Acabo
de ler a biografia de Fernanda Montenegro, a grande diva das artes cênicas
nacionais. Uma vida de sacrifícios e luta constante em favor da arte. Li também
a revista 451 onde Fernanda está na capa em bela foto, como se fosse uma bruxa,
tendo aos pés livros para serem queimados. Uma provocação à bizarrice que
enfrentamos na área cultural brasileira. Fernanda nos livros, nas revistas, no
Bial, foco de um Globo Repórter. Fernanda no Teatro Municipal, aclamada,
festejada, adorada, gloriosa, rádio, teatro, televisão, cinema. Foi insultada
por um cretino, logo colocado em seu lugar. E penso em Claudio Barradas, que
tal como Fernanda, está completando 90 anos de idade e imensos serviços às
Artes Cênicas do Pará. Fez rádioteatro, Tv Marajoara, ocupou todos os palcos da
cidade, dirigiu peças durante uma vida no Sesi, atuou nos primeiros filmes
produzidos no Pará. Aos 62 anos, tornou-se padre, obedecendo uma vocação
iniciada na juventude e deixada de lado, exatamente, pelo Teatro. Há dez anos,
tive a honra de dirigi-lo em dois espetáculos que protagonizou ao lado de Zê
Charone, no Teatro Cuíra, “Abraço” e “Sem Dizer Adeus”. Agora, às vésperas de
completar 90 anos, Marcos Valério, seu colega na Tv Nazaré, perguntou o que
desejava como presente, ao que respondeu: quero voltar aos palcos com “Abraço”.
Outra honra. Nós o cercamos de carinho e admiração, embora ele não seja muito
chegado a rapapés. Queríamos leva-lo a um grande teatro, para celebrar, tipo
Teatro da Paz ou Teatro do Sesi. Os primeiros movimentos não tiveram eco.
Ensaiamos e estreamos na Casa Cuíra, na Cidade Velha, para 40 pessoas por
sessão. Uma maravilha para quem quer “ver a mágica” tão próxima. Mas Cláudio
merece multidões, honras, glórias, palmas, por uma vida doada à Cultura, um
talento a serviço do bem comum. A Tv Nazaré deu apoio. Mauro Bonna nos
entrevistou em seu “Argumento”. A Rádio Cultura me entrevistou. Ele estava no
“Sem Censura”, mas houve um pico de energia e o programa não foi ao ar. Pensam
que remarcaram a entrevista? Pensam que propuseram um programa especial, entrevista,
documentário? Não. Afinal, quem é Cláudio Barradas? A moça do jornal estava
nervosa, ao telefone, querendo uma entrevista. Ele estava no carro, vindo de
Icoaraci, onde habita um quartinho no Tabor. Ela queria algo rápido. Tinha uma
pauta para dar conta. Sequer “deu um Google” para saber quem é Cláudio
Barradas. Sim, houve matérias nos jornais, mas era preciso muito mais. As
outras emissoras de televisão não compareceram. Quem é esse tal de Cláudio
Barradas? As pessoas de hoje acham que o mundo começou no dia em que nasceram,
ou quando fizeram 18 anos. Sua leitura diária, se é que há, limita-se aos
highlights. Rasos como uma poça d’água. Foda-se Cláudio Barradas. Ele é um
qualquer que me mandaram fazer entrevista por telefone. No mais é copiar o release
e pronto. E as autoridades no âmbito municipal ou estadual? Foda-se Cláudio
Barradas. Já não tem o Teatro da Ufpa com o nome dele? Basta. E vamos ouvir
sertanojos e funcks. E não vamos ler porque é chato. E não vamos ao teatro
porque dá sono, a não ser que seja o Erin Johnson e a Viviane Araújo, puta
mulher, cara!
Dá
vontade daquele desabafo da Fernanda Young, mas penso que é preciso contar até
cem, mil, 1 milhão e perceber que nosso trabalho cultural é para atingir
exatamente esses incultos, para tentar mudar o mundo para melhor. Quanto mais
me fechas os olhos, mais eu vejo. Onde estão as Secretarias de Cultura, do
município e do Estado que não o chamam, tratam com o devido respeito e
reverência, abraçando essa marca que aparentemente somente ele quer festejar?
Vereadores, deputados, que vivem a espalhar comendas e medalhas, a apresentar
emendas escrúxulas, quer dizer que para vocês, foda-se Cláudio Barradas,
também? Será que ele é invisível, como todos nós da Cultura, que acabamos de
passar por uma escuridão de mais de vinte anos, por conta de um infame?
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