sexta-feira, 16 de maio de 2014

VIDAS NAS PONTAS DOS DEDOS

DENTRO DA CASA
É o título, no Brasil, do filme de François Ozon, com alguns bons atores como Kristin Scott Thomas, Emmanuelle Seigner e Fabrice Luchini em destaque. Filme europeu, francês. Fala-se muito. Pouca ação, mas funciona.

O professor de alunos entre 14 e 16 anos é casado com uma galerista, sempre em dificuldades de vender obras de arte moderna. Ele, entediado, corrige redações, reclamando que escrevem umas três linhas e só. De repente, algo bem maior, interessante. O garoto vive com o pai que é deficiente e estuda com bolsa. Mas escreve bem. Observa a família de um colega, classe média. Sabendo de sua dificuldade em matemática, oferece-se para dar aulas. No texto, descreve o que viu e o que ouviu. Ao final, arremata com, “continua”. Mas como? O professor se interessa, escritor frustrado que é. Dá apoio, sugere, corrige, cita famosos escritores como Flaubert. O garoto, agora, é amigo da família. Enquanto o colega faz exercícios, perambula pela casa e depois escreve. Ih, o colega vai se sair muito mal na prova e provavelmente contratarão um professor e acabou a escrita. Como assim? Sem a observação, acabou. Nesse ínterim, o professor e a esposa lêem, comentam e acompanham. O mestre rouba a prova, copia e a passa para o rapaz que tira o máximo em nota. Um crime. Como pôde? Agora, mercê de sua boa conversa e vocabulário, ao contrário do filho, o rapaz é o melhor companheiro do pai, um homem de vendas em crise e da mãe, a bela Emmanuelle Seigner, uma dona de casa entediada e decepcionada com a vida, mas linda. A corda é esticada ao máximo e há, evidentemente, uma explosão. O que é delicioso de acompanhar é o surgimento de uma narrativa e suas possibilidades. Uma sensação maravilhosa que todo autor sente, ao escrever. Os filhos, a namorada, amigos que por algum motivo lêem originais, começam a opinar, torcer, sugerir, identificar-se e o autor, senhor daquelas vidas, ou atende aos reclamos ou segue direto, naquilo que entende ser o melhor e correto, ao que se propôs. Isso, faço muito. Não gosto muito de finais felizes. O mundo está acostumado com happy endings. Não o contrario por charme, boutade, mas obedecendo ao que foi escrito, aquilo que inexoravelmente vai acontecer, claro, se você não for um Dan Brown, por exemplo, que a cada capítulo precisa submeter as idéias ao editor, por conta de uma venda de milhões de cópias do livro/produto. O filme de Ozon propõe discussões interessantes, faz pensar e é muito bom para quem escreve.

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