quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

SOB AS LUZES, À VISTA DE TODOS

Foi minha namorada que me fez notar a importância simbólica da cena que se passa diáriamente, no caso, específicamente quando escurece, na lateral do Teatro Cuíra. Um grupo que varia de seis a vinte lúmpens, despejados de uma casa na Riachuelo, onde funcionava, entre outras coisas, um laboratório de crack, decidiu morar na rua. Naquela esquina. E assim passa seus dias, vadiando, vendendo petecas de crack ignoradas pela polícia e com o dinheiro, comprando quentinhas e bebida, para incrementar a droga, o alcool, o sexo ao ar livre e até necessidades fisiológicas. Em qualquer circunstância, um ser humano vivendo nestas drásticas condições de vida, iria procurar becos escuros, meramente por constrangimento de ser visto daquela maneira. Não eles. Não em Belém. Não no Pará. Não no Brasil. Nossos lúmpens procuram exatamente o foco de um holofote com seu foco dirigido para a lateral do prédio. Ficam ali, como em um palco, seu palco, exibindo-se, não escondendo-se. Sob às luzes, à vista de todos. A mesma coisa acontece com os meliantes, os de colarinho branco. Alguém é descoberto. Há uma operação da PF com nome esquisito. Manchetes nos jornais. Fotos algemado, escondendo o rosto. Habeas corpus. Procrastinação do processo. E então, vem e se candidata a alguma coisa. Elege-se e a partir daí, passa a driblar, esconder-se da Justiça, em pleno foco, sob às luzes, à vista de todos. Em qualquer lugar do mundo, por mero constrangimento, aquele que rouba, foge, vai curtir sua grana em local não sabido e incerto. Ou sai de cena, tranca-se em casa, para curtir os milhões, mas sem sair, com mêdo de ser apanhado, ser vaiado por cidadãos enojados com sua presença. Não aqui. Aqui, sem acusar ninguém, por favor, todos saem em carros importados, gigantescos, passeando pela cidade, frequentando clubes, saindo em fotos que se repetem, domingo após domingo, as mesmas, nos mesmos lugares, nas mesmas páginas, em todos os jornais. Uma inversão total. Nós escondidos, com medo de sair de casa, onde ficamos guardados por grades, cercas elétricas, porteiros, vigilantes, alarmes, mas espera lá, essas coisas todas não são das cadeias, onde deviam estar os meliantes? De que lado estamos?

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