Será
que passou tanto tempo assim? As equipes trabalharam o dia inteiro. À noite,
liberaram a pista e todos os moradores desceram para pisar no asfalto, passear.
Os garotos como eu, de bicicleta, na
Presidente Vargas. Sem carros, sem paralelepípedos, o vento batendo no rosto em
disparada. O ano? Talvez os 60 tivessem começado. A Praça da República era meu
playground. Havia tempo de pião, peteca, cemitério e principalmente, tranca com
bicicleta, habilidade em que me tornei expert, com uma Caloi vermelha. A cidade
desfilava na frente do Edifício Renascença, onde a família morava. No carnaval,
desde cedo, passavam os malandros em paletós vermelhos, calça, sapatos brancos
e chapéus dos Boêmios da Campina. Era o máximo! No Dia da Raça, desfilava
garboso pelo Colégio de Nazaré, enfrentando o principal concorrente, Colégio do
Carmo. No térreo havia a Salevy, uma espécie de shopping nos dias de hoje. No
mês de dezembro, barraquinhas na calçada e a chegada do Papai Noel, de helicóptero.
O “Buraco” era um senhor que fazia as vezes de “bom velhinho”. Chegava cedo e
ia para o último andar. Depois, ia descendo, entrando nos apartamentos,
atirando bombons para a multidão lá embaixo. Chegou em casa. Meu irmão mais
velho veio informar: Papai Noel conhece o papai. Até pediu uma dose de whisky!
Papai Noel bebe? As férias eram no Lago Azul ou Mosqueiro. Hoje, o Lago é um
condomínio de luxo, cercado por conjuntos habitacionais de baixa renda. A
cidade engoliu, aquilo que achávamos distante. E o Mosqueiro antes da ponte?
Todos iam no Presidente Vargas, navio de construção holandesa, que navegara
antes no Mediterrâneo. Será? A aventura começava no Galpão Mosqueiro Soure e
terminava com vaias e aplausos da juventude que se divertia na Vila. Havia carregadores
como o “Sete” e carros ingleses de aluguel que levaram as famílias. Cecy era um
deles. A energia elétrica ia até dez horas da noite. Depois, na base do
candeeiro. De dia, praia, papagaio para cortar e aparar, “jacaré” em pranchas
de madeira, varinhas entalhadas, bolas de seringa e picolés de Karo. Biá, que
nos criou, me levava para assistir ao seriado de Billy Elliott, no Paramazon,
cinema que ficava na Piedade, com cadeiras de madeira e ventiladores. Ia pela
rua com meu chapéu, revolveres abastecidos de espoleta e voltava cansado,
esbaforido e sem munição. Havia o Olímpia, onde assisti “Woodstock” “A Piscina”
e “Romeu e Julieta”. Também era Palácio, palco de grandes emoções, romances e
inspiração. Era uma sexta feira gorda de carnaval e passava “McBeth”, de
Polanski, dez da noite. Inesquecível. Os bailes eram sempre lotados. A garotada
com olhar de lobos famintos ficava em volta, assistindo as meninas passarem
cantando marchinhas. Aos domingos havia a “pipoca dançante”, até as dez. Tão
cedo! Alguns dançavam a noite toda. Outros, bebiam. Havia os que ficavam
pensando, matutando, planejando a abordagem e quando se decidiam, acabava a
festa. Dançavam juntos. Rosto colado era começo de compromisso. E tudo
acontecia na Presidente Vargas. Em frente ao Palácio do Rádio, havia o Vesúvio,
a mais famosa mercearia da cidade. Ao lado, uma barbearia clássica, espelhada,
cadeiras niqueladas, barbeiros de bigodões e a nossa eterna perlenga para nos
deixarem crescer os cabelos. Ainda peguei Alberto Mota e Orlando Pereira com
seus grupos, os Namorados Tropicais e Sayonara. Agora, além das novelas da
Rádio Clube, principalmente “Jerônimo, o herói do sertão”, havia a Tv
Marajoara, onde assistíamos Os Intocáveis. Bem, às vezes, após muita
argumentação, permitiam que assistisse, por conta da idade. Coisa chata.
Nequinho e Alecrim eram os dois palhaços. O já saudoso Armando Pinho. Cláudio
Barradas e as novelas. Os comerciais. Pierre Show, Pierre Show, Pierre
sensacional! Como era bom. A Copa do Mundo no Chile passou depois em película,
patrocínio do Banco Novo Mundo. Meu avô me adorava. Quando me dei por gente,
ele já não era o tycoon que havia sido. Me chamava de sua “miniatura”, por eu
ser baixinho, magro e cabeçudo. Andava do Renascença ao Palácio do Rádio
cumprimentando e sendo cumprimentado. Depois, meu pai faria o mesmo. Hoje, eu.
Será que passou tanto tempo assim?
4 comentários:
Amigão,
eu era o locutor-mirim da "Hora do Garoto Sabido", transmitido todos domingos, às 9 horas diretamente do mini-auditório da Aldeia do Rádio do Jurunas, sob o comando de Mário Barradas - misto de radio-ator e animador-, sob o patrocínio das Perfumarias Myrta S.A, fabricante do inigualável sabonete Eucalol.
Muito bom o seu comentário;
Alô Bern, alô
Fora do contexto::Por que não configura sua layout,as letras brancas entram em constraste com a pagina preta, embaralhando a visão?
Sinto uma excessiva sensibilidade no tocante ao seu passado.Vive uma nostalgia boa, por que foram tempos primorosos. Felizes e único.
Ma s como sempre um mundo muito diferente do comum.Até sue Papai Noel consegue ser , totalmente diferente a visão(imaginável) de outras crianças. Vem de helicoptero e toma wisk.
E o Mosqueiro ficou feio com o conjunto de baixa renda.?
Postar um comentário