Minha
amiga Rejane Barros escreveu em sua famosa coluna que a incomoda quem chega de
viagem e passa a comparar Belém com as cidades visitadas. Mas Cora Rónai, em O
Globo, também viajou e na volta, escreveu “Basta sair um dia para perceber como
nossa vida está deteriorada”. Sim, o contraste é cada vez mais brutal. Voltei
encantado com Lyon. Além de trabalhar muito no Festival que me levou até lá,
tive um dia de folga para passear e conhecer seus lugares, um anfiteatro
romano, construções, museus, igrejas, dois rios que a cortam e um lado
totalmente moderno, com belos edifícios. Tudo parece estar pronto e no entanto,
aqui e ali, há pequenos reparos sendo feitos. A cidade recebe uma torrente de
atividades culturais e esportivas. Não é o paraíso, mas talvez, um sonho feliz
de cidade. O Quais de Polar, festival do qual participei, trouxe mais de trinta
autores do mundo todo, especializados em Literatura Policial. Grandes mesas de
debates em diversos locais, desde uma igreja em reforma, transformada em
auditório, até a casa das leis, um verdadeiro palácio com maravilhas para onde
se olhava. No anfiteatro romano, nos próximos dias, com a chegada da primavera,
shows com alguns dos maiores artistas do mundo estão marcados. Avenidas largas,
asfalto e meio fio perfeitos, ônibus silenciosos e em velocidade tranquila,
combinando com ônibus elétricos. Nas ruas, as pessoas não parecem ter essa
pressa louca que temos aqui, muito menos estão apavoradas, vendo em cada
transeunte um assaltante. Incrível, para mim, os postos de bancos 24 horas são
ao ar livre, sem qualquer proteção. Viajei no metrô de Lyon, tranquilo, mesmo
em horários de pico. Muitos, crianças, adultos e idosos, trafegando de
patinete! Isso, patinete! Muitos outros, bicicletas. Fui a uma festa promovida
pela minha editora francesa de livros de bolso, Points, em um pequeno navio,
ancorado junto a vários outros. Foi transformado em uma casa noturna, com pista
de danças e tudo. Eles dizem que é para poderem fazer barulho e não incomodar
os que preferem o silêncio. No festival, veio um rapaz, brasileiro. Mora há dez
anos em Lyon. Não pretende voltar. Aqui há qualidade de vida. Mesmo as pessoas
mais pobres, que moram, digamos, na periferia, moram confortavelmente. Logo na
chegada a Belém, o choque das casas próximas ao aeroporto. As buzinas. O
trânsito feroz. O risco do crime rondando. A vontade de escapar. Para quem faz
Cultura, hoje, não há porvir. Não há saída. Não há como sobreviver, dar de
comer à família. Como deixamos nossa Belém ficar assim? Zenaldo diz ser contra
o aumento para 2% do orçamento para a Cultura. Parece piada. E é. Há certos
momentos em que eu também penso em escapar. Será muito tarde para mim? Lyon é
uma possibilidade..
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