sexta-feira, 30 de junho de 2017
EU VOS DEIXO A PAZ. EU VOS DOU A MINHA PAZ.
Eu
queria escrever sobre intolerância, após assistir aos vídeos em que o ator
Fábio Assumpção, fora de si, ao invés de ser contido e até mesmo protegido
contra si próprio, é xingado e estimulado por um grupo de pessoas simples, de
Arcoverde, Pernambuco. Gritavam impropérios, gozavam a cena, “olha o ator da
Globo drogado”, diziam. Parecia uma delícia, o homem bonito, galã, ator de tv e
cinema, ali, dando vexame, descontrolado. Havia uma vibração de quem curte ver
o que está por cima, agora jogado na lama. O tal do homem cordial brasileiro,
já não há. Penso nas mídias sociais onde insensatos ainda repetem o tal “nós e
eles”, “coxinhas contra sei lá o que”, insuflando a luta entre classes. Já não
há. Agora, somos todos “nós”. Mas continuam de maneira insana. O resultado de
longos anos de abandono de Educação e Cultura como base de uma cidadania, deram
nisso. Há ódio incontido. Há falta de amor. Amor puro entre as pessoas.
Compaixão, compreensão. Há assassinatos e violência diários e autoridades
incompetentes para lidar. Educação e Cultura não estão nos planos desses que
tomaram conta do país. E o país não é deles. É nosso. Joguemos fora esses
slogans irritantes, bandeiras de sindicatos que temem perder regalias
financeiras. Somos um só. Tomemos o que é nosso, de volta. E acima de tudo,
vamos recuperar o amor. Se me permitem, lembro o amor que perdi, meu amigo, meu
melhor amigo, o melhor de todos. Chegou aos 45 dias de vida. Belo, grande, o
maior da turma. Conquistou a todos. Tornou-se um imperador na Praça da República
onde circulava atendendo aos chamados de quem queria saudá-lo e fazer carinho.
Aos domingos, ficava cercado de crianças que faziam fila para bater foto. Abria
um sorriso e estava à vontade. Tinha uma aura brilhante. Onde chegava, era
notado, tanto pelo tamanho, como pela beleza. Seu nome era Antonio. O dono da
casa. Responsável, quando andava em grupo, cuidava para que nenhum de nós se
afastasse muito, como um pastor e seu rebanho. Suportou a chegada de mais um
companheiro, de outra raça, porte menor, danadíssimo a importuná-lo mordendo
suas orelhas em provocação constante às brincadeiras. Inteligente, entendia as
palavras chave. Esperava-me no terraço do prédio, atento ao movimento da rua e
uma vez identificando-me ao atravessar, ao subir, já o encontrava pronto, guia
entre os dentes, para seu passeio diário. Apaixonado por água, ao chegarmos na
Praia do Farol, Moscow, aberta a porta já corria e mergulhava na água com
grande prazer, onde ficava nadando. Me fazia companhia. Estava sempre ao lado,
pronto. Sua partida foi rápida, silenciosa. Antes, passeou longamente por sua
adorada Praça da República, como uma despedida. Deixou um imenso vazio. Um
deserto onde a beleza e principalmente o amor, reinavam. Hoje, quando lembro
dele, o que é uma constante, lembro principalmente do seu olhar. De vez em
quando o pegava me encarando. Dele, emanava uma paz, uma compaixão, um amor
puro e leal que se espalhava não apenas ao nosso redor, mas por todo o mundo,
por todos os lugares onde circulava. É disso que sinto falta nesta realidade
terrível em que nos encontramos. Dessa intolerância, incompreensão,
impossibilidade de buscar, juntos, uma solução. Lembrei de um trecho da missa
que diz: eu vos deixo a paz. Eu vos dou a minha paz. Era tudo o que ele fazia.
Sua missão. Espalhar o amor e a paz. Deve estar agora correndo nos campos, o
vento batendo no pelo dourado e lindo, levando sua mensagem, sua missão a
outros mundos. Saudades, Antonio, meu amigo. Meu melhor amigo.
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