sexta-feira, 5 de setembro de 2014

BELÉM, CIDADE MAL AMADA

Confesso que bateu o medo. Sou classe média. Estudei, me formei. Trabalhei feito um condenado. Eu e muitos outros estamos sendo caçados como ratazanas prenhas, lembrando Nelson Rodrigues. Os crimes saíram dos cadernos de Polícia e invadiram o Jornal das Oito, na Tv, as colunas sociais. Ando pelas ruas ligado, olho constantemente à minha volta, como um soldado em campo inimigo, camuflado e arriscando pisar em minas. Pego meu carro e a cada motociclista que zune à minha frente, corta em zigue zague, toma a frente, meus relés de segurança detonam adrenalina. Quando será minha vez? Quando serei sorteado? Há alguns meses, em uma das ruas mais importantes de São Paulo, fui assaltado. Por reflexo, reagi e o ladrão fugiu. Se estivesse armado, me atingiria. Ele devia estar observando minha caminhada, completamente desligado. Desatento. Foi esse meu pecado. Os sinais de trânsito hoje funcionam como fator de risco. Não de trânsito, mas de assalto. Escolha aleatória? A moça atingida no braço, ali na Pedro Álvares Cabral. No vídeo de segurança, o ladrão parecia estar indo escolher um carro no sinal, mais adiante. Resolveu pela moça porque ela estacionou. Um sorteio. Bingo, o escolhido foi vo-cê! Os caras, na Gentil, quatro da tarde, bum, vinte tiros. Te mete!
Um conjunto de situações, baseado na incompetência de nossos gestores, produziu essa crise. Nossa elite vive viajando pelo mundo, mas nada traz de bom para a cidade. Vive em prédios cada vez mais altos, luxuosos, mas quando sai em suas SUVs maravilhosas, mergulham na lama e nos buracos das ruas apodrecidas. Uma cidade com menos de 10% de esgotos não pode se considerar cidade. Precisamos de profissionais competentes. A cidade pulsa, pede. Organismo vivo. A cada dia, um número cada vez maior de desesperados chega procurando salvação. Não há empregos a oferecer. Não há comida, moradia, planejamento. De dia, vêm para o centro buscar qualquer coisa. Amontoados em barracas fétidas, passam o dia arengando uns com os outros. Vem a droga e chupa a vida dos mais novos, transformando-os em zumbis. Para quê assistir Walking Dead, se podemos tê-los, zumbis, 4D, ali na Primeiro de Março com Riachuelo, na Praça da República, Lojas Americanas e tantos outros points? A Polícia, com alguma razão, diz ser um problema social. Mas não há, claramente, presencialmente, ação da área social da Prefeitura.

Quer saber? Nós odiamos Belém. Essa Belém da qual dizemos ter saudades quanto estamos fora. Essa Belém que nos faz chorar quando toca a música da Fafá de Belém. Essa Belém da qual dizemos sentir orgulho de pertencer e por isso amamos. É mentira. Nós odiamos Belém. Tudo fazemos para agredi-la. Nós. Eu e você. As autoridades, preocupadas com suas questiúnculas, despreparadas tecnicamente para as funções que assumem. Nós que jogamos lixo nas ruas. Que construímos prédios gigantescos, sem preocupação com acesso, garagem, esgotos. Que fazemos dos nossos carros verdadeiras armas. Nós que votamos em governos que não dão mínimas condições da população mais pobre ter um porvir em todos os sentidos. Nós, que ainda assim, falamos mal dela, Belém, enquanto estamos aqui. E quando estamos fora, choramos em banzo sonso. Nós te odiamos, Belém, ao permitir que as ditas “artoridades” enterrassem nossa Cultura, nós que temos tanto a produzir. Sim, tenho medo de andar nas ruas, mas tenho refletido e procurado melhorar como cidadão. Mas sinceramente, a dura verdade é que odiamos Belém.

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