quinta-feira, 24 de junho de 2010

Valleys of Neptune

Uma manhã de sábado, talvez em 1968, acabara de chegar do Colégio Nazaré, onde jogara futebol e estava deitado no quarto, quando meu irmão Edgar chegou do trabalho na Rádio Clube do Pará. Tal como sempre fazia, ligava sua "eletrola" para ouvir seus discos. Foi assim que cresci ouvindo tudo de Beatles, Rolling Stones, Bee Gees, anos 60. Mas em vez desses, por curiosidade, colocou para ouvir um álbum chamado "Electric Ladyland", de um tal de Jimi Hendrix. Levantei da cama feito choque elétrico. Nunca mais fui o mesmo. Aquele era o "meu" som e não o do irmão mais velho. Não consigo imaginar até hoje o choque estético daquele instante. Aquele cara, misturando rock, jazz, folk, tudo, era o que eu precisava. Ele me ensinou os caminhos harmônicos, o feeling das notas e até as letras, para mim, super estranhas, eram mais um mistério. Lembro, no Rio de Janeiro, onde morei com minha avó, trancado em uma cabine de som de uma loja antiga, que já não existe mais, ouvindo "Are you experienced" e "Axis: Bold as Love". Minha sensação é que somente eu conseguia entender aquilo. Era um tesouro pessoal, na época, também dividido com Janis Joplin. Curiosamente, lembro que as primeiras letras de música que tentei traduzir, usando inclusive um dicionário, eram dos Beatles, indo de uma ponta como "Penny Lane", descrevendo todo um ambiente, até "Strawberry fields forever", psicodélica. Os "newspaper taxis, as celophane flowers" de "Lucy in the Sky with Diamonds". A estrutura da canção brasileira era diferente. Casos de amor, por exemplo. "Penny Lane" contava o que havia na rua, nas calçadas, a barbearia. "Strawberry" era louca e eu não entendia, ainda, o quadro lindo que pintava, incitando a imaginação.
Jimi se foi e até hoje ganham milhões com ele. Esse "Valleys of Neptune" é mais uma enganação. Músicas que já conhecemos com outros títulos, ou em gravações de estúdio. Na formação, Jimi oscila entre Billy Cox e Noel Redding no baixo, mas Mitch Mitchell está sempre na bateria. O guitarrista implicava com o baixista. O problema é que, ao formar o Experience Trio, Chas Chandler chamou Noel que era guitarrista, para assumir o baixo. E na estética de Jimi, o baterista podia tudo, quebrar, virar, solar, mas o baixista era o âncora, sem floreios. Peça a um guitarrista para tocar apenas o óbvio. Há ótima regravação de "Stone Free" e shows em estúdio de "Sunshine of your love", do Cream e "Red House". Mas se quer conhecer Hendrix, ouça os álbuns de estúdio, como os citados lá no começo.

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