sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

ALCEU VALENÇA - VIVO/REVIVO

“Eu desconfio dos cabelos longos de sua cabeça se você deixou crescer de um ano pra cá. Eu desconfio no sentido estrito, eu desconfio no sentido lato”. Alceu Valença apareceu como um furacão. Já havia gravado um disco em parceria com Geraldo Azevedo. Ambos iniciantes. Então veio um festival de música e lá estava ele, com roupas maravilhosas, cabelos longos, juntamente com Paulo Rafael, Zé da Flauta e Zé Ramalho, tocando “Vou danado pra Catende”, um galope que conquistou a todos instantaneamente. Era rock and roll e era o mais puro nordeste. As letras misturando imagens belas, tortas, instigantes e um cantor agitado, olhos em brasa, como um guerreiro que toma posse de tudo ao seu redor. Veio o disco gravado ao vivo, com poucas condições técnicas e lá estava a banda maravilhosa com um repertório inesquecível. Pouco tempo depois, via Projeto Pixinguinha, Alceu desembarcou em Belém onde passou, talvez, uma semana, circulando pelo centro da cidade, fazendo amizades (ia na discoteca da Rádio Clube escutar discos locais) e principalmente, soando de maneira estrondosa no Teatro da Paz. Sozinho, sobre um praticável, com seu violão, trajes, cabelos longos e o canto, não deixava ninguém quieto. Poucas vezes a música pop brasileira foi tão bem representada naquela mistura de nordeste e rock, mais ainda, no TP, de maneira acústica, fazendo percussão com imensas botas. Alceu prosseguiu grande e é realmente estranho, talvez seu gênio, sei lá, que ele não seja lembrado juntos aos grandes da mpb como Chico, Caetano, Gil e Milton. Tornou-se um artista popular, de inúmeros sucessos. Mas creio que retomar o repertório daquele disco “Vivo”, agora “Revivo”, com praticamente toda a banda original, com toda a tecnologia que temos vem matar a vontade de muitos, até porque no disco original, muitas músicas do show ficaram de fora, por conta da duração do vinil. O verso citado no início é como uma declaração de intenções para quem era adolescente nos anos 70. É claro que desta vez a voz não tem mais aquele tônus de juventude e vontade de conquistar. Mas Alceu é maravilhoso em relembrar tanta coisa boa. São repentes, galopes, baiões, maracatus com um cantador acompanhado por guitarra elétrica e flauta. Preciso dizer que a mixagem tirou muito da força da guitarra de Paulo Rafael, preferindo viola e flauta. Isso foi errado. Mas adorei “Espelho Cristalino”, “Punhal de Prata”, “Descida da Ladeira”, “Pontos Cardeais”, “Casamento da Raposa com o Rouxinol, “Papagaio do Futuro” e “Sol e Chuva”. “Não, não quero mais brincar de sol e chuva com você. Para o seu dedo tenho dedal. Pro seu conselho cara de pau. Tenho janeiro, tenho fevereiro, se essa vida é um desmantelo, me mate que eu sou muito vivo, vivo, vivo!

E sem sair de Pernambuco, mas mundo afora, recomendo “The Bridge”, com Lenine acompanhado pela Martin Fondse Orchestra, ao vivo no Bimhuis, Holanda, creio. Som maravilhoso e Lenine desfilando seus sucessos tendo como acompanhamento arranjos lindos, violinos fazendo rabecas, saxofones cruzando o ar feito cometas, piano e percussão na linha do jazz. “A Ponte”, “A Rede”, “Hoje eu quero sair só”, “Relampiano”, “Leão do Norte” e muitas outras são cantadas. No mais festejar a riqueza dos pernambucanos. Alceu e Lenine já são veteranos mas o número de cantores, músicos, atores e filmes feitos por lá mostram o resultado de uma política cultural feita de maneira profissional e técnica. E nós ficamos a chorar.

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