sexta-feira, 22 de março de 2019
6.5
Meu
amigo Marcos Quinam costuma dizer que “os de 24 são foda!”. Fazemos aniversário
juntos. Durante a adolescência, tive vergonha de ter nascido nesse dia. Vocês
sabem, é uma fase em que muitas mudanças acontecem, descobertas e o bullying é
forte. Poxa, meu pai poderia ter adiado um dia, ao menos. Quem nasce dia 24 é
viado, com certeza, a palavra assim escrita. Em muitos lugares, por minha
própria conta, aumentava esse dia para 25, por exemplo. Esse número, por conta
do Jogo do Bicho, até agora a perturbar as pessoas. Quando virei adulto, passei
a ignorar. Até a dizer sem me perguntarem. Foda-se. Mas na adolescência, colégio
somente para meninos, tudo era motivo para bullying. Qualquer gesto mais leve,
uma palavra mal colocada e pronto. Todos em momento de afirmação total e
alguns, creio, certamente os mais incisivos, escondendo suas reais preferencias.
Meus filhos, na pré adolescência, certa vez, revoltados com um brinco que
estava experimentando na orelha, aproveitaram um descuido e “chinaram” com o adorno.
Hoje são cheios de brincos e tatoos. Meus poucos amigos gays são os melhores.
Além do talento e caráter, são cheios de humor, ironia e inteligência para o
pensamento veloz, com uma abrangência de conhecimento genial. Isso tudo, de
menos. E o que dizer de completar 65 anos? Já li dizerem “ah, eu nunca pensei
chegar a essa idade”. Meus ídolos, Caetanos, Beatles, Stones, todos com dez
anos acima. Meus discos preferidos comemoram 50 anos de lançados. Divido com os
filhos calças, camisas, livros e música. Apesar de não ouvir nada interessante
nos novos artistas, acabei de descobrir Royal Trux. Procurem. Leio sem parar e
aguardo o lançamento de minha nova obra. É chato, mas mesmo no grupo de
peladeiros acima de 50 anos, já sou veterano. As dores nos joelhos já me
provocam uma dolorosa despedida dos campos. Não haverá público para a volta
olímpica, nem programas de tv com melhores momentos. Apenas não irei jogar, com
imensa tristeza. No mais a alegria de estar vivo e produtivo. Uma vez, com
Jocelyn Brasil, na época, mais de 90 anos, no carro, olhamos para uma menina
bonita que passava. Ele me disse, apontando para a cabeça “aqui tem apenas 15
anos!”. Poderia dizer que os livros me deram o melhor, mas creio que foi o
Teatro que me fez gente. Comecei tímido, nem ia aos ensaios. Foi com Cacá
Carvalho que veio a reflexão sobre o que desejava dizer e mais inda, os
processos de montagem, a harmonia de um coletivo, o exercício da humildade e a
certeza de trabalhar para o bem comum. Já sou avô e aguardo mais um ou dois
anos para “tomar” o neto de seus pais e sair por aí de mãos dadas, como um
acordo íntimo, diria Fernando Pessoa, abrindo os caminhos, como meu avô Edgar
fez comigo. Meu Deus, 65 anos, um ancião! Meu pai se aborrecia quando lia em
jornal “um ancião de 60 anos”.. Eu também. Eu também. É chavão, sei, mas olho
para mim, no espelho do banheiro. Não aquele todo em que passo o aparelho de
barba, mas procuro dentro dos olhos, aquele moleque que corria da mãe em volta
da mesa de jantar, fugindo de uma chinela certeira, nunca esquecendo de duas
frases que me acompanham o tempo todo. Perguntei a meu pai, um dia, o que ele
gostaria que eu fosse. Ele me disse que queria que eu fosse um homem bom. Só. E
tudo o que isso representa. Quanto a mim, não importam prêmios, medalhas,
cargos, nada disso importa. Serei sempre o kuí de farinha de minha mãe Celeste.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário