sexta-feira, 12 de abril de 2019

DO ZERO

Senti pena do presidente da Fundação Cultural do Pará, no palco do Teatro Waldemar Henrique, no encerramento da Mostra de Teatro promovida pela Secult. No palco, peixe fora d’água, sem graça, seu olhar passava da curiosidade ao espanto assistindo à sua frente, a história do teatro paraense desfilando, com pessoas diferentes, roupas, cabelos, linguagem, do seu mundo mais comportado de advogado. Ele olhava querendo entender. Nunca tinha ouvido falar daquela gente. E eu pensei que há um longo caminho de recuperação da nossa Cultura, destruída pelo infame por mais de vinte anos.
Uma das maldades foi fatiar a gestão da Cultura em diversos órgãos. Assim, geridos por pessoas que pouco entendem do assunto, cada um foi atirando para seu lado e ninguém acertou o alvo. Acho que essa era a idéia, assim como, principalmente, separar a Fundação da Secult. O reizinho ficaria em seu trono e a Fundação distribuía minhocas a seus apaniguados. Trabalhei com Guilherme de la Penha e ele dizia que tinha a importância de ser Secretário e a agilidade da presidência da Fundação. Penso que a Secretaria é o órgão máster. Dela parte toda a política a ser desenvolvida e cada uma das outras partes converge, atua para um único objetivo. No meu pensamento, até a Funtelpa estaria debaixo do guarda chuva.

Estamos recomeçando tudo. Do zero. O orçamento deste ano já está comprometido. Mas deixemos todos esses dias para reconstruir estruturas. A Prefeitura, há mais de 30 anos, afastou-se da Cultura. Sua Fundação, hoje, cuida apenas das quadrilhas juninas. Até a Lei Tó Teixeira está parada. Seu presidente, que se diz músico, não conhece os músicos locais. Nem nós o conhecemos. Como chegou ao cargo? Com esse afastamento, passamos todos a exigir da Secult, ações que estão ou deveriam estar no âmbito da Prefeitura. A Secretaria do Estado tem mais de cento e trinta municípios para atender, formular uma política, estruturar algo que pode dar resultados em dois, três anos. Começar do zero. Tudo foi destruído em termos de organização. O Pará tem o tamanho de um país. Paciência. Nós, da Cultura, que nunca fomos muito unidos, nos distanciamos mais ainda. Quem dera um Luiz Otávio Barata, hoje. Foi cruel. Imaginem quantas carreiras passaram esse tempo todo sem qualquer alento. Quantos desistiram. A Educação também emburacou. Por isso todo esse caos. A Secult está recomeçando, mas nós nunca paramos. Não paramos. Ninguém nos deteve. Temos músicos magníficos. Atores maravilhosos. Artistas plásticos, escritores que participam da Flipa. Até cinema. Foi difícil. Muito. Sem apoio oficial. Sem a compreensão que a Cultura é um bem de todos e essencial para a formação de cidadania. O resultado está em todo país, mas me preocupo essencialmente com o Pará. Com Belém. O Teatro sobreviveu em espaços alternativos. Músicos voltaram aos bares cantando qualquer coisa. Artes Plásticas em guetos. Escritores aproveitando a internet e a Flipa. Não morremos. Não nos mataram. Mas há quanto tempo não lotamos espaços para ouvir música que faz pensar? Peças que pedem reflexão? Filmes inteligentes? Isso ficou perdido? Estamos recomeçando. Não acho que tudo esteja bem. Por isso deu vontade de escrever essas linhas aqui. Nós existimos. Fazemos Arte para o bem comum. Para melhorar o mundo. Não fazemos por dinheiro mas precisamos pagar as contas, o super mercado. E ainda nos exigem 50% nos ingressos para estudantes. Há muito a fazer. Vamos recomeçar.

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