terça-feira, 30 de novembro de 2010
Aconteceu em 67
Eu tinha 13 anos de idade, o que em termos de um garoto de hoje, equivale a ter uns nove anos apenas. Não lembro bem, deveria perguntar ao Edgar, se acompanhamos tudo isso aqui em Belém, pela Marajoara, que recebia os tapes ou quando estivemos passando uma temporada no Rio de Janeiro, na casa de nossos avós. A verdade é que, para mim, é absolutamente inesquecível e formador cultural. Os elepês, ouvíamos contritos, emocionados. Sei a maioria das músicas. Quando as ouço, lembro de tudo, cenas, acontecimentos, enfim, como era bom. Os Festivais da Record. Naquela época, ao invés de novelas, o horário nobre era ocupado por programas musicais. O cast da Record tinha o melhor da mpb e também o programa Jovem Guarda. E por muita sorte, reuniu mais de uma vez, todos muito jovens, cheios de sonhos, artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Roberto Carlos, Chico Buarque, Edu Lobo, precisa continuar? Quando, em outro tempo, tanta gente boa se reuniu? Os mais jovens podem dizer que houve outro grande momento, nos anos 80, com o rock nacional. Ponto de vista. A televisão era em p&b. Imaginem a distância de São Paulo para Belém. A platéia, não sei quantas pessoas, participava vaiando, cantando, aplaudindo, interferindo nas apresentações. Quem eram essas pessoas, essa fatia de público, formada por jovens universitários, gente classe média, que passava para o resto do Brasil sua preferência por um tipo de música, letra, arranjos? Renato Terra e Ricardo Calil fizeram o documentário excelente, reproduzindo os melhores momentos e entrevistando protagonistas. Chega a chocar a fumaça em todos os ambientes. Como se fumava! Reali Jr e Cidinha Campos faziam entrevistas nos bastidores, sem nenhum problema em ter entre os dedos, cigarros. A pergunta era feita com a fumaça saindo da boca e o entrevistado devolvia, também com fumaça. O cenário era ridículo, com plantas no palco. Blota Jr e uma locutora que não lembro o nome, caprichando nos "erres". Edu Lobo, emocionado, com Marília Medalha e o Momento Quatro, grupo vocal onde vemos Zé Rodrix e Maurício Maestro. Tão jovens em "Ponteio". Na entrevista, Edu e sua absurda antipatia e imbecilidade. Chico Buarque também nunca está à vontade nas entrevistas. Não lembra das letras, não considera importante. E lá está ele com o Mpb4 em "Roda Viva", que até hoje cantamos. Caetano Veloso fala muito. Solano Ribeiro, organizador, conta que o baiano ia cantar apenas com gola rolê o que ele achou errado. Mandou comprar um paletó. "Alegria Alegria" é uma marcha lusitana, com guitarras, refrão forte e letra irresistível. Edu e Chico dizem que ficaram desconfortáveis depois que os baianos vieram com todo aquele som e cores. Tornaram-se aos 23 anos, artistas superados, antigos. Outro que comparece com seu mau humor e boçalidade, embora seja um gênio é Dori Caymmi, que surge novinho, já de bigode, tocando violão para Elis Regina, a maior cantora do Brasil, já naquela época. Dori odeia o arranjo do maestro Gaya para seu "Cantador". Ao contrário, seu parceiro Nelson Motta, conta que ao ouvir Caetano em "Alegria Alegria", tentou torcer contra, por ser um oponente, mas acabou cantando junto. E Gil que entrou em pânico e decidiu não ir cantar seu "Domingo no Parque"? Arranjo de Rogério Duprat. Mutantes. Demais. Uma letra cinematográfica, genial, com abertura orquestral irresistível. E Nana Caymmi, que era casada com Gil, cantando "Bom Dia", linda e forte, magrinha, cheia de atitude. E Roberto Carlos, contratado da emissora, cantando um samba de Luiz Carlos Paraná, apenas razoável. E Sérgio Ricardo quebrando o violão. Solano Ribeiro esculhambando o ótimo Sidney Miller, já falecido, que cantou a beleza que é "A Estrada e o Violeiro", com Nara Leão. Que elenco! Eles não tinham idéia, mas faziam história, influenciavam um país inteiro, moldavam destinos. E era tão bom! A língua portuguesa no seu melhor, a música em diferentes gêneros, arranjos e vêm Caetano e Gil com seu liquidificador sonoro. E ganha "Ponteio", de letra política. Aconteceu em 67, mas mexeu com toda a minha vida, eu, ali, com 13 anos de idade, um garotinho magro, cabeçudo, feio, mas que apreendia tudo o que era mostrado.
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