Confesso
que bateu o medo. Sou classe média. Estudei, me formei. Trabalhei feito um
condenado. Eu e muitos outros estamos sendo caçados como ratazanas prenhas,
lembrando Nelson Rodrigues. Os crimes saíram dos cadernos de Polícia e
invadiram o Jornal das Oito, na Tv, as colunas sociais. Ando pelas ruas ligado,
olho constantemente à minha volta, como um soldado em campo inimigo, camuflado
e arriscando pisar em minas. Pego meu carro e a cada motociclista que zune à
minha frente, corta em zigue zague, toma a frente, meus relés de segurança
detonam adrenalina. Quando será minha vez? Quando serei sorteado? Há alguns
meses, em uma das ruas mais importantes de São Paulo, fui assaltado. Por
reflexo, reagi e o ladrão fugiu. Se estivesse armado, me atingiria. Ele devia
estar observando minha caminhada, completamente desligado. Desatento. Foi esse
meu pecado. Os sinais de trânsito hoje funcionam como fator de risco. Não de
trânsito, mas de assalto. Escolha aleatória? A moça atingida no braço, ali na
Pedro Álvares Cabral. No vídeo de segurança, o ladrão parecia estar indo
escolher um carro no sinal, mais adiante. Resolveu pela moça porque ela
estacionou. Um sorteio. Bingo, o escolhido foi vo-cê! Os caras, na Gentil,
quatro da tarde, bum, vinte tiros. Te mete!
Um
conjunto de situações, baseado na incompetência de nossos gestores, produziu
essa crise. Nossa elite vive viajando pelo mundo, mas nada traz de bom para a
cidade. Vive em prédios cada vez mais altos, luxuosos, mas quando sai em suas
SUVs maravilhosas, mergulham na lama e nos buracos das ruas apodrecidas. Uma
cidade com menos de 10% de esgotos não pode se considerar cidade. Precisamos de
profissionais competentes. A cidade pulsa, pede. Organismo vivo. A cada dia, um
número cada vez maior de desesperados chega procurando salvação. Não há
empregos a oferecer. Não há comida, moradia, planejamento. De dia, vêm para o
centro buscar qualquer coisa. Amontoados em barracas fétidas, passam o dia
arengando uns com os outros. Vem a droga e chupa a vida dos mais novos, transformando-os
em zumbis. Para quê assistir Walking Dead, se podemos tê-los, zumbis, 4D, ali
na Primeiro de Março com Riachuelo, na Praça da República, Lojas Americanas e
tantos outros points? A Polícia, com alguma razão, diz ser um problema social.
Mas não há, claramente, presencialmente, ação da área social da Prefeitura.
Quer
saber? Nós odiamos Belém. Essa Belém da qual dizemos ter saudades quanto
estamos fora. Essa Belém que nos faz chorar quando toca a música da Fafá de
Belém. Essa Belém da qual dizemos sentir orgulho de pertencer e por isso
amamos. É mentira. Nós odiamos Belém. Tudo fazemos para agredi-la. Nós. Eu e
você. As autoridades, preocupadas com suas questiúnculas, despreparadas
tecnicamente para as funções que assumem. Nós que jogamos lixo nas ruas. Que
construímos prédios gigantescos, sem preocupação com acesso, garagem, esgotos.
Que fazemos dos nossos carros verdadeiras armas. Nós que votamos em governos
que não dão mínimas condições da população mais pobre ter um porvir em todos os
sentidos. Nós, que ainda assim, falamos mal dela, Belém, enquanto estamos aqui.
E quando estamos fora, choramos em banzo sonso. Nós te odiamos, Belém, ao
permitir que as ditas “artoridades” enterrassem nossa Cultura, nós que temos
tanto a produzir. Sim, tenho medo de andar nas ruas, mas tenho refletido e
procurado melhorar como cidadão. Mas sinceramente, a dura verdade é que odiamos
Belém.
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