Salomão
Laredo é de Cametá, Agildo Monteiro é de Colares, Lucio Flavio é de Santarém, André
Nunes é de Altamira. Quanto a mim, nasci em Belém e minha vida inteira foi na
cidade, embora a essa altura, já conheça algumas cidades do interior do Estado.
Isso influenciou muito minha vida de escritor. Praticamente tudo o que escrevo
tem esse tom urbano, meio “Selva Concreta”, como intitulei um de meus livros.
Uma selva de concreto plantada, imposta sobre a imensa selva amazônica. Pelo
clima, tenho certeza que, se dependesse da natureza, não estaríamos aqui.
Quando encontro esses amigos, vira e mexe, o assunto vai para suas vivências. É
como se tivessem duas vidas, uma a infância e adolescência nesse interior e
agora, adultos, na cidade grande. E essas memórias são riquíssimas. Quando
contam, sentimos os cheiros, o vento batendo nas árvores, a chuva abundante, as
pescarias e as pessoas no seu dia a dia. Agildo Monteiro me disse,
recentemente, que enquanto queremos, um dia, morar em Paris, Lisboa, Miami, sei
lá, ele daria tudo para voltar a Colares. Essas cidades e toda a vida que lá
tiveram está marcada, impregnada em seus corpos. As cidades, embora pequenas,
até pobres, criam tamanho e importância, porque eram suas cidades, seus afetos,
seus amores.
Gosto
muito de conversar com André Nunes. Ele foi amigo de meu pai e agora, dos
filhos. O ateu e comunista mais religioso e fraterno que conheço, se religião é
espalhar o amor e a compreensão. Mora em um paraíso, o famoso Restaurante da
Terra do Meio, com um açude ou igarapé que parece delicioso. E como gosta de
contar suas histórias! Quando se olha para o relógio, o tempo voou. Ao relógio,
não dá nenhuma importância.
Depois
dos 60 anos, resolveu escrever e contar um tanto do que viu em livro. Saiu
“Xingu”, de crônicas e causos. Depois, “A Batalha do Riozinho do Anfrísio”, “A
Agenda do Velho Comunista” e agora “Minha Doce Puta”. Todos os fatos e
acontecimentos de uma vida cheia de detalhes mirabolantes, com alma paraense e
amor pelo interior. Estudioso de nossa história, não há nada que não conheça e
possa explicar. A memória de sua adolescência e homem jovem, com os amigos, que
no momento mais importante, não lhe faltaram. Junto com um amigo, pensou,
meramente para passar o tempo, em uma Estrada para ligar Altamira ao mundo.
Melhor, primeiro, até Santarém. Um piauiense arretado ouviu a idéia e espalhou.
Imagina, é só para passar o tempo, nada sabemos disso. O cara trouxe do Piauí
três irmãos, mais as famílias. Arranjaram uma grana. Paga só o do sustento e
depois queremos um terreno pra nossa casinha. E foram desmatando. Sumiram.
Alguém foi atrás. Avançavam. No muque. Mas como acertam o rumo se nem bússola
têm? Guiavam-se pela passagem do avião da Paraense, diariamente. Sumiram. Foram
procurar. Pena, estavam crivados de flechas. Uma tribo não percebida. Que
história! A essa altura, todos respiramos fundo, tomamos um trago de nossas
bebidas, alguém vai ao banheiro, passa o garçom perguntando que querem algo,
enquanto todos rememoram em suas mentes, recriam com suas imagens, tudo o que
foi contado. Há algo de mágico nos contadores de histórias. Na melodia do
falar. Nas pausas que ninguém ousa quebrar. Na tônica certa, como dois pontos,
fazendo-nos aguardar, enquanto ele molha os lábios na bebida, continuar. No
olhar denunciando as intenções das falas. No corpo que se agita e torna a se
comportar. Uma mágica. André Nunes, tem. Quanto ao título do livro, “Minha Doce
Puta”, mais uma história fantástica, que pode ter acontecido com qualquer um de
nós, adolescentes nos anos 60, deixo para lerem quando for lançado, dia 12 de
setembro, na Livraria Fox, com bate papo entre André e Lúcio Flavio Pinto,
autor do prefácio.
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