quinta-feira, 1 de novembro de 2018

DEMOROU

Com os ânimos exaltados que vivemos estas vésperas de uma eleição para presidente, quase deixamos de lado a felicidade de termos anunciada a ampla vitória de Helder Barbalho para o governo do Estado, que significa, em um horizonte mais imediato, a derrota de uma criatura que por mais de vinte anos nos humilhou, destroçou, escarneceu, prejudicou a carreira de uma geração inteira que nunca pôde desenvolver seu trabalho de maneira ideal, convivendo com uma espécie de apartheid que nos deixou à parte dos teatros e, principalmente, à parte do próprio público paraense, que passou a nos desconhecer e a nos espetar a marca de cafonas, sem talento, ruins, apregoada, exatamente, desta figura amaldiçoada que nos deixará, enfim. Sei perfeitamente que já houve uma vitória. Festejamos, curtimos e no entanto, o partido que tanto acenou para a Cultura como cúmplice, utilizou o cargo para eleger político seu, dando-nos bananas, talvez, nem isso. Quando o nefando reassumiu o cargo foi com ainda maior desprezo. Fora os métodos suspeitos utilizados na votação, fomos todos derrotados. Seremos auto destrutivos? Procuramos por todos os meios abafar nossas manifestações culturais? Somos artistas, de várias artes, com todas as condições de vencer, influenciar os paraenses, fazer valer nosso trabalho, ou em fim de contas, pouco antes do sucesso, fazemos de tudo para que tudo desmorone? Não queremos esmola. Dá um dinheiro aí. Queremos que o Estado fomente a criação de mercados culturais em suas várias áreas. Queremos os espaços abertos para mostrar nossa arte. O fomento é uma obrigação, já que de um lado, o Estado deve prover de todos os instrumentos aos artistas para que possam alcançar, com seu trabalho, todo o povo paraense. Por outro lado, cabe ao Governo, também, dar ao povo paraense toda a condição possível para que desfrute dessa Cultura. Durante mais de vinte anos, o interior do Pará viu a Cultura ser tocada como se fosse municipal, apenas para Belém, com um ou outro mimo, por motivo político, indo para outras cidades. Somos um Estado com tamanho de País e não nos falamos. Alguns de nós escaparam e brilharam lá fora, mesmo antes de conquistar seu povo. Impossível desdenhar do belo trabalho feito pelo Conservatório Carlos Gomes, iniciado lá atrás por Glória Caputo. Mas gastar milhões para plateias de mil pessoas, cada vez, por quatro ou cinco vezes, apenas? Então que as óperas, com elencos inteiramente locais percorram cidades pólo, mostrando-se a todo o Pará. Hoje, nosso melhor teatro está sendo mostrado em casas de cultura, palcos improvisados, para plateias com no máximo 40 pessoas. A que ponto chegamos. Artistas como cristãos na velha Roma, reunindo-se nas catacumbas. Muitas das nossas estrelas foram para a carreira acadêmica, sobrevivendo, formando pessoas (para quê, ou para quem?) e se ausentando das nossas vistas. Sim, o “tá ruim” vai embora. Vai deixar o castelinho que inventou na antiga residência governamental. Talvez os artistas voltem a ocupar os corredores de sua antiga casa, a Fundação Tancredo Neves, hoje com outro nome. Amigos me contam que começaram a ser bem tratados, muito bem tratados, por quem, até pouco tempo, as desconheciam. Muito engraçado. Há muito trabalho a ser feito. Começar do zero. Vai ser preciso paciência. Refazer. Repactuar. Mas tudo de maneira profissional, pensando em todas áreas, pensando em todo o Pará. Não sei quem virá, mas no mínimo, será alguém novo para discutir. Espero que o tá ruim nunca mais volte para nos assombrar. Será esquecido ou lembrado como maldição. A escuridão está indo embora. Que bom que ainda estou aqui para ver. Demorou.

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