sexta-feira, 5 de junho de 2015

EU QUERIA SER ANDRÉ MIDANI

André Calixte Haidar Midani é sírio, estava na Normandia, criança, durante a invasão dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, correu mundo e chegou ao Brasil para trabalhar na gravadora de discos Odeon. Era o estertor dos cantores de dó no peito e capas horrorosas. André lançou João Gilberto. É pouco? Nos anos seguintes, foi para a Polygram onde arregimentou um cast que contava com Caetano, Gil, Chico, Gal, Bethania, Raul Seixas, Alcione e muitos outros. Não era o diretor artístico, mas cuidava da promoção e do dinheiro. Lembram do Phono 73? Era uma época dourada, onde se visava mais o artista que o hit. O primeiro disco era uma apresentação, o segundo uma afirmação e no terceiro, vinha o sucesso. André frequentava rodas de samba, encontros nas casas. Trocava idéias, fazia um meio de campo perfeito porque era criativo, inteligente, esperto, totalmente diferente dos engravatados que ainda sobreviviam. Havia o boato que Chico e Caetano eram brigados. Fez os dois gravarem disco ao vivo e lembro que foi hit do verão. Topou o desafio de Caetano e lançou “Araçá Azul”, recorde em devolução por parte dos lojistas. Era um disco experimental, não comercial. E então passou para a WEA, em parceria com americanos donos da Warner, Elektra e Atlantic. Eu começava a trabalhar em rádio. Uma época em que divulgadores chegavam com caixas contendo 25 elepês, a maioria internacionais. Vinham Crosby, Stills, Nash & Young, Fleetwood Mac, Bad Company, Creedence Clearwater Revival. A EMI e Polygram iam mais nos ingleses. Uma festa. Difícil arranjar tempo para ouvir tudo que chegava. Mas o mundo pop brasileiro estava mudando e já aparece André Midani lançando Baby e Pepeu, Guilherme Arantes, Frenéticas, a Cor do Som e principalmente o Gilberto Gil de “Palco”. Midani também teve a idéia de juntar Caetano, Gil e João Gilberto no disco “Brasil”, que quase não saía, tamanhos os gastos e as maluquices de João. O país mudava, ouvia mais música internacional e os artistas locais eram reverenciados por uma juventude que agora comprava os discos e os ouvia por um bom tempo, conferindo três a cinco sucessos por trabalho. Uma época em que a capa dos discos eram algo artístico, lindas, onde demorávamos o olhar, desvendando seus segredos e informações. E lá vem André Midani, contratando Nelson Mota e Pena Schmidt, que correram mundo atrás dos novos artistas brasileiros. Titãs, Ira, Lulu Santos, Ultraje a Rigor, Kid Abelha, constituindo outro boom nos anos 80. Junto, veio o cd que acabou com a qualidade das capas. Veio a pirataria, que primeiro acabou com as vendas de cassete e mais tarde, do disco. E vieram os business men, pouco interessados na qualidade e novidade na obra dos artistas. Veio a busca incessante do hit. E veio a internet, o download e o mundo, de repente, virou de cabeça para baixo. A essa altura, Midani já estava em New York, top of the list, mas sofrendo com as mudanças. O livro “Do Vinil ao Download”, é um relançamento, pois foi originalmente lançado em 2008. Agora, teve uma atualização e principalmente, foi transformado em série que foi mostrada no canal fechado GNT. Passei a vida inteira no rádio, ouvindo música, percebendo as transformações. Agora imaginem estar no centro, no olho do furacão, enfrentando de peito aberto e mente esperta tudo o que aconteceu. Midani lamenta as mudanças, porque a arte perdeu e o negócio música venceu a música que era negócio. Já pensou conviver com todos esses artistas e idéias? Eu queria ser André Midani.

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