Não
a conheço. A moça. Talvez 25, 30 anos, classe média, certamente com Ensino
Superior. Bonita. Passa ao lado um rapaz também bonito, músculos trabalhados.
Ela pergunta animada se ele já comprou ingresso para assistir Wesley Safadão,
ao que ele responde que sim, claro que sim. Me deixaram pensativo sobre um país
que provavelmente acabou, apesar de tanto otimismo. Afundamos. Se o Brasil der
certo economicamente, voltarem as indústrias a receber encomendas, não haverá
mão de obra qualificada para trabalhar. A crise da Educação e Cultura explodiu
de vez. Muitos analfabetos funcionais. Não há compreensão daquilo que é
escrito, e talvez, apenas, do que é ouvido, nesse dialeto que as pessoas
passaram a usar. Não se trata do desenvolvimento da Língua, que é algo dinâmico
e sim a inversão das regras, invenção de palavras, ignorando tudo. Meu
amiguinho, chegando à quarta ou quinta série, não sabe nada de nenhuma matéria.
Vai passando. A professora me perguntou se era melhor reprova-lo e com isso,
fazer com que ele nunca mais frequentasse escola. Os do Ensino Médio estudam
para passar. Há trabalhos, uma série de pacotes que visam melhorar a nota. E
vão passando.
Ando
pelas ruas. Me relaciono com pessoas. Ouço o que dizem. Às vezes pergunto
sabendo a resposta. Estou vivendo em uma dimensão paralela. Essas pessoas
felizes, não gostam de ler, ouvem músicas tipo “atirei o pau no gato”, lotam
cinemas para assistir filmes de super heróis que a minha geração assistia aos
doze anos de idade. Nada para pensar, nada para analisar, nada para responder,
nenhuma opinião. E estão felizes. Envelheci. Trabalhei com música pop a vida
inteira e agora não consigo ouvir nada. Procuro quem possa debater comigo o
último livro de Leonardo Padura e só encontro meus amigos de sempre. Ao Teatro
comparecem as mesmas pessoas de sempre. Na Casa Cuíra, muitas vezes, dizem,
encantados, que nunca haviam assistido a uma peça de teatro. Assisti a um
programa da Globo, de humor, satirizando os telejornais. Duvido que o grande
público entenda 10% das ironias contidas no texto. Entre em qualquer casa de
Belém de menor poder aquisitivo e na televisão permanentemente ligada estará
SBT ou Record. Uma questão de estética. Concordo com o arquiteto Flávio Nassar,
na entrevista a Tito Barata em “Papo no Tucupi”. “Belém não tem jeito”. Pensem
bem. Não tem. Nossa culpa. Nós, que apesar de gostar de ouvir boa música,
assistir bons filmes, boas peças de teatro, não saímos de casa por pura
preguiça. Não vamos. Não enchemos as cadeiras. Eu gosto, mas dá uma preguiça...
As raras atrações de qualidade agora passam longe da cidade. E somos todos nós
que votamos em políticos que até hoje provaram nosso grande poder de auto
destruição. Como é possível um Estado do tamanho do Pará, potencialmente o mais
rico do Brasil, continuar pobre, tendo suas riquezas extraídas em grande
velocidade, deixando para nós, que aqui moramos, nada. Nada, comparado ao que
devíamos receber. Passo ao largo de casas de shows para jovens e vejo carros
importados, lindos, estacionados. Lá dentro, show de sertanojos. Ligo no
Serginho Groissman e lá está uma dupla de homens feios, barrigudos, com chapéus
e botas ridículas, entoando uma choradeira devastadora, acompanhados pela plateia
de jovens! Onde está a estética dessas gerações? Não, as letras bonitas não são
essas. As melodias bonitas não são essas. Os filmes bons não são esses. De
livros nem falo. Perdemos umas três gerações que agora assumem postos de
comando no país, carregando dentro de si a ignorância e a cretinice. Onde foi
parar o bom gosto? O equilíbrio? O desafio, na direção do novo? Você já parou
para pensar em quem você é? No que acredita? Quais suas opiniões? Tem algum
pensamento na direção do coletivo da cidade? Pretende contribuir com alguma
coisa? E pior do que tudo, há algum porvir para os jovens nesta cidade em
escombros?