Um
casal sai do cinema, pega um ônibus independente (aqui em Belém há alguns) e é
espancado e estuprado por seis homens. Jogados do veículo, nus, feridos, são
socorridos. O rapaz, apenas escoriações. A moça, além de pancadas, foi mordida
e estuprada com um cano de ferro. Não digo mais por chocante. A chefe de
Polícia assume o caso com seus homens. Déli é uma megalópole com 17 milhões de
habitantes. As autoridades falam inglês, mas o povo fala hindu. Há vários
outros dialetos. Há diversas religiões tentando conviver. As diferenças sociais
são absurdas. A filha da chefe de polícia estuda em um colégio inglês, com
uniforme que inclui até gravata. Outras pessoas amontoam-se pelas ruas. As
casas pobres não têm portas e são, realmente, escombros. A sujeira está em toda
parte. O trânsito é caótico. Não há, aparentemente mão e contra mão. Para pior,
a mão é inglesa, ou seja, direção no lado direito. Todos usam abusivamente o
celular e claro, como é cinema, as ligações são imediatamente atendidas. Há
quem coma sentado no chão e com as mãos. Mas há quentinhas e restaurantes
chiques. Creio que as últimas afirmativas lembram claramente a nossa Belém de
hoje, não?
Pois
bem, o crime chega à imprensa e uma mobilização popular faz com que até o
Primeiro Ministro interfira. Realmente, nos últimos anos, casos de estupro
coletivo têm sido, infelizmente, constantes. No entanto, ao novamente comparar
com Belém, onde a vida não vale mais do que vinte reais, fico espantado com a
revolta de todos contra um ato isolado, acostumado que estou a banalizar
assassinatos à luz do dia, em qualquer lugar, por motoqueiros que ao finalizar
o serviço, saem tranquilamente, certos que nada lhes acontecerá. Os policiais
civis de lá trabalham 24 horas, sem direito à hora extra e costumam ver as
famílias duas vezes a cada três meses. Não usam armas. Não usam algemas. Seguram
firmemente as mãos dos presos que, dóceis, seguem para a prisão. A polícia vai,
um por um, prendendo os culpados. O respeito à lei e aos homens da lei parece
total. Mais que tudo, o respeito às mães. Um dos estupradores consegue fugir
mas estanca, ao ouvir que o policial iria contar tudo para sua mãe, que
finalmente saberia o filho que tinha. Entrega-se. Um deles, na prisão,
suicida-se, por conta da lembrança da mãe. Mulheres como investigadoras, todas
usando aquelas roupas indianas, são comuns. Enfim, são todos enforcados. Sim,
há pena de morte na Índia. Outro choque entre a modernidade e a cultura milenar
está no casamento. Há que ter dote. Há quem anuncie nos classificados ter uma
filha para casar. Mas há quem se apaixone e tudo bem. Talvez a colega Dominik
Giusti, que esteve por lá, possa contar e explicar mais. Não quero ir, mas
sinto que, no momento, com todos os problemas, Déli é melhor que Belém.
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