sexta-feira, 13 de maio de 2016
VOCÊ VIU O CABEÇÃO POR AÍ?
Pássaro
Preto percebeu a passagem do tempo. Já não tinha a mesma agilidade. As
encomendas já não eram tão constantes. E havia uma garotada que montava em
motos e fazia os serviços de maneira grosseira. Paciência. Naquela manhã em que
acabara de fazer faxina e trocar a ração de seus curiós preseiros, recebeu um
telefonema. Anotou os detalhes. Seus trabalhos eram limpos. Não deixava pistas.
Nunca teve problemas com a Polícia. Macaco velho. Tomou uma ducha, botou roupa
de trabalho, coisa simples, para não chamar a atenção, armou-se de uma faca, pegou
o ônibus e desceu na Cidade Velha. Mais uns passos e estava nas imediações do
Porto do Sal. Passou no Insano, Tabuas de Marés, passeou entre as vendinhas,
tomou uma lambada para temperar e perguntou, aqui e ali, pelo Cabeção. Quer uma
muca, um tiro, pode dizer que a gente arranja, nem precisa dele. Não. É só com
ele. Vou circular por aí. Se ele aparecer, diz que eu quero falar. Seguiu na
rua até subir a pequena ladeira que dá na Praça do Carmo, a Igreja, Fórum
Landi, os dois bares competindo para ver quem tocava mais alto a música.
Escolheu uma mesa e deixou-se ficar, consumindo umas cervas. Mais tarde,
retomou a caminhada. O rapaz disse que o Cabeção estava lá adiante, conversando
com umas meninas. Agradeceu. Se abicorou e vigiou. Cabeção era bem jovem.
Máquina zero ao redor da cabeça e o topo pintado de louro. Bermudão e sandália
Kenner. Parecia senhor do território. Mexia com um, gozava outro, parou no
boteco, comprou um Carlton e bebeu uma cerveja. Chegou um freguês. Era coisa
rápida e simples. Passava a peteca e com a outra mão recolhia o dinheiro.
Pássaro Preto ficou a postos. Cabeção continuou a circular. Haveria show nas
duas casas. Mais tarde, chegariam mais clientes. Pássaro Preto estudava por
onde ele costumava a passear. O local certo. A rapidez necessária. As condições
de uma fuga tranquila e sem testemunhas. Carros começaram a chegar. A molecada
faturava algum “reparando” os carros. Gente jovem, bem vestida e animada.
Cabeção recebia telefonemas. Ia até a esquina, o carro passava e recolhia o
produto. Alguém o chamou entre os veículos estacionados. A noite parecia ser
lucrativa. Pássaro Preto pensou que se conseguisse atraí-lo para as imediações
da igreja, teria algum tempo para executar o serviço e pegar o ônibus ali
próximo. Cabeção entrou em uma das casas. Pássaro Preto foi atrás. O som
rolava. Sertanejo, sei lá. Prudente, jogou-se em um canto e ficou olhando.
Cabeção na boa. Os boyzinhos chamavam e ele ia. Riam juntos. Lá vinha ele.
Passou do lado. Ô vida boa, tudo bem? Cabeção parou. E aí, cara, ta precisando
de alguma coisa? Eu, não, mas a minha patroa quer. Me mandou te procurar. Tu é
o Cabeção, né? Procurar pra quê? Ela tá ali na Praça, com umas coroas amigas dela.
Quer comprar o produto. Paga bem. Elas são doidas, vivem chapadas. Podes ir lá
comigo, agora? Porra, velho, aqui tá bom demais pra mim. Elas pagam bem.. Vamos
logo lá. Foram andando. Elas estão ali naquela bar que fica.. Na esquina? É.
Faltava pouco para a ladeira. Encostou uma moto. Pássaro Preto percebeu. Poucas
palavras. Cabeção saiu correndo. A moto atirando. Subiu a ladeira. Cabeção
caiu. Levou mais tiros na cabeça. Pássaro Preto chegou sem fôlego. Já era.
Gente veio correndo. Olhou em volta. Um carrinho de lanches. O Completão da
Adália. Do que é o suco? Cupuaçu. Filhas da puta. Bando de garoto pimbudo
fazendo serviço porco. E o meu?
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário