segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Moscow, 15.30 horas, 31 graus, maré alta

Foi decisão de momento. A hora da maré cheia. Partimos para Mosqueiro. Hoje, em um domingo, para fazer a visita, é preciso abstrair, ignorar todos aqueles idiotas, com seus carros som a tocar brega, os bêbados na contramão, moças com saídas de praia de crochê, enfim, toda a má educação que maltrata a ilha, tão linda. Fomos direto ao Farol, o lugar dos meus sonhos, da infância e adolescência. Fiquei extasiado, parado, ali, naquele cenário magnífico. O vento à toda, despenteando minha alma, o mar encapelado, praticantes de kite surf, a Ilha dos Amores somente com sua parte mais alta e um céu azul de filme. Pisar na areia, repisar onde passei tantos momentos lindos e marcantes da vida. Momentos inesquecíveis. O Hotel, mantido pelas filhas de Dona Adelaide, tranquilas, como só podem ser. O banho, "pegando jacaré" nas ondas e deixa pra lá se a água é suja, não estrague meu momento. Até o Antônio mergulhou e nadou conosco. Depois subir e ficar pegando aquele vento exultante. Sair e passear, pisar novamente a pracinha, onde tanto brinquei, ver a árvore onde, um dia, pensei na vida, no silêncio de uma segunda feira, com meus pais e dois irmãos vindo a Belém. Aquele ruído distante das ondas quebrando, os coqueiros sussurrando e caminhar até a casa "Celina", hoje propriedade do amigo Mariano Klautau Filho. Não havia ninguém. Nem por isso, entrei. Fiquei ali na porta, calculando onde sentava, olhando por onde ia até a praia, jogar futebol. Olhar a lateral, onde passávamos rumo ao chuveiro ao ar livre, sentindo uma sombra gostosa das duas casas. A casa de "Seu" Harley Vieira, que se divertia à noite, fazendo mágicas para nós, crianças. Ou, de tarde, passeando em um kart, levando um de nós, de cada vez. Olhei as outras casas. Medi distâncias. Lembrei de coisas tão importantes, até hoje, que escrevo lacrimejando. Como era lindo, perfeito. Como fui feliz, mesmo quando era infeliz em minha timidez. E depois, contornar pela Bateria e olhar o quintal, onde jaz quieto, saudoso de companhia, um balouço que assisti, recentemente, em um vídeo de Mariano. Lembrei de todos. De minha família. Avós, pais, irmãos, primos, amigos. Era tão bom! E voltamos, enfrentando engarrafamento e retenções na estrada, nesta diária agressão que Estado e Município nos atingem. Não interessa. O impacto da visita, sempre o mesmo, inclusive, sei que me repito neste blog, é o mesmo. Quanta saudade!

