sexta-feira, 3 de maio de 2019

DÉLI, DALI OU DAQUI

Nova Déli, ou simplesmente Déli, não é uma cidade que pretendo conhecer. Apesar da belíssima cultura indiana, há muitas outras cidades onde gostaria de visitar. Li há algum tempo, uma espécie de livro reportagem onde um indiano, após morar e estabelecer família nos EUA, decide voltar para mostrar aos filhos seu local de origem. Fica chocado com a realidade, após muitos anos em outra cultura. Atraído pelo título e por gostar de filmes“ policiais, decidi assistir “Crimes em Déli”, na Netflix. Fui até o fim dos oito capítulos. Prendeu-me, sobretudo, a cultura diferente. A mistura do novo e do velho.
Um casal sai do cinema, pega um ônibus independente (aqui em Belém há alguns) e é espancado e estuprado por seis homens. Jogados do veículo, nus, feridos, são socorridos. O rapaz, apenas escoriações. A moça, além de pancadas, foi mordida e estuprada com um cano de ferro. Não digo mais por chocante. A chefe de Polícia assume o caso com seus homens. Déli é uma megalópole com 17 milhões de habitantes. As autoridades falam inglês, mas o povo fala hindu. Há vários outros dialetos. Há diversas religiões tentando conviver. As diferenças sociais são absurdas. A filha da chefe de polícia estuda em um colégio inglês, com uniforme que inclui até gravata. Outras pessoas amontoam-se pelas ruas. As casas pobres não têm portas e são, realmente, escombros. A sujeira está em toda parte. O trânsito é caótico. Não há, aparentemente mão e contra mão. Para pior, a mão é inglesa, ou seja, direção no lado direito. Todos usam abusivamente o celular e claro, como é cinema, as ligações são imediatamente atendidas. Há quem coma sentado no chão e com as mãos. Mas há quentinhas e restaurantes chiques. Creio que as últimas afirmativas lembram claramente a nossa Belém de hoje, não?

Pois bem, o crime chega à imprensa e uma mobilização popular faz com que até o Primeiro Ministro interfira. Realmente, nos últimos anos, casos de estupro coletivo têm sido, infelizmente, constantes. No entanto, ao novamente comparar com Belém, onde a vida não vale mais do que vinte reais, fico espantado com a revolta de todos contra um ato isolado, acostumado que estou a banalizar assassinatos à luz do dia, em qualquer lugar, por motoqueiros que ao finalizar o serviço, saem tranquilamente, certos que nada lhes acontecerá. Os policiais civis de lá trabalham 24 horas, sem direito à hora extra e costumam ver as famílias duas vezes a cada três meses. Não usam armas. Não usam algemas. Seguram firmemente as mãos dos presos que, dóceis, seguem para a prisão. A polícia vai, um por um, prendendo os culpados. O respeito à lei e aos homens da lei parece total. Mais que tudo, o respeito às mães. Um dos estupradores consegue fugir mas estanca, ao ouvir que o policial iria contar tudo para sua mãe, que finalmente saberia o filho que tinha. Entrega-se. Um deles, na prisão, suicida-se, por conta da lembrança da mãe. Mulheres como investigadoras, todas usando aquelas roupas indianas, são comuns. Enfim, são todos enforcados. Sim, há pena de morte na Índia. Outro choque entre a modernidade e a cultura milenar está no casamento. Há que ter dote. Há quem anuncie nos classificados ter uma filha para casar. Mas há quem se apaixone e tudo bem. Talvez a colega Dominik Giusti, que esteve por lá, possa contar e explicar mais. Não quero ir, mas sinto que, no momento, com todos os problemas, Déli é melhor que Belém.

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