Extrema é uma cidade com uns 30 mil habitantes, na
divisa entre Minas Gerais e São Paulo. Era um entreposto comercial que aos
poucos ascendeu a município. Enriqueceu quando indústrias se instalaram,
gozando de isenções fiscais de um Estado, e tendo outro para vender. É uma
cidade limpa, sem pichações, com população tranquila e aparentemente preocupada
com a beleza. Há muitos salões anunciando diversos procedimentos. Na praça
principal, há uma bela igreja que a todo
instante toca seus sinos. Apesar de não ter uma livraria sequer em um raio de
50 quilômetros, realizou pela segunda vez sua Feira Literária, mercê do esforço
de alguns abnegados, comandados por Marcelo Spomberg, que conseguiu levar até
lá um grupo seleto de escritores brasileiros, tendo como tema “A violência na
Literatura”. Chego de madrugada a São Paulo. Um homem vem e me pergunta se sol
Ariovaldo. Volta mais tarde e desculpa-se. Era a mim que buscava. Gabriel é
alto, gestos largos, origem italiana. Dentista, gosta de música, pensa em
escrever, mas está feliz em participar da iniciativa. Em Extrema, Júlio
trabalha na Secretaria de Cultura. A seu lado, uma moça bem jovem, não lembro o
nome. É cantora. Não, não está na programação. Canta rock. Na praça, há um
palanque onde estudantes disputam um “soletrando”. Ao lado, tendas abrigam
livrarias, contratadas especialmente. Seu Toninho é dono da Queenbooks. Está lá
para colaborar. Levou todos os meus livros e dos demais companheiros para
vender. Seu Toninho é muito legal e me faz bom desconto nos livros. Aparecem
professores pedindo que escreva alguma coisa nos meus trabalhos. Há shows
musicais, teatro infantil e oficinas de literatura na programação. A primeira
mesa fala sobre Rubem Fonseca. Cadão Volpato, que foi líder da banda Fellini,
nos anos 80 e promete uma volta breve, é o excelente mediador. O professor
Ariovaldo Vidal, que tem livro sobre o recluso escritor carioca e Paula
Parisot, escritora e performer, sua amiga, dão um show. Vamos todos almoçar em
um restaurante tipicamente mineiro. Na volta, Ilana Casoy debate com o
psiquiatra forense Guido Palomba “Violência: ameaça real e silenciosa”. Ele é
teatral. Ela é certeira. Por pouco não vão às vias de fato. Cadão teve
trabalho. Ilana me contou que o verdadeiro assassino das crianças emasculadas de
Altamira está preso em São Luiz, por outro delito. Confessou a ela detalhes de
cada criança vitimada. Quanto ao médico que está preso, é inocente. No sábado,
dividi com Marcelino Freire, a mesa “Realidade e outras emoções”. Marcelino é
um dos grandes escritores brasileiros. Após outro restaurante mineiro,
assistimos Reinaldo Moraes e Raphael Montes debateram “Literatura escrita com
sangue”. Reinaldo é quase um mito em SP. Raphael trabalha em roteiros na Globo.
Em seguida, Lourenço Mutarelli e Beto Brant conversaram sobre “Cinema
Adaptado”. Mais tarde, no cinema da cidade, “Muta” assiste pela enésima vez seu
“Cheiro de Ralo”. Todos os escritores na plateia onde uma garrafa de whisky
circulava. A noite foi longe, juntamente com a galera da cidade, na praça, festejando
sua noite de sábado. Tão pequena, tão simples, Extrema realiza essa Feira
porque acredita na Cultura. Lembrei de Belém e da nossa FLiPa. Gente fazendo
força pela Literatura. Há sempre idealistas por aí, lutando sozinhos contra a
maré braba da cretinice orgulhosa.
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