quinta-feira, 29 de abril de 2010

Tyson

Não gosto de assistir lutas de boxe, a não ser quando são dois peso pesados, e sei que um vai para o chão. Dois touros. Vira algo selvagem. Assim esses Ultimate Fightings. Imagina se isso é esporte. Não gosto, mas há uma energia que atrai meu olhar para a luta. Fico entre o impressionado, mente excitada com a violência e algo que minha cultura não consegue explicar, fico ligado no espetáculo deprimente, embora mediado por juízes. Eu sentia uma mistura de medo e respeito por Mike Tyson. Não perdia nenhuma de suas lutas. Ainda não sei explicar se torcia contra ou a favor, mas ficava ligado. Meu pai também. Dizia ficar tão excitado com a violência, que precisava tomar um banho gelado após a luta, para poder dormir. Tyson vinha para o ringue sem roupão, nada. Logo ao entrar, mirava no oponente com olhos ferozes, cheios de ódio. Girava, aquecendo os músculos e o olhar estava lá, direto. Pantera prestes a saltar sobre a vítima. Em uma luta, lembro, o gongo bateu e ele partiu de seu corner para o oponente, e chegou lá antes que levantasse do banco onde estava. Chegou socando. Não tão alto quanto a média dos peso pesados, mas muito forte, tinha pouco jogo de pernas. Batia em todas as direções, velozmente, não dando tempo ao adversário de se defender. Foi campeão por duas vezes. Hoje, ainda circula por aí ganhando uns trocados. Acabo de assistir ao documentário "Tyson", feito por James Toback. Excelente. Compreendi que todo aquele gestual até subir ao ringue, foi ensaiado por seu mentor, Cus D'Amato. Ele diz que não era raiva e sim técnica, a maneira de ganhar os combates. Que percebia o medo nos olhos dos adversários, provocado por suas atitudes. Ali, sabia que a luta estava ganha. Infelizmente, Cus morreu e ele perdeu a direção. Todos os espertalhões se atiraram sobre ele e seu dinheiro. Perdeu e ganhou. "Para mim é oito ou oitenta. Ou estou rico ou pobre". Conta o tamanho de seu mêdo dos adversários. De ser batido, humilhado. Toda aquela encenação era para encobrir seu medo. E fala isso com uma voz fina, frágil e aqueles olhos ferozes. Uma figura e tanto, que ainda mete medo. Não entendo nada de técnica de boxe, mas até hoje compreendo as mordidas na orelha, que deu em Evander Hollyfield. Foi a tática de Evander, fazendo clinch sistemáticamente, usando a cabeça para machucá-lo e um juiz que nada fez para coibir isso. E é exatamente quando o ódio passa por cima da razão é que perde a luta. Evander tem punhos fracos. Ele conta que ficava ouvindo o ruído dos murros de Evander e nada sentia. Até cair. Gostaria que Capote estivesse vivo e escrevesse sobre essa luta, como fez com Mohamed Ali e Joe Frazier, para a Rolling Stone. Mike Tyson não tem nenhuma felicidade aqui, fora do ringue. Conheço pessoas assim. Médicos, a maioria. Na sala de operação ou no consultório, estão no seu terreno, rápidos no raciocínio, atos, senhores da situação. Fora, são tolos sem direção na vida. Por isso as drogas, bebida, mulheres e espertalhões que lhe atacaram. Foi campeão mundial aos 22 anos. Cus morreu. E ele ali, de frente para a câmera, relatando sua vida, seus erros, suas vitórias. No rosto, uma gigantesca tatuagem, aquilo, também, compondo uma máscara para assustar as ameaças, estas sim, que o assustam tanto. Um homenzarrão, um homem fera, com medo do mundo. Como a vida é curiosa.

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