Estou em um dos prédios do
INSS, por conta de um problema na aposentadoria de minha mãe. É, talvez, a
quarta ou quinta vez que venho aqui. Lá fora, na avenida Nazaré, o trânsito
buzina, freia, grita e motores resfolegam. Aqui dentro reina uma modorra. A luz
é branca e fraca. Dois monitores estão ligados no programa de Fátima Bernardes,
mas não há som. O que se ouve é o ruído de outros monitores que avisam a senha
da vez e o guichê de atendimento. Estamos todos calados e atentos. Quando fui
chamado, me atendeu um senhor corpulento, moreno e cenho fechado. No peito,
camisa aberta e uma medalha com escudo do Clube do Remo. Hoje, finalmente, tudo
vai acontecer, pensei. Enviou-me até seu gerente. Outra espera. Ao meu lado,
uma moça e sua mãe, bonitas. Vai falar com Seu Alberto? Não, digo, vou falar
com Ronaldo. Ele me chama. Sua sala é pequena, sem adornos. Uma folhinha da
Caixa 2015 está jogada em um canto. Um armário lotado de caixas. A mesa, um mar
encapelado de papéis, processos. Na ponta, um computador desgastado é como o
Rochedo de Gibraltar. Atencioso, educado, me surpreende com a acolhida. Em
outra vez, na tal sala onde estava, com minha mãe, a atendente negou-se a
reconhece-la, 92 anos, na carteira de identidade. Obrigou-a a tirar nova
carteira, nova foto e enfim, ainda estou aqui tentando resolver. Ouve meu
relato. Acho que deveria dar um trato no visual. Fazer a barba, pentear o
cabelo. A roupa é neutra. A luz é branca e fraca. Tudo cinza. Mas para ficar
naquele cubículo, sob a luz branca e fraca, mergulhado em um mundo de papéis,
dar um trato para quem? Para quê? Desculpe a desarrumação da mesa. É que estou
homologando ponto de servidores e fica tudo assim. Dá uns dois telefonemas.
Amistoso, conta piadas rápidas aos colegas antes de entrar no assunto. Explica
que, com o incêndio do prédio na esquina com a Dr. Morais, todos os processos
de tal ano foram lá para São Brás. Mas vai se empenhar em resolver. Conheces
Jurandir Camarão? Não. É que tua mãe é Camarão. Acrescento que a família é de
Muaná. Isso mesmo. Não conheces Jurandir Camarão? Não. São todos de Muaná. Ela
também é Magno, não é? Sim. Eu sou Magno. Tudo gente de lá. Pior, antes de tu
entrares, estava aqui a esposa do atual prefeito de Muaná. Sim, meus avós
maternos vieram de Muaná. João e Sant’Ana Camarão. Parece que o Marajó inteiro
baixara naquela sala. Ele conta que alguém de lá, teve 25 filhos, com duas
mulheres. Retruco que somente minha avó materna teve 14 filhos. Eram os
costumes da época. Ronaldo prontificou-se a resolver o problema com a
aposentadoria da mãe. E eu acreditei. Na saída, disse tchau, parente. E quando
cruzei a porta, avisei à moça e mãe bonitas que o nome era Ronaldo, e não
Alberto. E a caminho da rua, o atendente corpulento pergunta que tal. Tudo
certo. E acrescentei: Leão! Ele sorriu, satisfeito.
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