sexta-feira, 8 de junho de 2018

REUNIÃO DE FAMÍLIA

Não sei se isso continua a acontecer. Nos dias de hoje, todos parecem preferir a solidão, andando pelas ruas com seus fones de ouvido, como se não quisessem ser perturbados por nada. Mas eu me lembro, antigamente, mês de julho, Mosqueiro, ou Moscow. O pai chegava depois das seis, no Presidente Vargas, sexta feira. Desembarcava do ônibus que ia parando nas praias, para que os pais de família passassem o final de semana com os seus. A vida começava a melhorar. O pai, que antes trabalhava de manhã, de tarde e de noite, para alimentar cinco bocas famintas, agora tinha os finais de semana. Os filhos adolesceram e ele, também. Tivera um conjunto musical quando solteiro. A mãe era a cantora. Quando casaram, guardou o violão e foi à luta. Ela chefiou aquela gang de cinco, usando sua imaginação delirante. Deu no que deu. Dos cinco, quatro são jornalistas e três, radialistas também. Sim, aquele final de semana. Trazia jornais, claro, revistas e alguns mimos para os filhos. E mais tarde, banho tomado, jantado, ia até o pátio levando o violão. Sentávamos em volta. E tocava. Primeiro as músicas que gostava, para matar a saudade da semana difícil. E depois, apontava para cada um, que também tinha de cantar. Deixávamos de lado músicas autorais e fazíamos sua vontade. Músicas antigas, as quais sabíamos as letras. Caetano, Paulinho da Viola, bossa nova. Ele acompanhava. Fazíamos côro. Quer algo melhor que um pai, cercado dos filhos e da mãe, cantando juntos. Bem, não posso garantir, principalmente por meu lado, qualquer qualidade no canto, mas isso não era esperado. Bom era estar juntos. Mais tarde, saía com a mãe para encontrar amigos de seresta. Imagino que em outras casas, isso também acontecia. Talvez não fosse o pai, mas alguém levava o violão. Cantavam Chico, Caetano. Cantavam Jovem Guarda. Era tão bom!

Foi disso que lembrei quando ouvi o disco gravado por Caetano Veloso e seus filhos, em show que vem percorrendo o país e até já esteve aqui. Não, não estive no Hangar. Não ia machucar meus ouvidos com o som horrível dos shows que lá acontecem. Assisti a algumas gravações em programas de tv e instagram. Imagino que a idéia tenha vindo em alguns dos saraus que Paula Lavigne promove no apartamento onde moram. Penso no peso que deve ser ter um pai como Caetano Veloso. Em outra esfera, claro, eu e meus irmãos nunca sentimos isso, mas sei lá, talvez todos esperem a mesma genialidade, apesar disso quase nunca acontecer. Caetano, Moreno, Zeca e Tom. O repertório foi ajustado para que todos tivessem alguma música de sua autoria para cantar. E todos dividem vários instrumentos. Quem assistiu ao show, deve ter visto. A abertura é com “Alegria, Alegria”, com Tom participando. Depois vem “O seu amor”, uma das mais belas músicas de Gilberto Gil, feita para os Doces Bárbaros, com solo de Moreno. E lá vem “Boas Vindas”, samba de prato, seguida por “Todo Homem”, que virou single e tema de minissérie, autoria e solo de Tom. Sim, é curioso que tenha escolhido o falsete para se expressar. A frase “todo homem precisa de uma mãe” emocionou a todos. Há algumas das últimas safras de Caetano, que não gosto. Quando começa a ficar chato vem “Oração ao Tempo”. Canções feitas para Dona Canô ou para Paulinha. Músicas como “Reconvexo”, que fez para Bethania e “Força Estranha”, que Gal gravou. É um show que está correndo o Brasil, mas é como se estivessem no apartamento, família, todos em volta. Claro, quando o pai canta, é maravilhoso. Me lembrei dos julhos de Mosqueiro, de meu pai e de um tempo inesquecível.

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