de viver e enfrentando as dificuldades e armadilhas impostas à amizade, encerra a vida mais feliz, tendo um diálogo final bem bonito. Faríamos um filme, retratando personagens, digamos, recentes, com prós e contras, sem atiçar emoções partidárias daqui e dali? Outro filme, este feito pela BBC, emissora oficial do governo. Alguns anos adiante, Elizabeth morre e seu filho, Charles, assume. Seus dois filhos são adultos. O primeiro, casado com Kate, a moça bonita. O outro, atormentado pela vida sem liberdade que leva. Apaixona-se por uma negra de idéias socialistas. Planeja abandonar tudo para viver como uma pessoa simples. E aí, o Primeiro Ministro quer que Charles assine uma lei que controla a imprensa. Ele recusa. Vem uma crise. Ao invés de contar com a aprovação de sua decisão, o que seria de se esperar, há revoltas em várias cidades. O filho mais velho, em cenas fortes, ameaça o pai e toma o poder. O outro filho também concorda. E Kate, instigando o marido, é um dos artífices do golpe de Estado. Todos acham que a imprensa deve ter freios. Como assim? A BBC? Freios à imprensa, na Inglaterra? Golpe? A cena final é a coroação do filho. Somente um país onde a Educação, Cultura e outros estão em alto nível, a BBC faria o filme e até cometeria o erro sobre a imprensa. E retrataria uma possível rebelião dos filhos contra Charles. Também assisto “O Mecanismo”, de Padilha, bem como acompanho o mar de críticas que a série vem recebendo. Não estamos preparados. Há sempre uma salvaguarda sobre o roteiro ser ficcional. Nào adianta. Aqui e ali, reclamam de falas em boca de outros, perseguição, postura partidária, enfim. Pois estou gostando. Assisto como ficção. A voz do Selton Melo não foi bem mixada. É interessante perceber como corruptos, até então certos da impunidade, sofrem ao serem descobertos. Outros confiam até o final que sairão livres. É ficção e pronto. E também, quem não gostar, pode preferir outras tantas excelentes séries da Netflix, ao invés de reclamar como se fosse documentário. Não é. Chegaremos ao ponto de explodir Brasília, matar presidentes, tudo como ficção, sem a confusão de hoje? Chegaremos lá?