O Homem que venceu Auschwitz

Relatos ou mesmo ficção a respeito do Holocausto dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial são muitos em diversos formatos. Parece que apenas aquele maluco do Ahmadinejad afirma que é uma mentira. Mas confesso que fiquei emocionado, impressionado com este livro, escrito por um sobrevivente, Denis Avey e Rob Broomby, repórter da BBC.
Denis alistou-se e começou a lutar na África. Prisioneiro, acabou em um navio que foi torpedeado. Pulou no Mediterrâneo e chegou à Itália, onde foi novamente feito prisioneiro. Por tentar escapar por duas vezes, foi castigado e passado adiante, em campos de prisioneiros de guerra. Acabou em Auschwitz, embora não na mesma condição dos judeus, estes, levados para lá com o intuito de assassinato em massa, mas antes, aproveitando os mais sadios em trabalho escravo e aniquilador. Denis estava com outros prisioneiros de guerra e também fazia trabalhos forçados. Sua alimentação era melhor, bem como acomodações. Impressionado com a brutalidade, a falta de qualquer humanidade e a motivação para o assassinato, por qualquer motivo, ou sem qualquer motivo, chegou a trocar duas vezes de identidade com um judeu, de tal forma a dar a ele uma noite de "conforto" e a ele a chance de observar tudo o que ouvia falar sobre a chacina cometida no campo de concentração. Seu relato deixa qualquer um nervoso, revoltado com tanta selvageria. Hitler, Himmler, os comandante, mas sobretudo o alemão nazista comum, soldado, como um que ao se irritar ouvindo o choro de uma criança, no colo da mãe, esfomeada, assustada, de madrugada, chegando em um daqueles trens, volta-se e desfere um potente murro na criança, matando-a. Assim, simples. Com o fim da guerra e a chegada dos russos em Auschwitz, levam os prisioneiros em coluna para um lado e os judeus para o outro. A marcha da morte. Denis conseguiu escapar, desta vez. Volta para casa e não consegue falar sobre o assunto. Sobre o que hoje se conhece como Stress Pós Traumático. Pior, todos queriam ouvir histórias de glórias e não a de um prisioneiro e pior, sobre a chacina em campos de concentração. Afinal, era um absurdo crer que isso poderia ter acontecido. Denis casou, descasou, voltou ao trabalho e os problemas continuaram. Tuberculose espalhada pelo corpo. Ficou quase dois anos em um hospital, recuperando-se da cirurgia. Seu corpo recusava-se a fechar o corte na barriga. Depois, perdeu um dos olhos, por câncer. Em Auschwitz, um rapaz, judeu, disse qualquer coisa e foi espancado até morrer, por chutes e golpes de rifle. Não conseguindo suportar, Denis insultou o guarda, que lhe deu uma forte coronhada no olho. O golpe veio cobrar a conta. Incrível como quase 60 anos depois foi que conseguiu relatar o que viu e ser recebido pelo Primeiro Ministro da Inglaterra, com a medalha Herói do Holocausto. Estava com 93 anos, há dois anos atrás. Espero que ainda esteja vivo, muito vivo e a cada dia de vida, seja mais feliz, mais vivo. Sinceramente. O livro é da Editora Nova Fronteira.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

A Lenda do Pianista do Mar

Como posso ter passado batido à época em que o filme passou por aqui? Meu filho assistiu em algum canal fechado, especializado em filmes antigos e desde então, passei a procurar até encontrar. O título, no original é "The Legend of 1900", direção de Giuseppe Tornatore, com Tim Roth no papel principal e música de Ennio Moriconi. Um navio que fazia a ponte entre NY e Liverpool. Nos altos, os ricos, nas classes mais populares, imigrantes. Um dia, logo após chegar, um maquinista, de cócoras, percorre o salão de festas à procura de "perdidos" e encontra um recém nascido, abandonado. Resolve adotá-lo. O nome, bem, "1900", porque o ano havia começado. Ele nunca sairá do navio. Não terá registro, não terá existido, nunca pisará em terra firme. E se tornará um grande pianista. Terá um amigo, pistonista e as chances de desembarcar e levar uma vida normal. Em meio a isso tudo, as músicas, as roupas, cenário e uma atmosfera de romance maravilhosa, no ar!

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Enfarruscado

Hoje está meio enfarruscado, o tempo. Não pude evitar. Senti como se fossem os últimos dias de novembro, já entrando dezembro. Eu e meus irmãos de férias. Não há melhor sensação do que acordar mais tarde, se espreguiçar e levar alguns minutos pensando no que fará neste dia. Nada! Maravilha, nada! Lembro quando subia a São Jerônimo, em direção à casa de meu saudoso amigo Abílio Cruz. A programação? O que ocorrer. Podíamos jogar futebol, no quintal da casa ou no Colégio Nazaré. Podíamos sair pelas ruas, jogando peteca, passeando de bicicleta. Delícia. Podíamos, eu e meu irmão Edgar, dar sequência ao nosso campeonato de botão, com direito a narração e tudo. Tínhamos equipes do Rio e São Paulo. Meu amigo Sérgio Zumero tinha o Remo, com o centro avante diferenciado, sua própria foto! Mas assim, não pode! Era na base do bate vai levando. Nossa mãe confeccionava uma bolan de lã, filó para as redes, era ótimo. Ou então, ficávamos jogados no que chamávamos "salão" do apartamento, ouvindo Beatles. Sim, tempo enfarruscado, para mim, é ouvir Beatles. "One, two, three, four.. let me tell you how it will be", as primeiras palavras de "Taxman", no disco "Revolver". Os Beatles ficavam adultos, começavam o disco esculhambando o Imposto de Renda. Não entendíamos inteiramente, apenas gostávamos do que ouvíamos. E o disco em sequência, os caras imitando Bob Dylan em "You've got to hide your love away". Ou então contando que o Dr. Robert ensinou-os a gostar de LSD, o que fica muito interessante na última faixa, onde inventaram o looping em "Tomorrow never knows". Ficávamos ali, ouvindo, cantando, arengando uns com os outros e o dia passava veloz, divertido, inesquecível. Agora vocês imaginam cinco irmãos juntos, quase o dia inteiro, conversando, ouvindo música, se alimentando de vida, curtindo as férias. Quando me perguntam de onde vem minha veia de escritor, sempre falo da família, pai, mãe, avô, tia e nem sempre cito meu irmão mais velho, Edgar Augusto. Penso que ele foi uma das figuras mais importantes, como um holofote que vai à frente, iluminando tudo. Com ele ouvi Beatles e todo o resto. Líamos Nelson Rodrigues com devoção. Havia jornais internos, histórias em quadrinhos, paródias de sucesso com provocações internas. Ou então cowboy, onde ele era o mocinho, Bill, eu e Janjo os malfeitores, Brown e Robin Hood (valia tudo) e minha irmã Celina era Maggie, a dona do saloon. Em tudo ele estava à frente. Quando amadureceu, foi em outra direção e eu como que prossegui com o que havia me ensinado. Os tempos mudam, a garotada, hoje, deve ter suas predileções de diversão. Mas toda vez que o tempo fica enfarruscado, lembro daqueles dias, de férias, jogado, ouvindo Beatles. Era muito bom.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Todo terrorista é sentimental

