sexta-feira, 19 de abril de 2019
O TEMPO DA DELICADEZA
Um
templo em homenagem à Fé, Beleza, Arte, que levou 200 anos para ser construído,
destruído em algumas horas. A Igreja de Notre Dame era o coração de Paris.
Aquele fogo encheu de tristeza o mundo dos que ainda acreditam na delicadeza.
Não há como não deixar de pensar no Brasil desses dias. Na Belém desses dias.
Mais de vinte anos de abandono da Cultura e outros tantos do abandono à Educação,
geraram o que vivemos. A grosseria, a boçalidade, a violência e a burrice. Por
conta da mídia, cidades como Rio de Janeiro e São Paulo têm suas dificuldades
multiplicadas, enquanto Belém, por exemplo, com muito mais problemas, mantém-se
como em estado de choque. Grassa a burrice. Na Educação, algumas gerações de
analfabetos funcionais, alguns pretensamente mais sofisticados, vestindo roupas
de grife, desfilando em carros importados, ouvindo sertanojos, escrevendo
errado e com gosto cultural perto do zero. Sempre leio Claudia Costin e ela
escreveu que tanto quanto mudar radicalmente o olhar para as primeiras séries,
é preciso requalificar os professores, seja em salários, seja em preparo
técnico. Nós, que fazemos Cultura, que escrevemos, atuamos, tocamos, cantamos,
pintamos, enfim, temos pela frente uma barreira, um muro, como aquele do Game
of Thrones, gelado, intransponível, para alcançar este público. Não leio porque
dá sono. Não vou ao Teatro porque de dramas, chegam os da nossa vida. Aquele
músico, aquela cantora, só canta coisa chata. Não entendo pintura. Hoje não
saio à noite porque tem jogo, porque tem BBB, porque tenho preguiça. Não leio
jornais porque os artigos são longos e perco o interesse. Na internet, leio os
highlights e pronto. Vivemos a falta de Educaçào, onde a ignorância é anunciada
como a nova virtude, como disse Joaquim Ferreira dos Santos. Eu sou imbecil mas
sou feliz! Uma terra de surdos, de insensibilidade. Onde foram parar a
elegância, a suavidade, os bons modos? Ser gentil, hoje é frescura. Tempos de
barbárie e grosseria. O inverno é rigoroso. A prefeitura nunca está preparada.
Também ninguém deixa de jogar lixo onde não deve. Há mais carros que ruas, mas
ninguém deixa de fazer fila dupla, em qualquer lugar, se lhe apetece. Fazer
Cultura em Belém é torcer para que a mídia divulgue matérias de sua obra e
ficar aguardando. Será que “eles” vêm? Depois, passar pelos bares, lotados de
gente enchendo a cara, assistindo em monitores, lutas no UFC. A nova Secult e a
Fundação Tancredo Neves (foda-se o nome que o infame deu), esta comandada por
um neófito, têm à sua frente tarefa hercúlea. Construir estruturas, primeiro.
Refazer tudo o que foi destruído. Os artistas, famintos, alguns impacientes.
Grupos que fazem Cultura, mas ainda no alcance da Prefeitura, com sua completa
ausência, também querem que o Estado resolva seus problemas. Quando minha
primeira peça estreou, foi no Teatro da Paz, lotado. Hoje, impensável. Mas
ninguém parou. A Secult é que está voltando. Na ausência de tudo, escritores
criaram a Flipa, já em seu quarto ou quinto ano. Até agora, seus organizadores
não foram chamados para qualquer consulta. Quem entrou deve saber tudo. Será?
Repito, não paramos. Temos artistas suficientes em todas as áreas, aguardando
não paternalismo, mas fomento para que o mercado volte a existir, a Educação
forme pessoas interessadas, que tenham opinião, para que a vida fique melhor. A
vida de todos, não somente dos artistas. Está melhor que antes, a escuridão.
Mas o tempo da delicadeza pode voltar.
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