Li
no face alguém comentando que antigamente, sem o serviço sonoro em todo o
trajeto, era um Círio mais silencioso, mais concentrado, ouvia-se os pés das
pessoas caminhando, pouca conversa. Sim, acho que sim. Este ano, felizmente,
deu um bug no tal serviço e não o tivemos. Mas aumenta cada vez mais o número
de “homenagens” no formato de cantores interpretando músicas alusivas à Nazica.
Confesso, sou um dos culpados por isso. Eu e meu irmão Janjo, pouco depois da
inauguração do shopping Castanheira, por encomenda do grupo Líder, trouxemos
Leila Pinheiro para cantar em frente ao Hilton Hotel. Hoje o Círio corre o
perigo de se tornar uma “micareta”. Há vários pontos de vista. Sempre nos
queixamos do desprezo da grande mídia, no Sudeste, a não dar a devida
importância ao acontecimento, com dois milhões de pessoas nas ruas, preferindo
as 200 mil de Nossa Senhora Aparecida. Da falta de um número maior de turistas,
afinal, ainda hoje, turista, mesmo, é aquele paraense que há muito mora fora e
vem matar as saudades. É uma área de péssimos resultados, essa. Mas também
torcemos o nariz quando o marketing se impõe, seja em camarotes patrocinados
por grandes empresas, onde é necessário vestir uma camisa (abadá) para entrar,
seja quando Fafá de Belém traz alguns convidados, é verdade, a maioria de
baixíssima visibilidade nacional, para uma tal de varanda. Sei que da parte de
Fafá, a idéia é exatamente trazer pessoas formadoras de opinião para disseminar
a importância do Círio. Há várias cotas de patrocínio, o Governo entra, mas não
me interessa aqui saber se ela ganha algum pelo tempo e imagem investidos.
Enfim, queremos a popularização do Círio, mas ao mesmo tempo queremos que
Nazaré seja respeitada, o ritual, a cerimônia, que não seja vista como
carnavalesca, atração meramente turística. E aí vem a tal Diretoria da Festa,
com suas decisões complicadas. Há iniciativas muito boas como a evangelização
através das imagens que percorrem as casas. Mas há outros detalhes a
considerar, exatamente no que junta o aumento da fé e o crescimento da cidade.
Frequentei o Arraial de Nazaré enquanto pude. Grandes lembranças. Mas a cidade
cresceu e engoliu o Parque de Diversões e Bares onde reinava Edna Fagundes e
seus boleros mortais. O Parque atual é inseguro e caro. Mas ainda há quem, do
interior, venha visitar Nazaré na Basílica ou ali na Praça e depois vá brincar.
O que precisa ser remodelada é a cerimônia de encerramento, na noite de
domingo. Antigamente, os foguetes eram estourados ali mesmo, em frente à
Basílica. Depois, ao lado. E agora, temos a proibição do Ibama, que tem lá suas
razões, mas principalmente, há hospitais e idosos que não merecem ter ouvidos
agredidos por algo que, no fundo, no fundo, é queimar dinheiro. A praça e o
parque viram uma bomba pronta a estourar. Ladrões, agressões, há de tudo. A
cidade cresceu. Precisa mudar. E precisa chegar tão cedo o Círio? Parabéns à
competência, mas o Círio é mais do que isso. É um ritual. A Santa passa, nos
descabelamos, choramos, pedimos, depois nos confraternizamos e esperamos o
almoço. Quem acompanha o Círio, também, espera chegar no final da manhã para
voltar para casa, tomar um bom banho e almoçar as comidas típicas. Parem de ser
tão modernos e competentes. Eu, distante, confortável, assistindo, preferia a
corda antiga, com dois lados, mas recolho-me à minha ignorância após as
explicações do engenheiro Charone. E Nazaré passa depressa, ao comando de
apitos, ufa ufa, vamos chegar cedo. Nada disso. Que chegue na hora em que tiver
de chegar e pronto. Círio começa quase uma semana antes, quando recebemos
parentes no aeroporto, saímos para festejar, Círio Fluvial, Arrastão do
Pavulagem, Trasladação, Chiquitas, Círio e almoço.
Neste
domingo, quando a multidão acabou de passar, desci à Presidente Vargas. Havia
um ar rarefeito no asfalto. Passara um tornado. O chão tinha uma mistura de
copos de plástico, papeis brilhosos, confete e algo difícil de explicar, talvez
resto de pele, resto de gente que passou ali pisando e repisando. Resto de
pensamentos, resto de energia. Ao lado, as mulheres de um coral se despediam.
Alguns garis se posicionavam, carros eram contidos por guardas e lá na frente,
ia aquela parede humana, acompanhando Nazaré. Ainda no dia seguinte a
Presidente Vargas ainda estava se recuperando. Como um vácuo. E já estamos com
saudade dEla. Até para o ano, Nazaré.
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