Muito bom de ler o livro "Todo terrorista é sentimental", de Márcio Menezes, editado pela Record. A trama se passa durante a década de 90 e utiliza alguns crimes de colarinho branco, perpetrados por políticos, mas devidamente mascarados, para propor a hipótese do terrorismo no Brasil. Realmente, somente um povo como o nosso para ir aceitando os acontecimentos com raiva, mas sem reagir, tamanhos os escândalos políticos nesta nossa democracia, ainda tão jovem. No livro, dois rapazes, estudantes, naquela fase da vida, a mais maravilhosa, quando o mundo se abre feito uma rosa, mil possibilidades, há estudos para terminar, expectativas totais, amores, hormônios, tudo explodindo, enfim, os dois rapazes estão indignados com os políticos nacionais. De demoradas discussões nos bares da Zona Sul do Rio de Janeiro, namoros, provas, vem a sugestão do terrorismo. Matar os corruptos. Criam o CCC, Comando Caça aos Corruptos, formado pelos dois amigos, mais uma moça que se junta após a primeira morte. Não temos histórico de terrorismo, a não ser alguns poucos atentados no tempo da Revolução. Estamos acostumados a assistir, diariamente, ocorrências do Iraque, até Espanha, mas nada daqui. A primeira bomba, artesanal, matou um corrupto e feriu uma criança. Chocou a opinião pública. O Governo. A mídia toda. Mas não havia um lugar para partir. O CCC não deixou sequer uma carta assumindo o atentado. E assim foram, se arriscando cada vez mais, aumentando também a voltagem de suas vidas amorosas, o sexo em todos os lugares, mais amor e até um terrorista do ETA, perdido no Leblon. Não vou contar como termina, lógico. Mas é bem escrito, atual e desenvolve uma idéia que considero muito perigosa, por condenar de todas as maneiras o terrorismo. Mas e se..

