Era um dia de meio de semana,
em pleno julho. Os pais foram para Belém resolver alguma coisa. A ordem era não
sair de casa, nem para a praia. Depois do almoço, aproveitando um descuido, fui
para a pracinha do Farol, que ficava em frente. Me acomodei em um galho
confortável de uma árvore que ainda está lá e me peguei pensando na vida. O que
havia feito até ali e o que poderia fazer. Não lembro mais o que pensei. Mas
lembro de estar ali, à sombra em um começo de tarde escaldante, o barulho das
ondas, distante, os coqueiros, embalados pelos ventos, o cata-vento do hotel
girando e um mundo inteiro se oferecendo como uma rosa que abre suas pétalas.
Sinto saudade desses dias. Em Mosqueiro chegávamos no “Presidente Vargas”. O
carregador era o “Sete”. A camionete, inglesa, era do Cecy. O caseiro era “Seu
Bolachinha”, apelido dado por minha mãe, claro. Nos finais de tarde, Seu
Harley, vizinho, botava para rodar seu kart, levando um moleque de cada vez
para dar uma volta na praça. À noite, fazia mágicas para nossos olhos curiosos.
Casa grande a “Celina”. Levávamos amigos, primos. O quintal ia até a Rua da
Bateria. Pira, futebol, vôlei. Qual é hoje a brincadeira? E lá vem a querida
Biá avisar que tem merenda, banana amassada com Toddy. Então vamos à praia.
Aproveita a maré baixa e vai à Ilha dos Amores. Agora, à tarde, tem futebol no
Farol. O Ivan Harley está convocando. À noite, os Panteras Negras,
empresariados por Rosenildo Franco, tocam no Praia Bar, na Vila. No Netuno Iate
Clube, o show era da Escuderia Esmeril, com Paulo Pimenta na bateria e Có no
baixo. Luz negra. Toca uma música pra dançar colado. Cadê coragem para tirar as
meninas para dançar? Os mais espertos chegavam na frente. Ficava à margem,
prestando atenção nos olhos brancos e as camisas da turma, sob a luz negra.
Depois era ir para casa e sonhar de olhos abertos com aquela menina que,
prometo da próxima vez.. Lá vem Seu Rubem Ohana com a Kombi trazendo a
garotada. Hoje a festa é no Tralhoto. O pessoal do Chapeu Virado visita a galera
do Farol. Sergio Zumero passava as manhãs empinando papagaio. À caminho da
praia, acenavam para meu avô que ficava no pátio, recebendo visitas. Meu pai
tocava com os amigos. Uma noite, apareceu um “boi” na frente de casa.
Curiosidade total. Cantaram, dançaram, comeram, beberam e se foram. Nunca mais
esqueci. Ganhei uma eletrola portátil, quer dizer, quase isso. Pesadíssima, em
madeira, funcionando com oito pilhas grandes. Um dia vieram e pediram
emprestado. Nunca esqueci. Vôlei era na casa do Dr. Otávio Mendonça, mas eu
preferia futebol. Basquete era no Netuno. Havia tempo para tudo. Ao final das
férias, o Edgar botava para tocar “I don’t wanna say goodbye, for the summer”,
de “Sealed with a kiss”. Chegamos em Belém, em casa, sobre a cama, “Beatles 65”,
compilação absurda feita pela gravadora local. E quem queria saber? A mãe
reunia e avisava, a cada um: de manhã, colégio, depois do almoço, inglês,
datilografia, natação, ao que respondíamos com enlouquecidos “nãos”!
Mosqueiro, Farol, é o lugar da
minha vida. Tomara que joguem minhas cinzas na ponta da Ilha dos Amores. De vez
em quando vou até lá. Dia de semana, sem movimento. Olho aquele cenário e
lembro de tudo. Passam correndo Zumero e os papagaios, Ivan e a bola, a
eletrola emprestada, Seu Harley no kart,
e sorrio feliz, em paz. Contemplo a “Celina” e fico mudo, como naquele
dia em que pensei na vida. Que vida!
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