sexta-feira, 30 de agosto de 2019
O BRASIL NÃO CONHECE A AMAZÔNIA
Há
muito tempo, quando trabalhava em rádio e estava no Rio de Janeiro, conversando
com dirigentes de gravadoras de discos, me irritava quando perguntavam se eu
era da Amazônia ou estava na Amazônia. Achavam, certamente que eu deveria ter
traços indígenas mais fortes e talvez alguma ignorância do “mundo dos brancos”.
Quando pela primeira vez, na França, Saint Malo, diante de grande plateia,
juntamente com dois outros grandes escritores brasileiros, precisando falar de
minha obra, compreendi o quanto estava distante e o quanto havia de
desconhecimento sobre minha terra. Os dois escritores, um falou sobre sua obra
em São Paulo e o outro, situando seu romance no Rio de Janeiro. Eu pensava no
que dizer. Afinal, talvez esperassem as praias, samba, mulatas, carnaval,
Salvador, Copacabana, sei lá. Eu senti o que é ser um amazônida, como um
General Custer, cercado pelos sioux. Comecei dizendo que ao contrário de meus
colegas, que eram de um Brasil mais fácil de reconhecer, eu vinha de outro
mundo, e ainda assim, tão Brasil quanto eles. Venho da maior floresta tropical
do mundo. Venho de uma selva de concreto plantada pelo homem no meio da
floresta. Da janela da minha casa vejo o outro lado do rio e aquele verde
imenso. Falo da perplexidade do homem que sai de seu casebre, à beira do rio,
atravessa e desembarca em uma floresta de concreto, com máquinas por todos os
lados. Talvez seja difícil de acreditar, mas temos os mesmos confortos que
vocês têm aqui. Assisto a todos os campeonatos de futebol na Europa. A
internet, os telejornais, sabemos de tudo ao mesmo tempo, sem atraso. Mas somos
insulares. Para visitar nosso vizinho mais próximo, Maranhão, Amazonas,
Tocantins, é preciso pegar um Boeing. Para visitar nossas maiores cidades, ou
pegamos um Boeing ou vamos pela estrada, oito horas, ou no barco, dois dias.
Nos maiores centros, muitos acham que o Pará fica no nordeste. Que a capital é
Fortaleza. Para eles, Amazônia é aquilo verde no mapa, que a moça do tempo diz
que joga água neles. Ou técnicos inventam hidrelétricas gigantescas, pouco se
importando com os fatores sociais que geram. Alguns fazem fortunas. A maioria
esmola. O Pará é o Estado potencialmente mais rico do Brasil e economicamente
um dos mais pobres. Fornecemos imensas riquezas e por contratos espúrios, ficamos
com um quase nada. Há muita cobiça, violência, roubo valendo-se de um espaço
tão grande que ninguém consegue fiscalizar. Dois, três helicópteros para aquilo
tudo? E a madeira apreendida, serve para quê? E como somos insulares,
precisamos criar tudo. Nossos artistas em todas as áreas são geniais. Passamos
mais de vinte anos onde apenas alguns conseguiram vencer a bolha. Foi somente
ao ganhar um prêmio na França que jornais do Rio e SP se interessaram em
avaliar meu trabalho. Acontece com todos os outros. Agora, essa questão das
queimadas, tão antiga, mas que voltou ao noticiário por conta de ações do
presidente que irritaram alguns. Sting, o músico, fez vários shows cuja renda
era para uma ong de apoio à Amazônia. Nunca vimos esse dinheiro. Noruega,
Alemanha, dando dinheiro para estudos. Amazônia, celeiro do mundo. A Amazônia
como uma coisa. Aquilo lá. Nunca sentiram nossa umidade. Nunca olharam para o
céu e não o viram, coberto pelas copas das árvores. No Brasil de hoje, há muita
coisa errada, certa e uma multidão de “inocentes” querendo se dar bem. Nào
tenho preparo técnico para discutir, mas a verdade é que não sabem o que é
Amazônia.
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