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O Círio

Não gosto de maniçoba, pato no tucupi, açaím tucupi, tacacá e outros. Mas não sou menos paraense que ninguém. Nunca perdi um Círio. Nunca. Colaborou para isso o fato de ter morado, desde o nascimento, em um prédio no trajeto da romaria. O apartamento, até hoje, fica lotado de parentes, amigos, amigos de amigos, minha família. Uma vez, meu pai me levou até a subida da Presidente Vargas. Acompanhamos a passagem da berlinda e depois seguimos atrás. Fomos até a sede do Clube do Remo. Lá meu pai ficou entre amigos e eu, pus-me bisbilhotar e observar a sede, seus frequentadores. Retornamos ao apartamento para o almoço. A memória trai, mas é o que lembro. No mais das vezes, era acordar cedo, com os foguetes dos estivadores, e correr para o banheiro, escondendo-se de visitas que já haviam chegado. Depois, receber amigos, primos, tios, enfim. E assistir meu pai em um de seus momentos mais felizes. Passava de grupo em grupo. Bebidas, somente após a passagem da Santa! E quando Ela vinha, todos às janelas, eu, meus irmãos, minha mãe e meu pai, juntos, emocionados. Era passar e já surgia um violão, alguém com pandeiro, o whisky rolando generoso e começava outra festa. Delival Nobre, meu pai, amigos, todos se divertindo. Descíamos até a Praça para comprar brinquedos cirianos. Ainda hoje faço isso. Faço para o menino que me habita. Eu me lembro de ir ao Largo. Da pavimentação em tábuas, barracas de madeira, bares, onde cantava Edna Fagundes, a rainha do brega, na época. e os brinquedos. Hola, Tira Prosa, Montanha Russa, Cavalinhos, Trem Fantasma, Casa dos Horrores. Uma vez, para não passar vergonha, topei alegremente ir com amigos no Trem Fantasma. Bastou o carrinho entrar na escuridão e fechei os olhos. Tinha medo. Na saída, despistei e eles não perceberam. Enquanto isso, tenho dois primos, que moravam nas cercanias do Largo e eram o terror, da Casa de Horrores. Entravam e iam jogando bombinhas, fósforos acesos nos "monstros", que gritavam de medo. Muito bom. Outro primo, na Roda Gigante, quando nosso assento estava no ponto mais alto, destrancava a barra de segurança e punha-se a fazer estrepolias, para nosso desespero. Era o Círio.
Hoje, continuo morando no trajeto do Círio. Recebo amigos, parentes. Acordo cedo por conta dos foguetes, ligo a tv e vejo onde está a berlinda. Mas quando Ela se aproxima, desço até o apartamento de minha mãe. Ficamos juntos, acompanhando a passagem Dela. Não sou devoto de Nazaré. Mas é Maria que está ali. Quando passa, sinto toda a energia que a berlinda recebe e retransmite. É algo brilhante, forte, emocionante. Momento único. Difícil explicar. Os que vêm de fora, sempre dizem que é muito, muito maior do que pensaram, após receberem informações.  Mesmo nos tempos em que não estava morando no prédio, acordava cedo, botava as crianças para correr, conosco, na "contramão" do Círio, até o apartamento. Não gosto dos pratos paraenses. Conheço poucas cidades do Pará. Sinto-me às vezes, estrangeiro em minha própria casa.  Mas nunca perdi um Cirio. Tomara que seja sempre assim. Feliz Círio para todos. E a falta que faz meu pai!

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Selva Concreta

Agora já está nas mãos dos interessados em ler. Aquilo que esteve comigo, no conhecimento de alguns poucos, é público. O livro está lançado. E os repórteres me perguntam, quais serão meus próximos projetos. Quando repórter, devo ter cometido o mesmo erro. A pessoa está ali, cheia de alegria pelo trabalho enfim lançado, querendo curtir o feedback e já precisa ter outro projeto em vista? E sim, eu tenho, mas vou primeiro ficar na boa, um tempo. Foi um ano bem puxado e a saúde anda cobrando a conta. O livro foi escrito como uma série policial passada em Belém. Seria o máximo tê-la realmente nas telas, perdoem o trocadilho. Peguei alguns personagens que vêm desde Os Éguas. Alguns casos continuam  no próximo capítulo, outros, não. Li um trecho do trabalho de Relivaldo, orientado por Ernani Chaves, para a Unama, referindo-se a "Os Éguas". É espantoso ler a explicação técnica para o que se está fazendo. Muito legal. Como artista, é claro que gosto do elogio, mas o autor quer, mesmo, é conversar, ouvir opiniões, possibilidades, voltar àquele ambiente do livro onde esteve mergulhado, solitário e que agora, com as portas abertas, recebe visitas. Marcelo Damaso, que tem livro inédito merecendo edição, trabalhava no Policial do Diário do Pará. Veio um dos crimes. Conversamos pelo telefone. Ele escreve a "orelha". A edição é primorosa. A equipe de Ivana Jinkings é ótima. Vai espalhar o livro pelo Brasil, esta sim a graaaaannnde vitória de um autor de Belém do Pará. Aos amigos que compareceram ao lançamento, o meu agradecimento. Sair de casa especialmente para ir dar um abraço e adquirir o livro é prova de amizade, hoje em dia. Tomara que gostem.