quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Só quer aparecer

Leio em uma matéria sobre a estréia do novo espetáculo de Marília Pêra e encontro a inimaginável Susana Vieira pedindo ao inimaginável autor de novelas Aguinaldo Silva, ser escalada para seu próximo trabalho. Nada de minissérie, disse a atriz. Quer novela, porque assim aparecerá todos os dias e precisa disso. Não esqueçamos que a figura em questão acaba de passar por um impacto fortíssimo em sua vida pessoal, por conta do gogoboy com o qual se casou. Susana quer aparecer. É dessas atrizes que nunca subiu ao palco. Sempre na tv, trabalho industrial, sem nenhuma nuance, nada, sempre a mesma pessoa, ela, claro. Minha namorada comenta sobre Tony Ramos no programa de Ana Maria Braga, mostrando-se, mais uma vez, pessoa íntegra que é. Tony quase não faz Teatro, mas quando o fêz, ganhou todos os prêmios. Atualmente está em cartaz ao lado de Glória Pires, em vários cinemas. Sucesso. Não consigo imaginar um par mais sem graça do que Tony Ramos e Glória Pires. E no entanto, são adorados pelo público da tv. São parte da família, digamos, de cada um. Nada se espera deles, como de Susana, a não ser o de sempre. Lembro de Tony fazendo um grego ridículo e no entanto, vida que segue. Fizeram suas escolhas, tudo bem. Mas isso me leva a pensar sobre um artigo que Robert Solé escreveu na Folha de São Paulo, alguns dias atrás, com o título "Tela Legal". Citou os irmãos Lumiére, que criaram essa tela brilhante e agora tudo está mudado. Antes, lembrem, para retratar pessoas, somente desenho ou pintura. Agora, podemos nos ver, em um filme. Podemos nos perceber em 3D como somos, o espaço que ocupamos, de outro ponto de vista. Já escrevi sobre isso. Como você se vê? Saiu um livro, ainda não publicado no Brasil, chamado Tela Global, escrito pelo filósofo Gilles Lipovetsky e o especialista em cinema Jean Serroy. Vão desde os Lumiére, cinema mudo, falado, tecnicolor e hoje, a eletrônica. A Nouvelle Vague na França, Free Cinema na Inglaterra e a indústria de Hollywood. O que temos agora? Pixels. A tela foi diminuindo. Como o rádio, que no começo precisou atingir milhões de pessoas de uma vez para ser viável, mas com o tempo, pode ser individual, a tela, também passou por isso. A Telosfera, digamos. A tela foi diminuindo, diminuindo, até ficar portátil. Hoje, tudo é tela. Elas nos acompanham desde antes de vir à luz, nas telas dos aparelhos de ultrassonografia. A tela transformou-se em intermediária entre nós e o mundo. Sabe essas lojas de equipamentos eletrônicos que deixam, na vitrine, uma tela e uma filmadora, de maneira a jogar ali a imagem de quem passa? A documentar nossa passagem. Documentar nossa existência. A garotada, hoje, fotografando sem parar, em seus celulares, enviando para Orkut. É preciso fotografar, filmar, para comprovar o que se vive no momento. E somos documentados. Milhares de câmeras de segurança estão nas ruas documentando, comprovando nossa existência. Lembram dos museus, onde, nas paredes, dormem, ou vivem, dependendo do ponto de vista, belíssimos quadros? E hoje, nos grandes magazines, quando passamos na área de venda de tv e vemos diversos quadros, móveis, aparelhos ligados em diversos canais. São os novos quadros? Ou seriam os quadros equações de números complexos, chamadas de fractais, mostrando-se em resolução permanente, criando imagens lindas? E quem somos nós, para as telas? Somos nós mesmos ou um sósia, nem isso, um outro, que criamos, e que passa as noites teclando com outros "outros", idealizados para gerar conversas, onde dizemos de tudo, protegidos por essa identidade falsa e mais do que tudo, por essa intermediária, a tela. Assim, protegemos nosso eu mais profundo? OU revelamos esse eu mais profundo? Susana Vieira é mais radical. Ela é dependente do brilho da tela, porque pretende iluminar, com sua figura, nossas vidas. Porque não vive sem isso. As entrevistas, escândalos. Na sua idade, mais de 60 anos, sem nenhuma condição física, submete-se ao ridículo de sair como madrinha ou vedete ou o que o valha em desfile de Escolas de Sambas, que mais adiante, outro dia, escreverei.

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