sexta-feira, 6 de abril de 2018
CHEGAREMOS LÁ?
Assisti
nos últimos dias alguns filmes que me fizeram pensar a respeito da democracia e
a tal coisa da liberdade de dizer e fazer, claro, dentro dos limites da lei e
principalmente, do outro. Americanos adoram explodir a Casa Branca. São inúmeros
os filmes em que os presidentes ou são tolos, ou perigosos, agentes de algum
inimigo e não raro liquidados após serem combatidos por patriotas. No cinema
espetáculo que exportam para o mundo, as grandes explosões, canhões, armas
absurdas, servem como uma propaganda cultural de sua pujança e de seu modo de
vida. Imaginem se os cineastas brasileiros fizessem um filme explodindo o
Cristo Redentor, Pão de Açucar, sei lá, monumentos importantes para nós. Nossa
democracia é recente e nossa forma de fazer política chegou ao ponto de
descrença que deixa a todos sem resposta sobre o que fazer. O amanhã ninguém
sabe. Dois filmes são passados na Inglaterra, país europeu, muito mais antigo
que o nosso e com seu sistema próprio de fazer política, mantendo inclusive uma
rainha. Também tem seus problemas, mas é um dos mais desenvolvidos no mundo. O
primeiro filme mostra a amizade de uma rainha por um indiano. Idosa, aborrecida
com todos aqueles compromissos, sem tempo para si, ela tem a atenção voltada
para um indiano e contar como ele foi parar na corte seria longo. A amizade
revolta aqueles que a cercam, disputando sua atenção e favores. Quanto ao
indiano, também desenvolve historias mentirosas sobre sua origem e suas
qualidades. No entanto, desperta na rainha a vontade de viver e enfrentando as
dificuldades e armadilhas impostas à amizade, encerra a vida mais feliz, tendo
um diálogo final bem bonito. Faríamos um filme, retratando personagens,
digamos, recentes, com prós e contras, sem atiçar emoções partidárias daqui e
dali? Outro filme, este feito pela BBC, emissora oficial do governo. Alguns
anos adiante, Elizabeth morre e seu filho, Charles, assume. Seus dois filhos
são adultos. O primeiro, casado com Kate, a moça bonita. O outro, atormentado
pela vida sem liberdade que leva. Apaixona-se por uma negra de idéias
socialistas. Planeja abandonar tudo para viver como uma pessoa simples. E aí, o
Primeiro Ministro quer que Charles assine uma lei que controla a imprensa. Ele
recusa. Vem uma crise. Ao invés de contar com a aprovação de sua decisão, o que
seria de se esperar, há revoltas em várias cidades. O filho mais velho, em
cenas fortes, ameaça o pai e toma o poder. O outro filho também concorda. E
Kate, instigando o marido, é um dos artífices do golpe de Estado. Todos acham
que a imprensa deve ter freios. Como assim? A BBC? Freios à imprensa, na
Inglaterra? Golpe? A cena final é a coroação do filho. Somente um país onde a
Educação, Cultura e outros estão em alto nível, a BBC faria o filme e até
cometeria o erro sobre a imprensa. E retrataria uma possível rebelião dos
filhos contra Charles. Também assisto “O Mecanismo”, de Padilha, bem como
acompanho o mar de críticas que a série vem recebendo. Não estamos preparados.
Há sempre uma salvaguarda sobre o roteiro ser ficcional. Nào adianta. Aqui e
ali, reclamam de falas em boca de outros, perseguição, postura partidária,
enfim. Pois estou gostando. Assisto como ficção. A voz do Selton Melo não foi
bem mixada. É interessante perceber como corruptos, até então certos da impunidade,
sofrem ao serem descobertos. Outros confiam até o final que sairão livres. É
ficção e pronto. E também, quem não gostar, pode preferir outras tantas
excelentes séries da Netflix, ao invés de reclamar como se fosse documentário.
Não é. Chegaremos ao ponto de explodir Brasília, matar presidentes, tudo como
ficção, sem a confusão de hoje? Chegaremos lá?
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