Estava ouvindo mais jazz do que outra coisa. Tinha até
um programa, “Jazzmania”. Meu filho mais velho voltou de uma viagem e me
apresentou Nirvana. Voltei ao rock and roll. O som pesado, com riffs, refrão
melodioso e a voz de Kurt Cobain. Poucos discos depois, o suicídio. Da banda,
apenas Dave Ghrol seguiu e faz muito sucesso. Christ Novoselic revelou-se
apenas um baixista normal, chegou a gravar disco solo e parou. Acabo de
assistir “Montage of Heck”, documentário sobre a vida de Kurt Cobain, recheado
de imagens inéditas, gravações e detalhes que afinal explicam os
acontecimentos. Ele seguiu outros grandes artistas como Jimi Hendrix, Jim
Morrison e Janis Joplin, falecendo aos 27 anos. Foi uma pessoa cheia de
problemas, o principal deles, o sentimento de rejeição. Os pais separaram e ele
passou a infância e adolescência de uma casa para outra. O rock foi uma bela
válvula de escape. Era um grupo underground e de repente, um estouro mundial,
multidões nos shows, vendas milionárias e principalmente, um holofote sobre sua
vida. Penso sobre a razão de ninguém, com um mínimo de responsabilidade, ter
interferido no que parecia um caminho direto para a morte, a libertação dos
problemas. Penso que se o sucesso não tivesse acontecido, ele poderia conviver
melhor com suas deficiências. Mas temos fome. Queremos devorar os artistas.
Mergulhar no seu íntimo. Encarcera-los à vista do mundo. Eram jovens, porra
loucas como muitos jovens sem a presença da família, pobres que viraram
milionários. A mulher, Courtney Love. Kurt sentia dores terríveis no estomago.
Veio o vício da heroína. Veio a filha, Frances. Boatos de drogas na gravidez
fizeram com que perdessem a guarda da menina. As letras das músicas eram gritos
pedindo socorro. Ao invés de repeti-las com enfado a cada show, serviam como um
desabafo. Se o público soubesse o que estava em jogo! Ninguém parece ter se
aproximado para cuidar desse rapaz, brilhante, bonito e suicida. Que pena.
Transformou-se em um mártir do sucesso.
O mesmo caso, por outras razões, é Nina Simone.
Assisti a “What happened Miss Simone”. Sofreu com o racismo. Venceu como
pianista e cantora de jazz. Mas vieram os protestos, Martin Luther King, a luta
pelos direitos dos negros e ela engajou-se. Anos 60. Mudou o repertório. Ficou
séria. O marido, seu empresário, a explorava e não gostou da mudança do
repertório. Dava-lhe surras. Ela tinha medo dele. Também tinha uma filha. Teve
um colapso psicológico. Parecia sempre aborrecida, séria demais. Naquele tempo,
eu era muito novo para compreender. Seu rosto fechado, as músicas, não me
atraíram. Resolveu morar na Libéria, sozinha. Fez muitas ações beneficentes. O
dinheiro acabou. Os alemães a receberam e ela voltou a cantar para grandes
plateias. Mas ninguém foi ouvir a mulher. A pessoa. Suas carências. A revolta
contra a sociedade. Morreu pouco depois. Muito cedo.
Os mártires do sucesso. São devorados. Gente jovem,
pobre, problemas familiares, mas com imenso talento. A mídia, nós, os
devoramos. Ofertas de todos os lados os deixam tontos. Amores pagos, drogas
pesadas, vontades realizadas e muito trabalho. Dia e noite e a pressão por dar
sempre tudo de si. E quando morrem, ainda queremos comprar gravações deixadas,
aquilo que não queriam que ninguém ouvisse. Morreram e continuamos querendo
mais. Os mártires do sucesso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário