sexta-feira, 23 de setembro de 2016

O HOMEM QUE DIZ DOU, NÃO DÁ

Eu dou. Estou falando de presentear os outros fora das datas comemorativas, como aniversário e natal. Às vezes, estamos em uma livraria, por exemplo e nos deparamos com um lançamento que não nos interessa de todo, mas sabemos que alguém gostaria muito. É uma visita em sua casa e você percebe o brilho nos olhos de seu convidado quando olha para algum objeto de sua propriedade. Naturalmente tudo deve ter limites, se me entendem, mas é muito provável ofertar aquilo ao outro. Qual a razão dessa vontade de presentear o outro? Quer ver a satisfação? Espera um agradecimento que lhe acalentará a alma? Será um reflexo de sua carência afetiva, pronto a oferecer qualquer coisa por um pouco de carinho? E aqueles que não dão presentes? Serão, por algum motivo menos interessantes em qualquer escala de valores que inventar? Você costuma presentear o amigo com cds, livros, bobagens, enfim. Mas ele, nada o ofertará em retorno. Sim, algumas vezes ficamos um pouco magoados. Nada sério, mas é que o retorno encheria nosso coração de felicidade. São pessoas que sequer notam essa coisa de “é dando que se recebe”. Hoje, aprendi a lidar com isso. Elas recebem os presentes de maneira natural, como quem acha que por alguma qualidade invisível, merecem receber. Estão ali para serem presenteadas e não têm nenhuma obrigação de devolver. Obrigação não têm, mesmo. Mas seria tão bom se retornassem!

Você é desses que acha aniversário e natal, por exemplo, datas apenas consumistas? Compra uma meia aqui, um cinzeiro ali, garrafa de vinho, automaticamente, sem pensar naquele que vai ser presenteado? E acha tudo uma grande farsa, com as pessoas fingindo gostar uma das outras, na verdade irritadas por estar ali, convivendo, naquelas poucas horas, com uma turma nada a ver? Você vai a uma loja, vê um cd que seu amigo adoraria e pensa: “ah, vou apenas avisar que vi e ele que venha comprar”. Fico pensando no momento em que recebemos o presente. Há que abrir o embrulho, feito tão cuidadosamente pelo vendedor. Há quem saia rasgando e queimando etapas. Outros sentam e vão desamarrando, abrindo o pacote. Ficamos levemente aflitos, aguardando sua demonstração de alegria e enfim, viva! Nos abraçamos. Estamos felizes com a felicidade do outro. É isso. Talvez seja carência, consumismo, sei lá, you name it. Não foi tão rápido perceber isso. Houve um espetáculo do Cuíra, “Toda minha vida por ti”. Dizia “faça, faça antes que lhe passe a vontade”. Me levou a pensar em faça apenas porque quer. Somente por isso. Ninguém lhe deverá nada por isso. Foi apenas por vontade de fazer. E nada de ficar aguardando o sorriso do outro, o abraço. Faça sua parte e pronto. Vá feliz por si próprio, pelo gesto. Nada mais interessa. E nem precisa alardear. Guarde para si a satisfação. Não foi por ela que você deu? Para ser exato, a crônica de hoje nada tem a ver com o “Canto de Ossanha”, de Baden Powell e Vinícius de Morais. A poesia vai em outra direção. Aqui, o homem não precisa dizer que dá. Dá porque quer e pronto. E você? De que lado está? É dos que presenteiam e ficam magoados com nenhum retorno, dos que pensam que nasceram para ser presenteados e não é nada fora do comum receber gifts? Como diz William Shakespeare, para tudo é preciso estar pronto. Às vezes esses pensamentos resolvem muitos problemas que a vida nos apresenta no dia a dia. Se está estressado, chateado, cheio da vida, chutando o vento, que tal presentear alguém?

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